Um juiz determinou nesta quarta-feira (16) que o governo do presidente Donald Trump "ignorou deliberadamente" a decisão de 15 de março que proibia a deportação de imigrantes com base em uma lei de 1798, o que considera um provável caso de "desacato" judicial.
"O tribunal determina, em última instância, que com suas ações naquele dia o governo ignorou deliberadamente sua ordem", escreveu o juiz federal James Boasberg.
Este magistrado havia suspendido as deportações baseadas exclusivamente na Lei sobre Inimigos Estrangeiros de 1798, quando mais de 200 pessoas - em sua maioria venezuelanos acusados de serem membros da quadrilha criminosa Tren de Aragua - estavam sendo deportadas para El Salvador.
Isso é "suficiente para que o tribunal conclua que existe uma causa provável para declarar o governo em desacato penal", acrescentou o juiz de Washington.
Em 8 de abril, a Suprema Corte suspendeu a proibição de expulsar imigrantes invocando a lei do século XVIII, mas principalmente por razões técnicas: os imigrantes que entraram com ações judiciais para evitar a deportação estavam no Texas, enquanto o caso diante de Boasberg tramitava em Washington.
Ainda assim, o tribunal superior considerou que os imigrantes devem poder contestar sua expulsão nos tribunais do estado de onde estão sendo deportados.
- "Às pressas" -
"Em vez de cumprir a decisão da Corte, o governo prosseguiu com a operação de deportação às pressas", lamentou o juiz Boasberg.
Na manhã seguinte, "várias horas após a decisão, transferiu os passageiros de dois aviões protegidos por essa suspensão para uma megaprisão salvadorenha", protestou.
Apesar de uma série de audiências judiciais, os funcionários do governo Trump "não apresentaram nenhuma justificativa convincente para evitar a conclusão óbvia, à luz da evolução dos fatos: que desobedeceram deliberadamente a decisão do tribunal", insistiu o magistrado.
No entanto, o juiz concedeu ao Executivo um prazo de uma semana, até 23 de abril, para evitar um processo de "desacato" ao tribunal e cumprir sua decisão de 15 de março. Caso contrário, solicita que o governo informe a identidade da pessoa ou pessoas que decidiram ignorá-la.
"Prevemos imediatamente uma apelação" contra as conclusões do juiz Boasberg, reagiu o diretor de comunicações da Casa Branca, Steven Cheung, na rede social X.
Até março, a lei de 1798 havia sido usada apenas em tempos de guerra, especialmente contra japoneses e alemães em território norte-americano durante a Segunda Guerra Mundial.
Entre os deportados em 15 de março está o imigrante salvadorenho Kilmar Ábrego García, apesar de uma decisão judicial de 2019 que revogou permanentemente a possibilidade de sua expulsão para El Salvador.
O governo reconheceu posteriormente que se tratou de um "erro administrativo".
Trump assinou um decreto que permite o uso da lei de 1798 contra membros do Tren de Aragua, declarado uma organização "terrorista" global por Washington.
O governo acusa, sem provas, Ábrego García de pertencer à gangue MS-13, também classificada como "terrorista".
Seu caso se tornou um símbolo da disputa entre Trump - que prometeu pôr fim ao que considera uma "invasão" de "criminosos vindos do exterior" - e os tribunais.
O presidente acusa os juízes de "usurparem" as prerrogativas do poder executivo e de obstruírem seus planos, os quais contam com o apoio do presidente salvadorenho, Nayib Bukele.
Este último colocou à disposição de Trump a megaprisão de segurança máxima Cecot para encarcerar os imigrantes deportados. Em troca, já recebeu 6 milhões de dólares (R$ 35,3 milhões) de Washington.
Trump afirma que não está em suas mãos trazer Ábrego García de volta aos Estados Unidos.
Bukele se alinhou com ele durante uma reunião na segunda-feira na Casa Branca, afirmando que também não tem "o poder" de enviá-lo de volta.
O senador democrata Chris Van Hollen viajou nesta quarta-feira a El Salvador para tentar ver Ábrego García e pressionar as autoridades.
Ábrego "foi sequestrado ilegalmente e precisa voltar para casa", disse após aterrissar no país centro-americano.
Trata-se "de respeitar as ordens judiciais", porque "o que separa os Estados Unidos do autoritarismo e da tirania é que respeitamos o Estado de direito", declarou o senador em um vídeo antes de sua partida.
No sábado, um funcionário do Departamento de Estado confirmou pela primeira vez que Ábrego García "está vivo e seguro" na Cecot, onde foram detidos ao menos 288 deportados.
* AFP