Característica essencial para qualquer pessoa que busca abrir um novo negócio, a vocação empreendedora não costuma ser um elemento suficiente para se manter competitivo no mercado de startups. Pessoas ligadas ao segmento afirmam que também é importante aliar o conhecimento técnico e tecnológico para se destacar — além de poder conviver em um ambiente propício para o compartilhamento de informações e interação para o crescimento do negócio. Um exemplo de espaço que reúne essas características é o Ecoinovelabs, ligado ao Grupo Ecoinove (anteriormente Uniftec), em Caxias do Sul. Estimular projetos tecnológicos move também a economia e startups observam crescimento e ampliam a atuação no mercado.
Atualmente, sete startups estão sediadas no Ecoinovelabs em Caxias e outras cidades gaúchas, somando mais de 70 pessoas envolvidas nesse ambiente de inovação. O espaço foi criado há sete anos no bairro Cinquentenário e ocupado, inicialmente, para fomentar o empreendedorismo dos estudantes da instituição de ensino, mas aberto à comunidade no ano seguinte para o desenvolvimento de startups, que alugam a sala ou que são parceiras da instituição.
Divididos em espaços de vidros, onde todos enxergam todos, o local dispõe ainda de mesa de jogos e um palco no meio do espaço, permitindo encontros e troca de experiências entre os diferentes negócios localizados ali, que vão desde aplicativos, sistemas, e-commerce e inteligência artificial.
Esse ambiente, além de fomentar negócios que começam quase do zero, também atrai empresas sólidas e com décadas de atuação no mercado. Há quase um ano, uma fornecedora caxiense de sistemas de gestão para indústrias e outros segmentos ingressou no Ecoinovelabs com um setor de criação para somar ao espaço colaborativo e acompanhado pela expertise de uma instituição de ensino, formadora de novos profissionais e relacionada à pesquisa acadêmica como ativos importantes no desenvolvimento de novos negócios.
— Somos um hub de inovação e as empresas que desejam estar aqui podem se sentir à vontade, alugam o espaço e desfrutam de todos os benefícios que um ambiente colaborativo permite para o desenvolvimento desses negócios. Observamos que as organizações estão percebendo que, dentro da sua própria estrutura, é mais difícil ter um ambiente saudável para ser criativo o suficiente para desenvolver as habilidades necessárias nesse meio e encontram aqui esse caminho — explica o coordenador do espaço, Emerson Luis de Vargas.
Além disso, os alunos da instituição também são incentivados a participarem do espaço, onde aulas são ministradas para que entendam que o espaço é de aprendizagem e troca de conhecimento e não apenas voltado ao trabalho.
— Um espaço aberto, que não se assemelha a uma indústria, por exemplo, faz toda a diferença. Estamos falando novos meios de trabalho, onde tu podes fazer uma reunião e jogar ping-pong, que é algo incentivado e praticado em outros lugares. A união entre as empresas que estão aqui é benéfico para todos também. Espaços compartilhados são o futuro. Uma empresa está com um problema e, do teu lado, pode ter alguém que solucione isso. Basta interagir — exemplifica Vargas, que também é professor e coordenador dos cursos de Gestão da instituição.
Para o futuro, o espaço buscará atender a uma demanda que foi acelerada com a pandemia: há mais interesse no mercado em soluções tecnológicas que resolvam dores do mercado. A ampliação da estrutura física do Ecoinovelabs é estudada pela instituição para abarcar novas ideias que virem negócios promissores.
— Tem espaço? Tem. Está no fim? Também (risos). Pretendemos avançar no andar de cima até o ano que vem porque existe demanda e a tendência é que as empresas necessitem cada vez mais desses serviços — conta o professor.
A instituição também está presente no espaço, que fica próximo à sede principal. O serviço de e-commerce, página na internet que concentra todos os cursos a distância oferecidos pela Uniftec, ocupa uma das salas do Ecoinovelabs justamente para se integrar ao ambiente de inovação.
Segundo a coordenadora do e-commerce, Taciana Capelari, um dos próximos passos da instituição é digitalizar a experiência do usuário no site, seja atual ou ex-aluno.
— Como se trata de um hub de inovação, faz sentido estarmos aqui e não em outro prédio. Queremos desenvolver novas tecnologias no marketplace. Temos processos que são manuais e que podemos tentar automatizar. Essa equipe daqui está inserida em ambiente propício para o pensamento de soluções de outras tecnologias. Encontramos a saída aqui — afirma.
Startups do Ecoinovelabs
:: Uniftec Online, Uniftec Kids e Uniftec Marker
:: Minha Escola
:: Fluid State
:: Tecnobridge
:: Fênix Fab Lab
:: PrintUp 3D
:: Foccolab
Startup caxiense usa algoritmo para relacionar profissionais
Os processos de recrutamento, seleção e gestão de carreira dentro das organizações apostam cada vez mais na inteligência para encontrar o profissional certo e, mais do que isso, melhor posicioná-lo dentro dos setores da empresa. Essa é a proposta da Fluid State, startup caxiense criada pelo desenvolvedor Juremir Milani em 2019 e que alcançou 27 clientes nesse período, sendo a maioria grandes instituições de ensino privado do Rio Grande do Sul e também em Santa Catarina e São Paulo.
Na prática, o sistema trabalha com a felicidade no mercado de trabalho. Se pessoas satisfeitas com a sua função produzem mais e melhor, como direcioná-las para os cargos dentro da organização? Com a Fluid State, explica Milani, é feita uma coleta de dados (informações disponibilizadas pelo trabalhador), aplica-se o algoritmo e o sistema indica os postos de trabalho mais adequados para cada profissional.
A metodologia também foi desenvolvida pela empresa, em 2017, e operacionalizada dois anos depois por meio de pesquisa de Mestrado e que permitiu a estruturação da startup. Segundo ele, a aplicação é possível até mesmo para empresas menores, com até 10 funcionários, uma vez que a startup fornece o suporte como um setor de gestão de pessoas.
Com a plataforma, conforme o desenvolvedor, as empresas ganham profissionais mais engajados e reduzem a rotatividade nas empresas — um dos aspectos que mais demandam a atenção dos profissionais.
— Um dos nossos clientes é uma rede, com sete mil colaboradores e, por meio da nossa ferramenta, conseguimos ter uma fotografia da onde os professores e administradores de cada colégio se sentem mais felizes de trabalhar. Se estão mais perto ou longe de casa, se tem uma equipe boa, igualitária, diversificada — explica.
A ideia do negócio, segundo ele, surgiu dos sócios da Fluid State, que são ligados ao setor de recursos humanos. A parceria começou na década de 1990, quando eles trabalhavam com metodologias para o setor que classificavam os colaboradores por meio de pesquisa com adjetivos como “regular”, “bom” ou “muito bom”, por exemplo. Nos últimos, segundo ele, essa ferramenta enfrentou o que ele chama de “cansaço” dos gestores, prejudicando a coleta de informações.
— Entendemos que os profissionais de RH estão focados nessa metodologia que já vimos que gera um cansaço. O mercado ainda está procurando alternativas. Não temos, atualmente, muita força de entrada porque sabemos que a nossa metodologia é muita nova. Buscamos maturidade para estar mais fortes e temos certeza que, em algum momento, o mercado vai olhar o nosso produto e dizer que é isso que ele quer. Então, estamos buscando por essa “virada de chave” — relata Milani.
O investimento na elaboração do sistema chegou a R$ 1,5 milhão, feito com investimento entre os sócios, ou seja, sem um investidor por fora. No segundo ano de atuação, a startup atingiu o chamado breakeven, que é o ponto em que não há mais prejuízos, mas também não há lucros.
Em Caxias, segundo ele, é necessário avançar em ambientes compartilhados para permitir o surgimento e o desenvolvimento de novas ideias.
— Tínhamos um escritório de cem metros quadrados, com tudo organizado e deixamos para vir pra cá (Ecoinovelabs). Um espaço como esse funciona, dá certo, mas precisa de mais engajamento para engatar essa questão de colaboração e inovação. Nós, como atingimos o breakeven, não procuramos investidores, mas sim de networking, que traga conexões — afirma.
Aplicativo para escola aperfeiçoa plataforma com ferramenta de outra startup
Um dos benefícios de integrar um espaço de inovação e voltado para o desenvolvimento de startups é a integração entre os negócios. Foi o que fez o aplicativo Minha Escola, também do Ecoinovelabs, que incorporou na plataforma uma solução de chat desenvolvida pela TecnoBridge, que também está situada no Ecoinovelabs. Pelo aplicativo, professores e pais podem trocar mensagens, evitando o contato por meio de plataformas tradicionais.
— O uso do WhatsApp entre os professores é questionado, muitas vezes, por questões trabalhistas. E, como estamos próximos, surgiu a ideia de colocar uma ferramenta para substituir o Whats e centralizar as informações, permitindo que os professores e os pais não precisem se comunicar fora do nosso aplicativo — explica o responsável pela tecnologia do Minha Escola, Isaias da Silva Santos, que é formando da instituição.
Criada em 2019, a Minha Escola nasceu como uma agenda digital, idealizada para que os pais pudessem estar mais próximos da rotina dos seus filhos, acompanhando os registros escolares, especialmente na primeira infância. E foi evoluindo até se transformar em uma ferramenta mais robusta. Agora, além do registro e do chat, a plataforma reúne informações administrativas, financeiras e pedagógicas, da mesma forma que a agenda física, só que online, sem os obstáculos do papel e caneta. Atualmente, emprega 13 pessoas, todas em Caxias.
Além dessa parceria com a TecnoBridge, que representa a união de duas empresas, o aplicativo também firmou uma parceria com a Uniftec por meio de um serviço de curadoria de jogos e objetos de aprendizagem destinados para o público infantil. O site reúne games e outros recursos que trabalham habilidades específicas em crianças, como desenho, memória e capacidade cognitiva, por meio de diferentes estímulos.
Mais do que exemplos de parcerias locais para aperfeiçoar o negócio, o diretor de marketing da Minha Escola, Lucas Gabriel Paim, entende que integrar o espaço de inovação é poder se autogerenciar profissionalmente, algo que está mais distante de outros segmentos da economia, como a indústria e o comércio.
— A flexibilidade que esse modelo de negócio permite é essencial. Posso estar fazendo algo que não está dando certo e posso sair, jogar, tomar um café, conversar com o pessoal da outra startup, e depois volto e resolvo. Isso dá muito certo. A autonomia é fundamental — avalia.
Um dos principais nomes quando o assunto é metaverso e outras tecnologias que despontam na economia é de Pedro Bocchese. Ele é CEO da Núcleo Sistemas, integrante do espaço. A empresa engloba soluções de metaverso, como realidade virtual, aumentada, mista e sensoriais, para grandes organizações, além de inteligência artificial (bots, análise preditivas, biometria facial, reconhecimento de objetos), além de robôs e ferramentas para análise de dados.
Ser cliente e fornecedor é um dos caminhos para aperfeiçoar o trabalho das startups, segundo Bocchese.
— A importância de estar dentro de um ecossistema é estar integrado em um ambiente de colaboração, com criação e troca de experiências. O grande desafio, hoje, quando falamos de tecnologia e inovação são as pessoas. Esse movimento que estamos vendo tem como foco principal esse momento de relacionamento — avalia.