Quando esta frase da Margaret Atwood passou na minha timeline, parei. Homens têm medo que as mulheres riam deles. Mulheres têm medo que os homens as matem. Li novamente.
Posto isto, quero contar sobre algumas das vezes que sofri com assédio, violência e medo. Sempre fui para a escola a pé. Um dia um homem numa bicicleta achou que estava tudo bem se masturbar ao meu lado no caminho. Corri para a escola. Cheguei pálida, asmática. Não falei nada. Como eu mencionaria tal caso?, pensei. Eu tinha 11 anos. Depois mais meninas começaram a chegar pálidas na escola. Sentimos medo. Na adolescência, fui obrigada a beijar quatro meninos numa festa de escola para poder passar por um corredor. Fui chamada de puta por um ano. Eu tinha 13 anos. Isso deu aval para que alguns de meus colegas se sentissem à vontade para passar a mão em mim. Durante as aulas de ciências, me debruçar sobre o microscópio era arriscado. Mas não era só comigo, isso era comum entre algumas colegas. Tínhamos medo. Aos 18, quando fui assinar uma rescisão de contrato, meu chefe achou que poderia me dizer: "nossa, como tu tá gostosa". Engoli a raiva. Quando comecei a sair à noite, tive que desenvolver habilidades contorcionistas para me desvencilhar de investidas sexuais que vinham em forma de puxões e beijos forçados. Cresci com medo. Eu nunca dizia nada. Não porque não queria. Eu queria gritar que ninguém tem o direito de fazer o outro se sentir oprimido. Eu queria perguntar o que faz essas pessoas pensarem que isso está certo? Que podem agir assim? Mas me ensinaram a não contestar. É perigoso. Então, eu tinha medo de alguma reação descabida. Como um soco ou um tiro. Não é exagero:
Shirley foi decapitada pelo namorado, porque queria terminar com ele, a foto de sua cabeça foi postada no facebook. Isabela e Michele foram estupradas e mortas ao tentarem fugir de seus "amigos" que, por diversão, simularam um assalto, estupraram e mataram as convidadas de uma festa. Isamara, seu filho e mais 10 pessoas foram assassinadas neste réveillon. O Brasil é o quinto país do mundo onde se mata mais mulheres. Cinco mulheres são espancadas a cada 2 minutos aqui. Uma é estuprada a cada 11 minutos. Não é exagero.
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A violência contra as mulheres é sim um problema social, enraizado nas nossas relações e incansavelmente reproduzido em comportamentos e discursos. A violência contra a mulher pode ser verbal, física, psicológica ou mesmo econômica.
Não quero ter medo. Não quero que tenhamos medo. Precisamos (mulheres e principalmente homens) entender que o machismo mata. Mata todos os dias. Aos poucos ou rápido, mata muito. Precisamos de debate, prática, educação, entendimento, e políticas públicas para que o machismo um dia pare de nos matar.