Há 14 anos, Solon Queiroz se dedica a um projeto voluntário criado por ele: a escolinha de futebol Alô Galera, em Entre-Ijuís, município de 9,1 mil habitantes do noroeste gaúcho. Além da iniciativa, o que chama a atenção é a maneira como ele ensina as técnicas fazendo embaixadinhas com as mãos, andando de joelhos e até mesmo se arriscando como goleiro.
É que as aulas da escola, que já conta com mais de 100 alunos, ensinam muito mais que futebol: Solon é uma pessoa com deficiência. Aos oito anos, recebeu o diagnóstico de poliomielite, doença mais conhecida como paralisia infantil. Desde então, ele nunca mais caminhou, mas manteve em pé o amor pelo futebol.
Hoje, aos 61 anos, ele torce para o Grêmio e vive com a família na Esquina Queiroz, interior de Entre-Ijuís, a cerca 15 quilômetros da zona urbana. Radialista, Solon se dedica ao projeto três vezes por semana assim que termina seu expediente em uma rádio local.
O projeto saiu do papel em 2010, quando ele soube que o primeiro filho estava a caminho e teve medo de que a criança pudesse nascer com as mesmas limitações. Como o menino veio ao mundo com saúde perfeita, decidiu realizar um sonho antigo e criou a Escolinha Alô Galera. O trabalho inclui aulas gratuitas a crianças e adolescentes de três a 14 anos.
— Não tem nada igual. Não tem dinheiro que pague trabalhar com as crianças. Eu sempre pedi a Deus que me desse saúde com toda limitação que tenho, com as dificuldades pra me locomover, por isso não vou desistir, isso aqui é um sonho que me ajuda viver — disse.
No projeto, ele é recebido pela criançada que ajuda a empurrar a cadeira de rodas, pega uma carona no colo do professor e até brinca de cavalinho ao subir em suas costas, enquanto ele anda de joelhos no chão.
— O professor é um exemplo de vida. Ele leva a gente, dá o melhor aqui na escolinha. Não tem o que falar dele, sem palavras — disse o aluno Bruno Teixeira de Souza.
— Ele traz para as crianças aquele exemplo de superação que a gente leva para o resto da vida — afirmou o professor de Educação Física Luciano Mousquer, que integra o projeto.
Projeto tem o sonho de levar crianças para conhecer estádios
Com o passar dos anos mais voluntários se sensibilizaram e passaram a integrar a equipe, como é o caso do Eder. Ele é empreendedor e reorganiza sua agenda de trabalho para auxiliar nos treinos.
— Desde a primeira vez que eu botei o pé no ginásio e vi o Solon atravessar toda a quadra de joelhos, chegar no meio e trabalhar com toda aquela criançada... aquilo me tocou, né? Faz mais ou menos uns 10 anos que eu ajudo e, para mim, é muito gratificante, como tem dinheiro no mundo que pague ver a felicidade das crianças — afirmou o voluntário Eder da Silva.
Hoje, a escolinha é mantida por ações de voluntários, como vendas de rifas e pizzas. Para 2024, a meta é levar todas as crianças para Porto Alegre, onde poderão conhecer seus times do coração: Inter ou Grêmio. Quem tem a oportunidade de fazer parte da escolinha, vê de perto a importância e impacto que o projeto tem na vida das crianças.
— Quando a gente quer transformar o mundo, temos que começar pelas pessoas. Não conseguimos transformar o mundo inteiro, mas se a gente começar a plantar uma semente por dia, com certeza junto conseguimos melhorar — pontuou Mousquer.