A ordenação de padres era festa principal de Paraí quando Ezequiel Dal Pozzo era criança. O encontro era capaz de reunir uma multidão na praça central do município, e o fascínio pela vida sacerdotal e religiosa se mantém praticamente intacto.
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É pouco provável que algum dos 7,3 mil moradores não conheça, conviva ou seja familiar de um padre ou uma freira. Lá, existe um conterrâneo com vida religiosa para cada 42 habitantes, ou um padre a cada 165 residentes _ a média brasileira é de um a cada 8,6 mil, segundo o Centro de Estatística e Investigações Sociais.
- Isso acontece porque alguém motiva e constrói. Deus age em todo o lugar, mas Paraí é um celeiro de vocações no Rio Grande do Sul - afirma Dal Pozzo, 36 anos.
Sacerdote dos mais carismáticos de sua geração, Dal Pozzo deve a descoberta da vocação, em parte, ao ambiente onde nasceu.
- É mais difícil surgirem padres onde a religião está decadente. Havia o incentivo da comunidade, uma acolhida total - observa.
Mais novo de quatro filhos, teve um irmão seminarista - além de 13 padres na família - e ficava encantado com o conhecimento que ele possuía. A convivência com esse universo levou-o a sentir vontade de tornar-se um deles. Aos 17 anos, ingressou no seminário e foi ordenado em fevereiro de 2007. O irmão acabou desistindo.
- É como numa família de dentista, um acaba influenciando o outro, como se fosse uma corrente - compara, dizendo que durante 10 anos Paraí foi a cidade com mais vocacionados na região.
Em pouco mais de oito anos, Dal Pozzo lançou cinco CDs e um DVD com canções próprias que venderam 100 mil cópias, apresenta o programa Despertai para o Amor, que vai ao ar em quatro emissoras, e transmite mensagens de fé em 85 rádios do país. Além disso, reza missas que reúnem milhares de fiéis por semana em Caxias do Sul e faz shows pelo Brasil. No final de dezembro, lotou a praça paraiense durante uma apresentação de Natal.
- Foi muito bom me apresentar na cidade, para mostrar o que a gente faz. Não dá para contabilizar quanto posso influenciar alguém, mas como eu olhava para alguns padres, imagino que os jovens olhem para os padres de hoje. E, cada um a seu modo, pode ser um exemplo - afirma.
Cita o padre Félix Busatta como grande líder e orientador na cidade, homem que ensinava a plantar e a construir ruas retas, além de ser um incentivador das vocações. O pároco de Paraí, o padre bento-gonçalvense Volmir Comparin, também atribui parte desse fenômeno ao carisma do padre Busatta, além das famílias manterem a religiosidade católica.
Outro fator, para ele, diz respeito à animação vocacional, porque as escolas do município ainda aceitam equipes diocesanas para conversar com os jovens sobre a vida religiosa - o que não ocorre mais em cidades próximas, como São Jorge, Nova Araçá e Guabiju.
Vida de sacerdote
Animador vocacional, o padre caxiense Lucas Antônio Mazzochini explica que a visita às escolas é uma entre tantas possibilidades de conversar com os jovens sobre as vocações. Nesses momentos, alunos podem participar de encontros nos seminários, em três ou quatro períodos de convivência, para conhecer a rotina do lugar e iniciar o processo de discernimento.
- Nessas visitas, apresentamos as vocações e normalmente além do padre tem uma religiosa e outros irmãos, que não são padres mas são consagrados - explica.
Ocasiões especiais, como a ordenação de um sacerdote, também são motivos para ir a escolas, a turmas de catequese e aos grupos de jovens, entre outros. Cidades maiores, como Caxias, costumam receber a visita em partes, por paróquias, por causa da quantidade de locais. Cidades menores recebem o grupo mais frequentemente.
Foi em uma investida do grupo de animação vocacional ao colégio que Rodrigo Bordignon, 19 anos, decidiu ingressar no seminário. Deixou Paraí para estudar em Caxias e atualmente integra o grupo de oito alunos do Seminário Maior São José - três são paraienses.
- Em 2011, o padre Juarez (Bavaresco) passou na escola para convidar os interessados a irem para o seminário, mas não gostei da ideia. Ele entregou uns papeis para preencher e nem peguei. Quando contei para minha mãe, ela sugeriu que eu pensasse melhor. À noite, conversei com Deus e, em uma atitude de coragem, decidi aceitar - relata Rodrigo, que foi para o seminário com sete colegas e tem dois padres na família.
No caso de Gabriel Guilherme Frigo, 18, o processo foi mais natural. O irmão de um vizinho era seminarista, ele era coroinha na igreja e, graças à atividade, sentia-se mais próximo à missão de um sacerdote. Quis, então, aprofundar-se.
- Sacerdócio é uma entre as vocações, mas a vida de seminarista não é uma vocação, é uma etapa (para chegar a ela) - reflete ele, que ingressou com cinco paraienses.
Ao longo da formação, muitos jovens optam por outros caminhos. A turma inicial de Rodrigo no seminário tinha 15 alunos de Paraí, mas apenas ele continua os estudos. Quando Daniel Reginato Turcatel, 18, entrou no Seminário Diocesano Nossa Senhora Aparecida, em Caxias, foi com dois colegas paraienses, a convite do padre Juarez, que visitou o colégio onde estudava.
Os amigos desistiram no primeiro ano, Daniel deixou o seminário ao completar o ensino médio, no final do ano passado.
- Entrei no seminário porque sempre tive uma boa impressão, dois primos meus haviam sido seminaristas e tinha a segurança de ter muitos conhecidos por lá. Fazendo o discernimento, descobri que poderia ter outras oportunidades, mas a experiência é muito boa, gostei muito - conta.
Neste domingo, Daniel prestará vestibular para relações internacionais na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Paralelamente aos estudos, pensa na possibilidade de ser modelo, já que foi abordado pelo olheiro Edson Ferreira durante as gravações do programa Profissão Repórter.
- Fui para São Paulo em dezembro, fiz testes e me pediram para voltar em maio. Vamos ver o que acontece - diz, com fé.
Comportamento
Paraí é reconhecida na região como celeiro de padres e freiras
No município, existe um paraiense com vocação sacerdotal e religiosa para cada 42 habitantes
Tríssia Ordovás Sartori
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