No sábado, Dani e eu fizemos um ano de casadas. Bodas de papel. Eu li que o material escolhido simboliza o contrato assumido e sua fragilidade. Papel a gente rasga, molha, amassa, e se não cuidar direito se deteriora. Não sei contar quantas discussões já tivemos, nem quantas caras feias fizemos uma para outra, só sei que foram infinitamente menos vezes do que as caras boas, os sinais de compreensão, as conversas generosas e abertas e tudo o que vamos criando como estratégia de manutenção do nosso amor.
Tenho visto ao meu redor tanta história ruim. Casamentos reais em que uma das pessoas mente, em que uma das pessoas se sente tão fragilizada que prefere tolerar uma falta imensa de demonstrações amorosas. Tenho visto casais de mais idade se tratando não mais como companheiros de vida, mas como fardos. Tenho visto coisas muito tristes como contratos de boca e de papel deteriorados a ponto de não serem nem lembrados. Casais que não se falam; casais que se falam, mas não se compreendem. Qual é a força que os mantêm juntos nessa situação de miséria amorosa?
Uma instituição a qual se atribui tão grande poder será mesmo algo muitíssimo violento. Porque violência não é só algo que vemos em manchas roxas e cicatrizes na pele. Eu nem estou falando disso. (Mas para este caso, ligue 180) Aqui estou falando das estruturas, das regras, para muitos e muitas, invisíveis, pelas quais a violência nos oprime. Aquele sexíssimo todo muito banalizado que afeta, molda, retorce e engessa nossas feminilidades e nossas masculinidades. Aquilo que pode ser traduzido na ideia idiota de que homem é provedor, forte, não chora, não conversa, não fala dos problemas, versus a ideia mais idiota de que mulher é provida, frágil, só chora, só quer conversa, só fala dos problemas. Pois há muita gente que ainda crê nestes estereótipos, acredite.
Essa instituição, atolada no binômio fundamental da dominação e da exploração, chamado patriarcado capitalista, jamais nos deixará viver um casamento real, seja lá qual o formato ou a ideia que se possa fazer disso. Se não começarmos compreender essas estruturas e instituições em suas complexidades sociais, se não começarmos urgentemente a nos discutirmos sujeitos mais móveis, estaremos fadados à tristeza da completa ignorância e de fantasias matrimoniais terríveis.
Aos que celebram seus casamentos reais, desejo lucidez, vontade e, sobretudo, um amor maleável e duradouro, cheio de escuta e afagos.