Assim como o céu em Caxias do Sul, o mundo do cinema também amanheceu nublado nesta segunda-feira, perdendo seu brilho com a notícia da morte do compositor italiano Ennio Morricone, aos 91 anos. O lendário autor de algumas das trilhas sonoras mais conhecidas da história da sétima arte, como a dos filmes Três Homens em Conflito (de Sergio Leone, 1966), Os Intocáveis (de Brian de Palma, 1986), e Os Oito Odiados (de Quentin Tarantino, 2016), faleceu em Roma, onde estava hospitalizado após sofrer uma queda na qual fraturou o fêmur.
Morricone era vencedor de dois Oscars: em 2007, recebeu a estatueta honorária, pelo conjunto da sua obra. Em 2016, recebeu pela primeira vez o Oscar de Melhor Trilha Sonora Original, com Os Oito Odiados. Ele já havia sido indicado cinco vezes, sempre batendo na trave. Ao longo da sua carreira, também foi premiado com três Globos de Ouro e três Grammys Awards, entre dezenas de outros prêmios.
Sócio da Spaghetti Filmes e professor de Cinema da UCS, o cineasta Lissandro Stalivieri considera que Morricone inicia e conclui uma era que leva seu próprio nome no cinema, tamanha sua contribuição para as trilhas sonoras. Destaca Era Uma Vez no Oeste (1984, de Sergio Leone) e Màlena (2000, de Giuseppe Tornatore), como alguns dos seus trabalhos preferidos do mestre.
- Ninguém tinha se projetado tanto com trilhas sonoras para cinema antes do Morricone jamais vai ter ouro como ele. Existe a trilha sonora incidental, a trilha experimental, mas Morricone conseguiu tirar a narrativa sonora do pano de fundo, colocando-a no mesmo nível da narrativa visual. Esse é um legado extremamente importante que ele deixa para toda a comunicação audiovisual - ressalta.
Regente da Orquestra de Câmara de Bento Gonçalves e compositor de trilhas sonoras, Gilberto Salvagni destaca o volume “espantoso” de trilhas sonoras deixadas pelo italiano: mais de 500 em meio século de carreira,indo muito além do gênero que o tornou mais conhecido, o faroeste.
- Acaba de passar de fase um dos mais profícuos e importantes compositores da trilha sonora mundial, dono de um talento pra tocar profundamente as pessoas, como se vê em pouquíssimos artistas. A palavra "emoção" ganha um sentido mais profundo depois que o agora imortal Ennio Morricone passa por nossas vidas. Missão cumprida, maestro.
Para o realizador audiovisual Everton Rigatti, a figura de Morricone é indissociável da história do cinema:
- A música é sempre importante nos filmes, mas com Morricone ela foi mais além. Enquanto escuto a trilha de Cinema Paradiso (1989, de Giuseppe Tornatore), por exemplo, é difícil segurar a emoção. Porque foi isso que ele sempre fez, como um cineasta dos sons: transpor sentimentos para a partitura.
Também entusiasta da obra de Morricone, o maestro da Orquestra Municipal de Sopros de Caxias, Fernando Berti Rodrigues, exalta o mestre e se diz ansioso para poder realizar um concerto em sua homenagem, quando for possível:
_ É o tipo de artista que transcende a questão sua própria arte, no sentido de que todo mundo já se pegou assobiando ou cantarolando o trecho de alguma música, talvez sem saber que é dele. Sua obra está no imaginário coletivo mundial. Particularmente, admiro a sua capacidade de orquestração, que é a maneira do compositor contar uma história através da música. Ele pegava uma ideia simples e a desenvolvia de uma maneira espetacular, prendendo o ouvinte, às vezes com instrumentos peculiares no começo, fazendo a música crescer até chegar num momento de êxtase que toma conta da imaginação da pessoa.
Compositora e pianista do Ária Trio, Esmeralda Frizzo classifica como vibrantes e tocantes as trilhas de Morricone, sendo a sua preferida a do filme A Missão (1986, de Roland Joffé):
- Suas composições são muito expressivas e cumprem papel importante no forma de contar a história do filme, talvez pela forma como trabalha as melodias: cheias de movimento e leves ao ouvido, apesar dos arranjos complexos. São obras que falam por si e é difícil eleger a mais bonita ou a mais importante.
Algumas das trilhas sonoras mais famosas de Morricone:
1964: Por um Punhado de Dólares, de Sergio Leone
1965: Por uns Dólares a Mais, de Sergio Leone
1966: Três Homens em Conflito, de Sergio Leone
1968: Teorema, de Pier Paolo Pasolini
1968: Era uma Vez no Oeste, de Sergio Leone
1969: Os Sicilianos, de Henri Verneuil
1971: Decameron, de Pier Paolo Pasolini
1971: Sacco e Vanzetti, de Guiliano Montaldo
1974: Medo sobre a Cidade, de Henri Verneuil
1975: Saló ou os 120 Dias de Sodoma, de Pier Paolo Pasolini
1976: 1900, de Bernardo Bertolucci
1978: Cinzas no Paraíso, de Terrence Malick
1978: A Gaiola das Loucas, de Edouard Molinaro
1981: O Profissional, de Georges Lautner
1984: Era uma Vez na América, de Sergio Leone
1986: A Missão, de Roland Joffé
1987: Os Intocáveis, de Brian de Palma
1987: Busca Frenética, de Roman Polanski
1989: Cinema Paradiso, de Giuseppe Tornatore
1989: Ata-me!, de Pedro Almodóvar
1989: Pecados de Guerra, de Brian de Palma
1998: A Lenda do Pianista do Mar, de Giuseppe Tornatore
2000: Malèna, de Giuseppe Tornatore
2000: Missão: Marte, de Brian de Palma
2015: Os Oito Odiados, de Quentin Tarantino
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