A poluição sonora e o constante mau cheiro são as principais reclamações de quem convive perto de um acumulador de animais. Em Porto Alegre, 70 pessoas estão no cadastro da Secretaria Municipal do Meio Ambiente e da Sustentabilidade (Smams) por excesso de animais — destas, 40 foram diagnosticadas com transtorno psicológico e são monitoradas pela prefeitura. Em 2019, 138 animais de acumuladores foram castrados e vacinados.
No ano passado, 14 denuncias foram feitas por cidadãos ao Ministério Público, que ajuizou 12 ações civis públicas pedindo providências ao poder público — como castração dos animais e acompanhamento dos casos. Os relatos não dizem respeito apenas ao excesso de animais, mas também a maus tratos. Neste ano, o MP apresentou quatro ações à Justiça.
— É uma situação muito triste. As pessoas são doentes, têm uma história de vida de abandono, de muita tristeza, não têm uma rede de sociabilidade. De certa forma, o animal é a única companhia. A gente procura trabalhar com o conceito de redução de danos, metodologia foi sugerida pela PUCRS — afirma a promotora de Justiça Annelise Steigleder.
Conforme a prefeitura, o procedimento padrão é, após comunicação de casos envolvendo acumuladores de animais, agentes de fiscalização e médico veterinário são designados para visitas nas residências — os primeiros contatos são para estabelecer relação de confiança e verificar o estado de saúde dos animais. Após, são adotadas outras medidas, como vacinação e castração.

De acordo com a médica veterinária da prefeitura Denise Garcia, os servidores verificam, nas visitas trimestrais, se o número de animais reduziu ou aumentou.
— A situação é de grande vulnerabilidade social. As pessoas entendem que estão fazendo bem. Mas, muitas vezes, o que a gente vê é aquele grande acúmulo. Nem sempre há cuidado. Os animais não podem ser incluídos em (crime de) maus tratos, pois é um distúrbio (sofrido pelas pessoas) — relata Denise.
Coordenador do Departamento Geral dos Direitos Animais, Bruno Wagner Silva afirma que a pasta faz campanhas para que a comunidade adote os animais de acumuladores:
— A política da pasta é não recolher animais, pois já tivemos uma herança da última gestão de 300 animais recolhidos de acumuladores. Logo em seguida, eles já estavam novamente com dezenas de animais.
Uma das dificuldades encontradas pelo poder público para monitorar os casos é a recusa por ajuda. Cerca de 30 pessoas cadastradas pela prefeitura não aceitaram o acompanhamento e, por isso, são consideradas "pessoas com excesso de animais", já que não há diagnóstico.
Conforme o fiscal da prefeitura Luciano Pandolfo, nesses casos, os fiscais fazem apenas o monitoramento para verificar se aumentou o número de animais nas ruas.
Transtorno consta em manual internacional
Professora da PUCRS, a psicóloga Tatiana Irigaray afirma que acumuladores de animais são diagnosticados, conforme o Manual de Transtornos Mentais, por apresentarem manifestação especial de acumulação — transtorno diferente da acumulação de objetos.
— Começa com o amor aos animais, mas, com o passar do tempo, vira transtorno. Quando são objetos, conseguimos convencer as pessoas a se desfazerem deles por meio da terapia. Mas não há como descartar vidas — explica a docente, que comanda o grupo de pesquisa Avaliação, Reabilitação e Interação Homem-Animal (ARIHA).
Segundo a pesquisadora, o acumulador não consegue deixar de recolher cães ou gatos abandonados nas ruas. Mulheres sozinhas, sobretudo acima dos 60 anos, são as mais afetadas pelo transtorno. Em geral, elas não têm espaço físico adequado e padrões mínimos de limpeza.