Dia desses terminei de ler uma coletânea de contos do escritor russo Anton Tchekhov (1860-1904), um dos autores universais que melhor soube retratar a essência da alma humana a partir de um estilo direto de escrita, desprovido de enfeites. Curto e certeiro, poder-se-ia dizer, e digo-o, então. Deparei-me ali, naquelas páginas, em meio às três dezenas de breves histórias selecionadas, aquele que se configurou aos meus olhos como o mais triste conto que eu já li em minha vida. Não porque a história seja triste em si (e ela o é, de fato), mas devido à sensação de profunda tristeza que causou em mim.
Trata-se de uma historinha curtíssima, de apenas três páginas, intitulada "Pamonha", na qual certo senhor abastado decide chamar ao seu escritório a governanta da casa, a fim de acertar com ela as contas após dois meses de trabalho. Tímida e assustada, a mocinha entra nos domínios do patrão e põe-se a escutar o homem elencar uma lista de motivos inverossímeis pelos quais vai descontando aviltantemente os valores que lhe deveria pagar. Para começo de conversa, ele parte de uma soma inferior ao que havia sido anteriormente combinado para ser paga por mês, e vai inventando descontos, frente aos quais ela quase nada retruca, encolhendo-se na cadeira, sumindo diante da tremenda injustiça que as páginas escancaram.
Opinião
Marcos Kirst: deparei-me naquelas páginas, aquele que se configurou como o mais triste conto que eu já li
Triste e verdadeiro mundo, tão bem traduzido por Tchekhov
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