A facilidade de acesso a celular nas cadeias no Rio Grande do Sul é cada vez maior.
Apesar de incontáveis promessas de melhoria na fiscalização, até agosto, foram recolhidos 806 aparelhos por mês em prisões gaúchas, crescimento de 14,8% em relação à média mensal de 2012.
Avaliando os números, uma interpretação possível é que o aumento das apreensões reflete o maior rigor na segurança das penitenciárias. A estatística indica um dado preocupante. Apesar da fiscalização no acesso de visitantes, apenas 5% dos telefones foram pegos com pessoas que tentavam entrar nas cadeias. O desafio das autoridade é descobrir, então, como os sistemas de vigilância são driblados e os aparelhos chegam às celas.
Na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc), embora os dados do primeiro semestre apontem redução pela metade nas apreensões, nenhum visitante foi flagrado entrando com celular. Dos 20 telefones recolhidos, 18 estavam com os apenados - sabidamente chefes de quadrilhas de tráfico de drogas, de ladrões de bancos e de homicidas.
Há quase uma década, apenados da Pasc comandam, de dentro das celas, assaltos, tráfico, sequestros e assassinatos nas ruas por meio de celulares. Para tentar estancar essa farra, além de cobrar providências da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe), a Vara de Execuções Criminais (VEC) de Porto Alegre tem conseguido a transferência temporária (por até um ano) de presos mais perigosos para prisões federais fora do Estado. Desde 2009, são pelo menos cinco.
Entretanto, a última tentativa de transferência, no começo de agosto, foi rejeitada pela Justiça Federal. No despacho, fica evidente a crítica de que mazelas estaduais não devem ser "empurradas" para a União.
"Não se pode pretender desafogar um problema de superlotação ou ausência de instrumentos específicos na área de segurança pública por parte do poder público, como reflete a situação atual, transferindo para o sistema penitenciário federal, sob pena deste não mais servir aos propósitos que foi criado, desvirtuando a finalidade", descreve o texto da Justiça.
Juiz ironiza classificação de "alta segurança" da Pasc
O pedido foi negado em caráter liminar, mas a expectativa da Vara de Execuções Criminais é de que a decisão seja revertida, até porque negocia a transferência de mais um apenado da Pasc. Os magistrados responsáveis pela fiscalização das cadeias gaúchas têm tentado evitar esse tipo de transtorno. A partir de 2011, já foram encaminhados pelo menos cinco ofícios para a atual administração da Susepe, com respostas consideradas pouco convincentes.
No último documento, datado de 2 de agosto, o juiz Sidinei Brzuska questiona: "Quanto tempo ainda se fará necessário para que a Pasc possa ser, efetivamente, de alta segurança, cessando a comunicação de presos com celulares?"
A pergunta segue sem resposta até hoje.
Em 22 de agosto, uma inspeção realizada por agentes penitenciários encontrou quatro celulares em uma cela. Na memória do aparelho estavam armazenadas fotos, nas quais aparecem três presos - um deles mexendo em outro celular e outro fazendo pose com as mãos "em forma de coração".
Contraponto
O que diz a Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe), por meio da assessoria de imprensa:
"Testes com bloqueadores de celulares não foram satisfatórios e todas as tecnologias apresentadas anteriormente não surtiram resultado para o sistema prisional do Estado. Celulares não estão entrando com visitantes, pois a fiscalização ficou mais rigorosa. Com isso, aumentaram muito os arremessos pelos muros, quando os presos estão no pátio. Sobre transferência de presos para outros Estados, a Susepe desconhece a dificuldade da Justiça, pois toda vez que solicitou transferência de presos para penitenciárias federais foi prontamente atendida pelo Judiciário."
Cobranças e Explicações
Em fevereiro de 2011, a VEC encaminhou o primeiro pedido de providências para a atual administração da Susepe, como medidas para barrar o ingresso de celulares nas cadeias, em especial na Pasc. A Justiça também questionou se a penitenciária continuava ostentando o adjetivo de "alta segurança".
Cinco meses depois, a Susepe prometeu melhorias estruturais, intensificar as revistas e testar bloqueadores de sinal de celular.
Em outubro, a VEC repetiu as cobranças. Pelo menos cinco traficantes já tinha sido transferidos para cadeias federais porque comandavam crimes com celulares dentro da Pasc.
A Susepe respondeu em novembro, garantindo que trabalhava arduamente para resolver problemas, com diretrizes claras, e que teste de bloqueadores não se mostraram eficientes na Pasc.
Em fevereiro de 2012, após o preso Michel Bonotto fugir da Pasc pela porta da frente e deixar o irmão em seu lugar, a VEC voltou a exigir providências para melhorias na segurança da Pasc e estancar a entrada de celulares na penitenciária.
Em outubro, a Susepe informou que testes com bloqueadores estavam em andamento, mas não tinha autorização para divulgar resultados
Em dezembro, a pedido do MP, a VEC exigiu soluções para barrar o uso de celulares na Pasc "de forma definitiva", e solicitou informações sobre abertura de edital para compra de bloqueadores. Dias antes, apenas em uma galeria foram apreendidos sete celulares, barra de ferro com meio metro de comprimento e porções de cimento, cimento branco e massa corrida
Em maio, a Susepe informou que não pode prever a compra de bloqueadores no Orçamento porque não tem garantia de eficiência, mas que está em operação um novo sistema de monitoramento de câmeras na Pasc.
Em 2 de agosto, a VEC fez nova cobrança, lembrando que há mais de dois anos presos da Pasc seguem comandando crimes com uso celulares, inclusive apenados já transferidos temporariamente (por um ano) para cadeias federais por esse motivo.
Em 8 de agosto, a Justiça Federal negou a transferência de um perigoso apenado para prisão federal, sob o argumento de que o Estado tem de melhorar o sistema de controle.
Controle frouxo
Apreensões de celulares em cadeias gaúchas crescem 14,8% em 2013
Em média, autoridades recolheram mais de 800 aparelhos por mês nas celas
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