Não são somente problemas de demanda e infraestrutura que afastam os médicos da rede básica de saúde. Em Porto Alegre a violência, que gera medo e insegurança, já expulsou profissionais da atenção básica. A pediatra Marjorie Hebmuller, 36 anos, abandonou o posto de saúde após sofrer um assalto. Ela persistiu em trabalhar no SUS até ser assaltada novamente em uma unidade de pronto-atendimento. Hoje, a médica atua em um hospital, onde tem melhor estrutura e mais segurança.
Violência física e verbal, medo e sobrecarga de trabalho levaram a médica de família Luciane Meira Peres para a rede particular. Ela permaneceu no SUS durante 11 anos, mas a própria saúde passou a ser afetada. Ela entrou em depressão. Entre os motivos já conhecidos, a médica inclui a frustração de não conseguir dar o devido andamento ao tratamento dos pacientes.
Mestre em Saúde Pública, o médico boliviano Edwing Holguin diz que além de pouco pessoal para o tamanho da população, uma das maiores dificuldades de quem trabalha em posto de saúde é a falta de equipamentos. Ele já atuou inclusive na Amazônia boliviana com muito menos estrutura e diz que é comum para os médicos driblar essa falta de recursos. E Porto Alegre deve perder um médico com este currículo por outro motivo: ser estrangeiro. Ele não pode ser contratado pela prefeitura e o seu contrato com o Instituto de Cardiologia acabou em outubro.
Profissionais do Mais Médicos ganham uma bolsa de R$ 10 mil, que não dá direitos trabalhistas. O salário na atenção básica varia de R$ 4,8 mil a R$ 9,923 mil, de acordo com a carga horária e especialidade. Eles não são concursados, são contratados com carteira de trabalho assinada. Apesar de ser um salário elevado, em relação a outras profissões, muitos médicos podem ganhar mais e ter mais qualidade de vida atuando em outros empregos ou de forma autônoma.