Detestava Biologia. Hoje, 40 anos depois, admito o equívoco. Lembro Malu Mader, Felipe Camargo, os Anos Dourados. Aqueles anos do então chamado 2º Grau eram, inegavelmente, anos dourados, de despreocupação juvenil e o despertar de interesses para a vida. No meio daquilo tudo, era preciso concentrar atenção em Gregor Mendel, meiose, mitose, reino vegetal, reino animal, amebas e protozoários... Era um calhamaço. Biologia era uma disciplina de muita teoria, pelo menos na forma como era apresentada, e não me ocorria outro recurso que não fosse a decoreba na hora das provas.
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Era um sacrifício monumental. Então, a decoreba ocupava o lugar da curiosidade, que não havia da minha parte, incrivelmente, em uma fase de tantas curiosidades. Hoje constato constrangido essa ausência de curiosidade. Mas não vou enfileirar o argumento fácil e surrado de que as aulas não eram atraentes. Não vou empurrar a culpa para os outros, para a professora. Não é tão simples tornar criativa uma aula de Biologia. Talvez, quem sabe, com os recursos de hoje da tecnologia.
Eu não me interessava por Biologia porque era um tapado, não vislumbrava o mundo em sua amplitude, ainda não havia me arriscado a esses exercícios, meus interesses eram escassos por minha exclusiva inaptidão para a curiosidade. No 2º Grau, portanto, detestava Biologia.
Um pouco antes, o 2º Grau chamara-se científico e seus siameses, os cursos clássico e normal – ou magistério. Agora o nome é ensino médio, alvo de mais uma reforma. Hoje, com a curiosidade despertada em algum momento qualquer, sei que a Biologia é um universo de possibilidades para entender a vida, a existência. E isso é fascinante.
Depois do 2º Grau, formei-me em Engenharia e mergulhei fundo em outro universo, o dos limites, derivadas e integrais, da física quântica, que maravilha. No mundo dos limites e da matemática, surpreendi-me ao descobrir que, na verdade, o número puro não existe. Uma descoberta atrás da outra.
Pois agora essa reforma do ensino médio quer diminuir o conteúdo obrigatório para que os alunos não percam tempo com conhecimentos que julgam desnecessário ou – é comum ouvir isso – que nunca irão aproveitar na vida, filosofia à frente. A pressa invade a educação. Não perder tempo é a ordem. A consequência é desestimular a curiosidade e a amplitude do conhecimento.
Que dias sem graça! Se vigorasse a reforma do governo Michel Temer no meu tempo de 2º Grau, pobre Biologia! Seria eliminada sumariamente de meu radar. Mas ainda bem que pude conhecer Gregor Mendel e sua turma, o básico de cada coisa para me orientar melhor no mundo.