Após 48 dias sem entender o que aconteceu, a família do contador aposentado Antônio Ide Cavalli, 69 anos, teme que o caso seja esquecido em Canela. Os filhos contrataram um advogado para acompanhar as investigações, ajudar a Polícia Civil e buscar apoio na Secretaria Estadual de Segurança Pública (SSP). A família pede que uma delegacia especializada apoie o trabalho feito pelos policiais de Canela.
Para os filhos Janaíne, 43, e Claudio Antônio Cavalli, 42, não há dúvidas que o pai Antônio foi vítima de um crime. O contador aposentado foi visto pela última vez no dia 5 de dezembro, quando conversou com lojistas que ficam no térreo do prédio em que morava na Rua Felisberto Soares, no centro de Canela. Contudo, o sumiço só foi informado para a Polícia Civil no dia 9, quando o apartamento da vítima foi encontrado arrombado.
— Queremos buscar respostas, porque até momento temos poucas informações. O tempo está passando e as coisas não se resolvem. Temos medo que seja esquecido desta forma. Precisamos saber o que aconteceu. Parece ser um assalto, mas por que levaram ele? Um senhor de 69 anos, com problemas de saúde e dificuldade de locomoção. Por que não levaram só os valores? Não sabemos o que fizeram com ele, se está vivo ou não — questiona Claudio.
Para o advogado Fernando Fontes Corrêa, o desaparecimento já deveria ter recebido uma atenção maior da chefia de Polícia Civil. O representante da família teve acesso a parte do inquérito policial, que possui segredo de justiça, e prepara uma série de questionamentos.
— Quem está investigando é a distrital de Canela que sofre, como qualquer outra distrital, pela falta de efetivo e recursos. Então, acho que está havendo um descaso pela chefia da Polícia Civil. Já deveria ter deslocado uma delegacia especializada para auxiliar a equipe de Canela. É preciso de mais ferramentas.
Um dos pontos de questionamento é porquê não foram feitos sobrevoos ou buscas com cães farejadores na localidade de Passo do Inferno. A busca por câmeras da cidade feita pela Polícia Civil mostrou a caminhonete do contador indo até aquela região, que dá acesso ao interior de São Francisco de Paula e Caxias do Sul. Nas imagens, não é possível identificar quem era o motorista ou quantas pessoas estavam no veículo.
— Por muitas vezes, o desfecho de sucesso de crime vem destas varreduras. Essa é a falta de ferramentas que citamos. Por isso, precisamos chamar a atenção da chefia de Polícia Civil. Já foram 48 dias dos fatos e estamos correndo contra o tempo. A cada dia que passa, aumenta a chance de não se chegar a lugar nenhum — afirma o advogado, que irá tentar uma reunião com o vice-governador e secretário estadual de Segurança Pública, Ranolfo Vieira Júnior, para chamar a atenção para a gravidade deste caso.
Contador sumiu no coração de Canela
O contador aposentado tinha uma rotina pacata, segundo os filhos. Antônio era o dono do prédio de quatro andares onde morava há duas quadras da igreja matriz, conhecida como Catedral de Pedra. Como o imóvel não estava finalizado, os outros apartamentos não podiam ser alugados e ocupados. Os únicos vizinhos eram os quatro lojistas e seus funcionários que trabalham no térreo.
— Ele gostava de conversar com as pessoas dos locais que sempre frequentava, como a lavanderia que ia uma vez por semana. Era uma rotina tranquila e reservada. Caminhava até estes locais pontuais, onde tinha conversas informais para passar o tempo, após uma vida de muito trabalho no escritório de contabilidade — descreve o filho.
Além da aposentadoria, Antônio vivia da renda dos imóveis que alugava. Ele costumava receber pagamentos em espécie, por isso as pessoas comentavam que ele guardaria uma elevada quantia em dinheiro em seu apartamento. Esta é a principal linha de investigação na Delegacia de Canela.
A suspeita é que os bandidos tiveram acesso pelos fundos do prédio, onde romperam uma veneziana de madeira. Depois, foram até o apartamento da vítima e arrombaram a porta. A forma como o possível crime aconteceu leva a acreditar que ele foi planejado com antecedência e os criminosos conheciam a rotina da vítima.
— Foi (um crime) no meio da cidade. Tanto que meu pai não tinha essa insegurança, pois morava no centro, numa das principais ruas de Canela. (O pensamento é que) não teria como alguém entrar no prédio sem ninguém ver, com câmeras por todos os lados, mas não foi o que aconteceu. Conseguiram entrar e sair e não sabemos de nada. Não conseguimos parar de pensar nisso — lamenta Janaíne.
— É uma situação bem atípica. Um caso dessa envergadura e numa cidade que é "cartão postal" do Estado, deveria ter uma resposta imediata. É difícil, pois a sensação é que as portas estão fechando. O apelo é por este aparato mais especializado para resolver este caso — argumenta o advogado Fernando Fontes Corrêa.
Como é comum em outros casos de desaparecimento, a falta de respostas e de um desfecho é o pior para os familiares. A filha Janaíne relata que a angústia retoma a cada notícia sobre um corpo encontrado.
— Estes dias um corpo foi encontrado num barril, em outro Estado, e fiquei pensando será que é meu pai? Será que ele sofreu? Ou será que ainda está por aí sofrendo? Não podemos desistir. Estamos insistindo porque temos aquele pouquinho de esperança dele estar vivo. Sabemos que está cada dia mais difícil, mas ainda não acharam um corpo. Talvez alguém veja a foto dele e possa nos ajudar — comenta a filha mais velha.
Delegacia de Canela afirma que desaparecimento é prioridade
Apesar de evitar divulgar detalhes para não prejudicar as investigações, o delegado Vladimir Medeiros sempre manifestou que solucionar o desaparecimento de Antônio Cavali é a prioridade da Delegacia de Canela. Na tarde de quinta-feira (21), as buscas feitas pelo contador aposentado no interior de Canela levaram a recuperação de um trator furtado. O veículo, avaliado em R$ 50 mil, havia sido furtado no município de Santo Antônio da Patrulha em 2017.
O delegado Medeiros está em férias e é substituído pelo delegado Gustavo Bermudes, que é titular em Parobé. A reportagem entrou em contato com a delegacia do Vale do Paranhana, mas não obteve resposta.
Quem tiver qualquer informação sobre o paradeiro de Cavalli ou de sua caminhonete pode repassar à Delegacia de Canela pelo telefone (54) 3282.1212 ou pelo aplicativo WhatsApp, no número (54) 99614.4216. Não é preciso se identificar.