O socialdemocrata Bernardo Arévalo, que promete uma luta ferrenha contra a corrupção, venceu as eleições presidenciais da Guatemala, na América Central. Segundo o tribunal eleitoral do país, após apuração de 100% das mesas de votação, Arévalo conquistou 58% dos votos, contra 37% da candidata Sandra Torres, ex-primeira-dama e sua rival, que não reconheceu a derrota.
O atual presidente da Guatemala, o direitista Alejandro Giammattei, parabenizou Arévalo após 95% da apuração. "Parabenizo também Bernardo Arévalo e estendo o convite para iniciar uma transição ordenada no dia seguinte à oficialização dos resultados", disse em sua conta na rede social X, antigo Twitter.
Quase 3,5 mil centros de votação funcionaram normalmente durante o dia, e não foram relatados "incidentes significativos", segundo a presidente Irma Palencia, que descreveu ter havido uma "participação histórica".
Os embaixadores dos Estados Unidos e da União Européia expressaram sua vontade de trabalhar com Arévalo.
— Em nome do meu governo, a posição é que eles deixem os eleitos governarem e assumirem o poder — disse o embaixador dos Estados Unidos, William Popp, à televisão guatemalteca.
— O que vai ser importante agora é um consenso em nível nacional para garantir a governabilidade — afirmou o representante da UE Thomas Peyker.
De acordo com informações do Estadão, a eleição deste ano é uma das mais acompanhadas nos últimos tempos devido às dificuldades e interferências judiciais que o processo sofreu. No primeiro turno, por exemplo, os resultados oficiais demoraram mais de duas semanas para certificação. Os partidos que perderam conseguiram que os tribunais solicitassem uma segunda revisão da contagem de votos.
Na análise de especialistas
À agência de notícias AFP, o analista independente Miguel Ángel Sandoval destacou:
— A vitória de Arévalo significa uma derrota para a velha política, para o governo e para os nostálgicos da Guerra Fria. Um período diferente começa para o nosso país e será necessário uma mobilização para uma transição pacífica.
Para Francisco Rojas, reitor da Universidade para a Paz da Costa Rica, a experiência diplomática e parlamentar dão a Arévalo uma base de conhecimento "para formar uma ampla equipe de governo", o que aumenta a "sua legitimidade".
— Será necessário ver se Sandra Torres reconhece a derrota, mas haverá um período longo antes da posse (em 14 de janeiro de 2024). Serão tempos complexos — acrescentou.
Torres contou com o apoio silencioso de Alejandro Giammattei e de grupos como a elite empresarial aliada ao governo.
Ela lidera a Unidade Nacional da Esperança (UNE), um partido de centro-esquerda que nos últimos anos se inclinou para a direita. À tarde, Torres denunciou "algumas irregularidades" durante a votação. Nos últimos dias, a candidata chegou a questionar o processo de contagem de votos e pediu que a Justiça garantisse a "transparência" do segundo turno. Além disso, denunciou supostas "ações intrusivas" e "racistas" de observadores da União Europeia.
Para o analista político Edgar Ortiz, as declarações da candidata são "infundadas":
— Ela não apresenta provas, apenas faz afirmações sem fundamento, o que basicamente não fortalece o processo.
Embates
Em um país considerado conservador e religioso, Arévalo e Torres descartaram a legalização de casamentos entre pessoas do mesmo sexo ou o aborto, que é permitido apenas em casos de risco para a mãe.
No entanto, Torres, de 67 anos, tentou enfraquecer seu adversário afirmando que ele é ateu — embora seja católico como ela — e que ele deseja legalizar o aborto, uniões entre pessoas do mesmo sexo e drogas. Ela também chamou os seguidores do Semilla, partido do qual Arévalo é líder, de "huecos" (termo pejorativo para se referir a homossexuais).
Ela assegura que Arévalo planeja expropriações e que transformará a Guatemala "em uma Venezuela e em uma Cuba". Arévalo definiu a adversária como "a candidata da mentira e desinformação".
Quem é Bernardo Arévalo
Com 64 anos e sociólogo, Arévalo é filho do primeiro presidente eleito democraticamente na Guatemala, Juan José Arévalo (1945-1951), e promete seguir o caminho do pai com uma agenda social e de mudança forte.
A vitória ampla é atribuída ao fato de ter gerado esperanças de mudança em um país imerso em pobreza, violência e corrupção, fatores que levam milhares de guatemaltecos a migrar a cada ano. Porém, é visto com apreensão pela elite política e empresarial que governa o país e é acusado de corrupção.