A participação do secretário de Trânsito e Mobilidade Urbana de Gramado numa abordagem a uma motorista da Uber exemplifica a conturbada operação do serviço naquela cidade. Diferentemente de Caxias do Sul, que suspendeu a fiscalização aos condutores do aplicativo enquanto se discute a regulamentação, em Gramado os fiscais identificam e multam os motoristas do Uber. Desta vez, porém, a polêmica ganhou as redes sociais, pois envolveu diretamente o titular do Trânsito, Luiz Quevedo. O aplicativo opera em Gramado e cidades vizinhas há pouco mais de um mês.
Em desabafo no Facebook, Adriana Silva de Moura, 36 anos, afirma ter sido obrigada a parar o carro pelo secretário, na última terça-feira, no bairro Carazal. Adriana alega que transportava quatro passageiros que haviam lhe pedido carona, mas não cobraria pelo serviço.
– Eu conhecia essas pessoas que me pediram carona, já havia encerrado o expediente e decidi levá-los até o Centro. Estava até com o aplicativo desligado. Mas daí apareceu esse senhor (Quevedo) me fazendo sinal para parar. Ele se aproximou e mandou ir mais para a frente, onde havia uma parada de ônibus e os fiscais – conta Adriana.
Ali, Quevedo teria exigido que os passageiros desembarcassem. Adriana argumentou que não estava trabalhando para o Uber naquele momento, o que não convenceu a fiscalização. Houve bate-boca entre os servidores, a motorista, o secretário e os passageiros. A mulher saiu dali multada e com sete pontos na carteira. Adriana diz ter perdido o emprego há três meses e está trabalhando com o Uber desde a semana passada. Desde a confusão na terça-feira, ela decidiu parar temporariamente com a atividade.
– Me disseram que eu estava sendo monitorada há dias. Eu só quero trabalhar, ter uma forma de sustento – diz a mulher.
O rigor da prefeitura tem sido uma resposta à pressão dos taxistas de Gramado, que estão incomodados com a queda de passageiros desde a chegada da plafatorma. Já houve protesto com carreata e relatos de ameaças e até mesmo confronto entre taxistas e motoristas do Uber na madrugada do último sábado, o que exigiu intervenção da Brigada Militar (BM).
OPINIÃO
Até o fechamento desta edição, o Uber também não retornou a um pedido de informação da reportagem.
POR QUE CAXIAS NÃO MULTA
# Desde a implantação do Uber em Caxias, em outubro do ano passado, a Secretaria de Trânsito, Transportes e Mobilidade optou por não fiscalizar os condutores que trabalham com a plataforma.
# A decisão parte de uma recomendação do promotor Adrio Gelatti, da 2ª Promotoria de Justiça Especializada de Caxias do Sul, que disse não ver clandestinidade na operação na cidade, mas recomenda a regulamentação do serviço.
# Conforme Gelatti, o aluguel de carros com motorista, atividade na qual o Uber se enquadra, é legalizada no Brasil e já existia antes das plataformas digitais. Por outro lado, a prefeitura revisa o projeto de lei que regulariza o serviço na cidade e deve encaminhá-lo para nova apreciação da Câmara de Vereadores nos próximos dias.
Regulamentação em análise
Em nota, o secretário de Trânsito de Gramado, Luiz Quevedo, garante que a motorista Adriana Silva de Moura admitiu, no início da abordagem, que estava prestando o serviço de transporte através do Uber. Segundo a informação oficial, a equipe que realizou a fiscalização era composta pelo secretário e mais dois agentes de trânsito. Não houve qualquer ameaça em acionar a Brigada Militar para remover o veículo, já que para o tipo de infração não cabia a apreensão do veículo. Conforme Quevedo, a motorista recebeu o auto de infração pelos agentes de trânsito, segundo estabelece o Código Nacional de Trânsito, e foi liberada.O projeto de lei que regulamenta a atividade está em análise pela procuradoria do município e, em breve, será encaminhado à Câmara de Vereadores para apreciação. O projeto foi elaborado pela Secretaria de Trânsito com base em legislações existentes em diversas cidades do Brasil.
A prefeitura reitera que não é contra a implantação do serviço Uber desde que ele esteja regulamentado, como hoje ocorre com o serviço de táxi. Sobre os atos de violência, o Executivo ressaltou repúdio a qualquer comportamento agressivo e informou que a Secretaria de Trânsito está apurando o caso e tomará as medidas cabíveis. A fiscalização ao Uber também será mantida de acordo com o Código de Trânsito Brasileiro.
"Bagunça não é comigo"
Diante das confusões envolvendo colegas e motoristas do Uber, Glaci Arnold renunciou nesta semana ao cargo de presidente da Associação dos Taxistas Autônomos de Gramado (Atag). A função desempenhada por ela durante cinco anos foi assumida pelo vice-presidente, Geraldo Desordi.
– Bagunça não é comigo, sou contra a desordem. Precisamos esperar a regulamentação, mas está havendo muita pressão. Já fiz muito nesse período como presidente, então decidi deixar – justifica a taxista.
Desordi, por sua vez, ressalta que já ocorreram diversas reuniões com a prefeitura, mas ainda não há perspectiva de regulamentação. Ele também repudia os confrontos entre as duas categorias.
– Não somos contra, afinal está espalhado por tudo que é local. Só que perdemos uns 30% de passageiros. Por isso queremos que eles também (Uber) sejam regulamentados como a gente, pois pode inibir um pouco essa concorrência que não está sendo justa.