O incêndio que consumiu o Museu Nacional, no Rio de Janeiro, na noite de domingo, acendeu um alerta para todos que trabalham com a cultura e o patrimônio no Brasil. Se a mais antiga instituição científica do país e um dos maiores repositórios de peças e documentos históricos do continente está sujeito a um incidente que parece diretamente ligado à falta de manutenção e ao descaso crônico, o que dizer das outras instituições?
Em Caxias do Sul, não há perigo iminente de desastre semelhante, garante a prefeitura. A Secretaria do Planejamento informa que o Plano de Prevenção e Proteção Contra Incêndios (PPCI) está sendo elaborado para todos os prédios públicos. Os primeiros contemplados serão imóveis que abrigam a estrutura das Secretarias da Saúde e da Cultura e onde há maior circulação de pessoas, iniciando pelo Centro de Cultura Dr. Henrique Ordovás Filho.
Mesmo sem os projetos prontos, porém, Daniela Fraga, diretora da Divisão de Museus da Secretaria Municipal da Cultura, declara que os museus mantidos pelo município estão em dia com os mecanismos de prevenção ao fogo.
— Nós cuidamos de cinco espaços, é uma demanda grande, e falamos de prédios que são tombados, como o Museu Municipal, que é do século 19. Nossos extintores estão com a validade dentro do prazo, em todos os locais, e a questão da segurança do trabalho é acompanhada com atendimento dos brigadistas que fazem esse trabalho de prevenção, de cuidados com materiais inflamáveis, com a rede elétrica. Claro que ninguém está livre de um acidente, mas as ações que temos hoje atendem as questões de prevenção — explica.
São de propriedade do município o Monumento Nacional ao Imigrante, o Museu Municipal de Caxias do Sul, o Museu Ambiência Casa de Pedra, o Museu da Uva e do Vinho Primo Slomp e o Museu dos Ex-combatentes da Força Expedicionária Brasileira na II Guerra Mundial. O Pioneiro não conseguiu contato com o setor de prevenção de incêndios do 5º Batalhão de Bombeiro Militar durante a tarde de ontem para conferir se os espaços foram fiscalizados.
Manutenção
A manutenção dos imóveis também ocorre na medida em que as demandas aparecem, diz Daniela.
— Todos os espaços sempre demandam, se não novos investimentos, manutenção rotineira. Quando eu falo de um prédio tombado do século 19, isso já diz que eu tenho de estar com um olhar muito atento. Internamente, temos as questões pontuais de manutenção atendidas pela Secretaria.
O orçamento da Divisão de Museus, que contempla os cinco espaços e o Arquivo Histórico Municipal, é previsto em cerca de R$ 2,5 milhões para este ano. Até agora, foram utilizados R$ 60,5 mil para reparos.
Além da manutenção dos espaços, a conservação do acervo é realizada pelo setor técnico. Já intervenções maiores dependem da abertura de licitação. A diretora da Divisão de Museus afirma que a prioridade atual é a reforma do telhado do Museu Municipal, para evitar o comprometimento do imóvel. O edital de licitação foi publicado no dia 22 de agosto pela segunda vez _ na primeira, o processo não teve interessados.
— Hoje, temos essa questão pontual. É uma situação em que temos de iniciar o processo, repetir a licitação, e também contar com o entendimento das empresas para que participem disso. Foge da alçada da gestão — avalia.
Participação da população é fundamental
É máxima corriqueira entre os defensores do patrimônio histórico que só é possível preservar o que se conhece. Por isso, Daniela Fraga acredita que seja fundamental investir em projetos de educação patrimonial para garantir a conservação dos espaços de memória. Ela considera que os museus locais têm boa frequência de visitantes _ média de 40 por dia. Daniela destaca, principalmente, a participação de escolas em atividades no Museu Municipal.
— Ano passado atendemos quase 100% das escolas de Caxias. É uma questão de educação patrimonial para as gerações mais jovens, pensando em levar isso para o futuro. Neste ano expandimos também esse projeto para a Casa de Pedra e o Monumento ao Imigrante. É uma forma que encontramos de acionar a nossa comunidade para reconhecer esses espaços de memória — aponta.
Nesse sentido, a tragédia anunciada do Museu Nacional deixa, ao menos, espaços para a reflexão sobre o olhar destinado a esses locais.
— Que se perpetue esse olhar de cuidado, no primeiro momento afetivo, e também um olhar administrativo, para que esse patrimônio que é visível, palpável, que é história e memória, se mantenha. A gente percebe que houve várias situações de descaso. Espero que nós tenhamos tempo hábil e investimento para que o patrimônio possa ter um olhar mais adequado. Porque lá (no Museu Nacional) não queimaram somente objetos, queimou a história, e isso é irreparável.
Para Sílvia Nunes, presidente do núcleo do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) de Caxias e integrante do Conselho de Patrimônio Histórico e Cultural, os museus locais têm boa conservação, exceto o Memorial Zambelli (veja abaixo) e qualidade elevada do acervo, mas é necessário trabalhar por políticas públicas permanentes em defesa do setor.
— Em termos de cultura no Brasil, a gente ainda está atuando de forma reativa, e não proativa. Precisamos acelerar o processo de segurança em edificações públicas, principalmente aquelas que têm a visitação das pessoas. É importante exigir do poder público, do poder legislativo, fundos permanentes, preferencialmente geridos pelas estruturas de proteção ao patrimônio, para garantir essa manutenção dos museus de forma independente da política que estiver acontecendo no momento — avalia.
Zambelli aguarda por reforma
Acervo que reúne mais de mil obras de arte sacra, o Museu Atelier Zambelli aguarda há mais de um ano por uma reforma estrutural _ razão pela qual está fechado para visitação desde agosto do ano passado. O principal problema do espaço, localizado no subsolo do Monumento Jesus do Terceiro Milênio, nos Pavilhões da Festa da Uva, são as goteiras e infiltrações que já provocaram danos em diferentes graus às esculturas, em sua maioria de gesso.
Com a verba de R$ 1,5 milhão destinada pela prefeitura para executar a obra em março deste ano, a Festa da Uva S.A. _ responsável por administrar o memorial _ aguarda por um termo de referência da Secretaria de Planejamento (Seplan), em que conste especificações sobre as reformas necessárias. A Seplan, por sua vez, aguarda um parecer da Procuradoria-Geral do Município (PGM) que autorize a pasta a atuar num empreendimento privado, caso da empresa que administra os Pavilhões. A diretora administrativa e financeira da Festa da Uva S.A., Marta Regina Schramm, considera normais os entraves burocráticos.
— A gente conversou faz cerca de uma semana e permanece no mesmo estágio. Não temos previsão de resposta, estamos aguardando. São os tramites legais que vão nos dar uma noção sobre valores, se iremos precisar de uma licitação. Não é que haja demora, trata-se de um rito jurídico normal para um órgão público.
Ela acrescenta que a meta é reabrir o memorial até a próxima Festa da Uva, que irá ocorrer entre 22 de fevereiro e 10 de março do ano que vem.
— Já chamamos especialistas para ver a estrutura e dar opinião, e o que eles dizem é que há pouca coisa a ser feita. Tem de resolver os problemas de infiltração e fazer uma pintura. O tempo de obra não é tão longo, por isso acreditamos que vai dar tempo de estar com tudo pronto até a Festa. O interesse de todos é resolver o mais rápido possível.
Conforme a diretora da Divisão de Museus da Secretaria Municipal da Cultura, Daniela Fraga a manutenção do acervo do local é realizada quinzenalmente pela pasta.
— O município tem atendido o espaço com o setor técnico, na conservação e higienização (das peças). É o único espaço em que temos essa situação (de acervo em espaço de terceiros). Os outros (museus) são efetivamente do município com recursos humanos e estrutura física atendida por nós — aponta.
(Andrei Andrade)
Aula pública
O Centro Acadêmico de Estudantes de História da Universidade de Caxias do Sul (UCS) promove na quinta-feira, dia 6, uma aula pública sobre o incêndio do Museu Nacional, ocorrido no Rio de Janeiro na noite de domingo. A aula será no auditório do bloco H e se inicia às 19h40min.
VISITE
# Monumento Nacional ao Imigrante
O Monumento é aberto ao público e recebe visitas de terça a sexta das 9h às 17h, e aos sábados das 11h às 17h.
Horários aos domingos: consultar pelo telefone (54) 3901-8940.
Endereço: BR-116, bairro Petrópolis.
:: Visitantes em 2017: 5.857.
:: Visitantes em 2018 (até julho): 2.248.
# Museu Municipal de Caxias do Sul
O Museu é aberto ao público e recebe visitas de terça a sexta-feira, das 9h às 17h, e aos sábados, das 11h às 17h.
Horários aos domingos: consultar pelos telefones (54) 3221-2423 ou 3215-4445.
Endereço: Rua Visconde de Pelotas, 586, bairro Centro.
E-mail: museumunicipal@caxias.rs.gov.br.
:: Visitantes em 2017: 6.749.
:: Visitantes em 2018 (até julho): 3.017.
# Memorial Atelier Zambelli
As visitações estão temporariamente indisponíveis, por conta da reforma do espaço.
Endereço: Espaço Interno Monumento Jesus Terceiro Milênio.
Parque de Exposições Mário Bernardino Ramos (Pavilhões da Festa da Uva).
Telefone: (54) 3221-2423 ou 3215-4445.
:: Visitantes em 2017: 4.293.
:: Visitantes em 2018 (até julho): 0.
# Museu Ambiência Casa de Pedra
Horário de visitação: de terça a sexta-feira, das 9h às 17h, e aos sábados, das 11h às 17h
Horários aos domingos: consultar pelo telefone (54) 3901-1463 ou 3215-4445
Endereço: Rua Matteo Gianella, s/nº, bairro Santa Catarina.
:: Visitantes em 2017: 12.294.
:: Visitantes em 2018 (até julho): 3.568
# Museu da Uva e do Vinho Primo Slomp
Horário de visitação: de terça a sexta-feira, das 9h às 17h, e aos sábados das 11h às 17h
Horários aos domingos: consultar pelo telefone (54) 3221-2423.
Endereço: Rua Luiz Franciosi Sério, nº 350, Forqueta.
:: Visitantes em 2017: 3.322.
:: Visitantes em 2018 (até julho): 1.301.
# Museu dos Ex-combatentes da Força Expedicionária Brasileira na II Guerra Mundial
Horário de visitação: de terça a sexta-feira, das 9h às 17h, e aos sábados das 11h às 17h. Horário alternativo mediante agendamento.
Endereço: Rua Visconde de Pelotas, nº 249, bairro Centro.
Telefone: (54) 3901-1422.
:: Visitantes em 2017: 3.307.
:: Visitantes em 2018 (até julho): 2.065.