Tempos atrás, ganhei de presente uma panela wok. Sabem o que é uma panela wok?
Explico: a panela wok é um utensílio de cozinha originário da China, concebido para ser versátil em seu uso (é capaz de refogar, fritar e/ou cozinhar a comida), permitindo que o calor se distribua de maneira uniforme pelos alimentos nela contida. É um objeto de desejo para gourmets e amadores, sendo que me incluo entre esses últimos. Ao menos, achava que me incluía até a semana passada, quando decidi finalmente estrear minha garbosa panela wok materializando uma receita com legumes e carne de porco que escolhi a dedo (limpo) em um livro de receitas exclusivas para serem feitas em... panelas wok!
Era dia de semana, encerrei minhas tarefas profissionais cedo e dei início aos trabalhos cozinhais. Como todo bom cozinheiro sabe (até os maus cozinheiros como eu o sabem, por sinal), é recomendável ler toda a receita antes de começar a prepará-la, para não ser surpreendido no meio do caminho por algum passo irreversível (um amigo meu, chamado Argentino, certa vez, só descobriu na metade do processo que o polvo deveria ser cozinhado vivo, mas aí já era tarde demais). Li a receita, preparei os ingredientes, piquei alguns, ralei outros, fiz o caldo, cortei a carne, temperei o porco, escorracei o gato e mandei bala.
Duas horas depois de muito vapor e suor, o cozido estava pronto. Apesar de ter levado o quádruplo do tempo que a receita velhacamente previa, o aspecto condizia com o da fotografia no livro. A esposa chegou do trabalho e fomos à mesa, ávidos para saborear o resultado do presente e de sua estreia. Uma garfada, duas garfadas, algumas mastigadas, olhares trocados e a concordância mútua: "bom, bom, bonzinho...". Foi aí que minha esposa, num lampejo, pegou o vidrinho de molho shoyu e disse: "talvez se metermos um pouco disso, o sabor não realça?". Pois assim disse, assim fez e assim se deu: tacou o shoyu e, em um segundo, enriqueceu a receita que eu levara duas longas horas para produzir.
Lance de gênio. A genialidade está nas pequenas coisas, e não se sensibiliza com o suor dos esforçados. Ela simplesmente contempla os que lhe caem nas graças. Como é que eu não vi aquele vidro de shoyu antes?
Opinião
Marcos Kirst: A genialidade está nas pequenas coisas, e não se sensibiliza com o suor dos esforçados
Como é que eu não vi aquele vidro de shoyu antes?
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