Gilberto Blume: de boas intenções o inferno está cheio

Desde que somos seres comunicativos dizemos, de algum jeito, que de boas intenções o inferno está cheio.

Eu diria que o inferno está lotado, superlotado.

A lei que proíbe crianças a partir de seis anos frequentar escolas infantis está embrulhada em ótimas intenções. Mas a lei não poderá ser aplicada porque aqui fora dos gabinetes, onde a realidade às vezes se aproxima do inferno, praticamente nada está sendo feito para atender essa criançada toda que não tem com quem ficar enquanto os pais trabalham (ou precisam trabalhar, o que é bem diferente).

Acaso as prefeituras estão prontas para oferecer vaga a todas as crianças a partir de quatro anos na escola infantil.

Não, não estão, e a lei entra em vigor no ano que vem.

A lei que multa quem joga lixo na rua alterou alguma coisa?

E a proibição de fumar até sob marquises e em paradas de ônibus é respeitada?

Estacionar em lugar proibido dá multa, além de ser desrespeitoso. E daí? (Ciro Fabres, tens algo a acrescentar?).

A última das últimas boas intenções veio em formato de campanha - campanhas, sem exceção, ajudam a empilhar boas intenções no inferno.

Diversos órgãos e entidades lançaram ontem a Campanha de Combate à Poluição Sonora.

Dará certo?

Reduzirá a baderna, o som alto, os excessos cometidos por bares e casas noturnas, a propaganda abusiva dos alto falantes de mercados?

A pergunta é: se já tem lei contra excessos, no que a campanha será útil?

"Conscientização" é termo comumente empregado no lançamento de campanhas.

Alguém poderá me classificar como cético. Que classifique, é justo, mas digo que algumas medidas precisam ser combinadas entre todas as partes. Essa combinação prévia invariavelmente passa pela educação, pela tradição ética, por bons exemplos, por estrutura familiar, por todos essas parcerias que resultam no caldo apropriadamente chamado de cultura - é daí que vem a conscientização, ao natural, sem imposições e empilhamento de regras, campanhas, cartilhas, ou esse sem fim de intenções que muitas vezes não passam disso, de intenções.