A cena teria ocorrido no domingo: uma moradora de rua dormia sobre um papelão no recuo de um imóvel ao lado da Praça Irmão Egídio, no centro de Esteio. A poucos metros, alguém começa gravar um vídeo com celular e foca em uma mulher loira que vestia camiseta preta. Ela se aproxima da pessoa deitada, caminhando em direção à câmera com um balde. Segundos depois, arremessa água na moradora de rua, que desperta espantada.
Na sequência, a mulher que efetuou o ataque ainda ordena que a pessoa que dormia no local leve os papelões. Resignada, ela obedece e se retira. Postado no Facebook, o vídeo gravado na Região Metropolitana viralizou rapidamente. Quem mora nas imediações já identificou os envolvidos.
A moradora de rua que aparece no vídeo seria conhecida na região e teria aproximadamente 30 anos. Já a suposta agressora seria uma empresária responsável por uma empresa de segurança e monitoramento eletrônico que atua no município.
O vídeo passou a se espalhar a partir da noite de terça-feira, e levou diversos empresários da região a cancelarem seus contratos com a prestadora de serviços de segurança. Ou, pelo menos, tentarem. Desde a repercussão do caso, os representantes legais da empresa de segurança teriam desaparecido. Uma das que já rompeu o contrato foi uma escola de cursos, localizada em uma das salas do imóvel em que a moradora de rua estaria dormindo quando foi encharcada:
– Nosso contrato com eles era de apenas alarme, não havia nada relacionado a vigilância e jamais aprovaríamos uma atitude desse tipo. Não conseguimos localizar a empresa, mas acionamos o nosso jurídico e rompemos de forma unilateral – declarou ontem Patricia Cardoso, gerente da escola, enquanto novos contratados, de uma empresa concorrente, instalavam seus equipamentos. A sede da empresa de segurança, uma casa, teve as placas de identificação retiradas.
A reportagem esteve no local, ao longo da tarde de ontem, mas a campainha não foi atendida. Um carro, estacionado nos fundos da garagem, tinha as placas cobertas por uma cadeira de praia. O número de atendimento 24 horas também não respondeu aos contatos.
No centro de Esteio, uma série de salas comerciais indica que a clientela da empresa de segurança seria bastante numerosa. No entanto, ontem, vários proprietários de negócios passaram a arrancar as placas da marca.
– Olha aqui, já achei umas quantas (no chão). Vou te dizer que estou achando bem feito – declarou o papeleiro Cleiton Domingues, que se disse amigo da moradora de rua que foi atacada.
A proprietária de um salão de beleza próximo à empresa de segurança, que não quis se identificar, foi uma das que descartou as placas. Diz considerar o contrato com a prestadora de serviço rompido e espera que eles busquem seus equipamentos:
– Fiz por dois motivos. Para não me queimar com as minhas clientes e porque não dá para concordar com uma atitude dessas. Achei desumano.
Colaborou para a indignação dos empresários e frequentadores da região o fato da moradora de rua ser uma pessoa conhecida e querida na vizinhança. Segundo relatos, ela costuma fazer alguns trabalhos eventuais, limpando a fachada de lojas em troca de dinheiro, por exemplo. É apontada como uma pessoa franzina e educada. Taxistas relataram que costumam, vez por outra, fazer vaquinhas para pagar o almoço dela.
Segundo Daiane Garcia, moradora de Esteio e assistente social, a conversa que circula na cidade é de que a moradora de rua passou a se esconder, assustada com a repercussão e com boatos de ameaças. Ela teria contado a uma pessoa que dormiu naquele local porque estava chovendo, mas não queria incomodar.
A empresa de segurança e a suposta agressora foram procuradas, mas não responderam aos contatos.