Uma gravidez de risco levou a caxiense Camila Barea, 35 anos, a deixar o emprego e buscar trabalho em Arroio do Sal. A ideia era trabalhar apenas no veraneio, até o final de março de 2020. Veio a pandemia e os planos mudaram:
— Eu era vendedora e engravidei do meu segundo filho. Tive problemas na gestação e precisei me afastar do meu trabalho anterior. Meus pais moram em Curumim e meus sogros também. Como estava aqui consegui um emprego para a temporada do verão passado.
Ela lembra que assim que começaram os primeiros casos pensou que seria mais seguro morar no Litoral. Outro ponto era quem cuidaria do bebê se ela voltasse para Caxias e conseguisse voltar ao mercado de trabalho.
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— Meu esposo e meu filho mais velho, de 12 anos, ainda moram em Caxias. O trabalho na praia era temporário, mas quando começou a pandemia fiquei em Arroio do Sal. Pensei na saúde, no bebê e também em como seria conseguir emprego na Serra e em quem iria cuidar do meu filho se as escolinhas estavam fechadas. Acabei ficando — conta ela.
A estadia no Litoral fez Camila tomar uma decisão:
— Não volto mais para a Serra. Aqui temos qualidade de vida e é mais fácil se proteger do vírus.
Mais segurança na praia
O casal Vilson Brocheto, 78, e Norma Bonan Brocheto, 77, optaram por transformar a casa de veraneio no centro de Arroio do Sal em residência fixa. Vilson só se desloca para Caxias do Sul, no bairro Sagrada Família, onde o casal residia, para consultas médicas de rotina. Neste feriado Vilson veio para a Serra e Norma ficou no Litoral.
— O Litoral é melhor porque nos sentimos mais seguros. Na nossa casa tem o pátio e nos sentimos mais livres. Não íamos nem na casa dos vizinhos e, mesmo aqui, nos cuidamos e saímos pouco. Em sete meses não fui a Caxias nenhuma vez — afirma Norma.
Nos feriados, os aposentados não saem de casa:
— Não vejo o movimento porque, quando tem feriados, aí sim não saímos. Os vizinhos contam que o pessoal começa a lotar a praia, os mercados ficam cheios e ninguém usa máscara. Aí vem a preocupação porque pode aumentar a contaminação.
Na praia, o casal conta sempre com a companhia de uma das filhas.
— Elas iam ao mercado, farmácia e sempre tem uma conosco. Nossos filhos querem que fiquemos protegidos. Aproveitamos para jogar carta, tomar chimarrão, fizemos até café colonial no jardim no Dia dos Pais. Ninguém está livre do vírus, mas, com os cuidados, fica mais difícil de pegar — acredita ela.
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Valdecir Soares da Cunha, 51, morava em Farroupilha. Pouco mais de um mês depois dos primeiros casos de covid-19 na Serra, ele foi demitido da empresa onde trabalhava:
— Percebi que nas minhas tentativas de me recolocar no mercado de trabalho tem uma certa rejeição pela minha idade. Como tenho experiência em trabalhar em restaurante, optei por passar, em princípio, o período de verão trabalhando em Torres.
A praia foi escolhida porque é onde o irmão dele tem casa, e assim economiza o dinheiro do aluguel, ao mesmo tempo em que aluga a moradia dele na Serra.
— Ainda não sei se vou ficar de forma definitiva, mas agora é a melhor opção porque não conseguia emprego. Estou à procura de outra fonte de renda também e vou ficar pela praia pelo menos até o final da temporada.
Mesmo sem dados oficiais, migração foi percebida principalmente no comércio e serviços
Camila é uma das moradoras dos centros urbanos que optou pelo Litoral para tentar fugir da pandemia de coronavírus. Não há dados oficiais, segundo a prefeitura de Arroio do Sal, que comprovem essa migração de veranistas. O município chegou a solicitar para a Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE) a quantidade de economias ativas durante 2020, mas não recebeu retorno. Mesmo assim, de acordo com o prefeito em exercício Adilson Vargas, a quantidade de imóveis comercializados no Litoral Norte aumentou.
— Tivemos em Arroio do Sal um aumento de 7% na emissão de imposto sobre a transmissão de bens imóveis (ITBI) em relação ao último exercício. De fato, acreditamos nisso visto o movimento nas ruas. Mas não temos dados oficiais.
Nas ruas da cidade, basta conversar com lojistas, caixas de supermercados, nas farmácias, petshops e padarias para perceber que o movimento aumentou. Todos dizem que conhecem alguém que trocou os grandes centros pelas praias para tentar fugir do contágio do vírus.
De acordo com o secretário de Turismo, Cultura e Esporte de Torres, Fernando Néry, a população do município é de cerca de 40 mil habitantes. Quando começou a pandemia, a cidade viu esse número passar para cerca de 60 mil, segundo projeção da Associação dos Municípios do Litoral Norte (Amlinorte).
— As pessoas queriam fugir dos grandes centros urbanos para tentar evitar o contágio de coronavírus. A projeção do município é que no veraneio esse número amplie para 300 mil pessoas. Isso sem contar o período de Natal e Ano Novo —diz ele.