O papa Francisco reivindicou, nesta terça-feira (14), a "integração" dos ciganos e lembrou que "marginalizar as pessoas não resolve nada", em um encontro com a comunidade cigana de um bairro marginalizado da cidade eslovaca de Kosice.
Nas semanas anteriores à esperada visita do pontífice, as autoridades da cidade limparam o bairro, consertaram a estrada que leva até ele e restabeleceram a energia elétrica.
"Marginalizar as pessoas não resolve nada. Quando alimentamos a marginalização, cedo ou tarde a raiva explode. O caminho para uma convivência pacífica é a integração", defendeu Francisco, depois de ouvir com atenção os depoimentos dos moradores desta região muito pobre.
Neste bairro, Lunik IX, onde a miséria e a superpopulação são males crônicos, 4.500 pessoas se amontoam em um espaço projetado para metade dos habitantes.
Muitas habitações sociais não têm energia elétrica, gás ou água corrente e sofrem cortes com frequência.
"Queridos irmãos e irmãs, muitas vezes vocês foram alvo de preconceitos e julgamentos implacáveis, de estereótipos discriminatórios, de palavras e gestos difamatórios", lamentou o papa argentino.
Ele recomendou a esta comunidade marginalizada que tome "decisões corajosas" para favorecer o futuro de seus filhos e principalmente sua educação, "para que cresçam bem enraizados em suas origens e, ao mesmo tempo, para que não sejam privados de qualquer outra possibilidade".
Também os encorajou a "ir além dos medos" por meio do "trabalho honesto, na dignidade de ganhar o pão de cada dia".
"Nos fez sentir que somos iguais aos outros povos do mundo", disse à AFP Igor Sivak, de 32 anos, sobre a visita do pontífice. "Sua presença certamente mudará algumas coisas", assegurou, esperançoso, este morador do bairro.
Emil Balogh, um desempregado de 51 anos, ouviu o papa "com admiração".
"O papa Francisco entende que sofremos discriminações e que os preconceitos contra os ciganos continuam presentes na sociedade", acrescentou.
Quase 20% dos ciganos da Eslováquia vivem na pobreza extrema em mais de 600 comunidades, especialmente no sul e no leste deste país da zona do euro com 5,4 milhões de habitantes.
O leste da Eslováquia é uma das regiões com menor PIB per capita da União Europeia.
- "Remar contra a maré" -
O sumo pontífice argentino iniciou sua jornada na cidade de Presov, a 40 quilômetros de Kosice, onde celebrou uma missa segundo o rito bizantino. Cerca de 30.000 fiéis participaram do evento, acenado para Francisco em sua passagem no papamóvel.
Esta é a primeira viagem ao exterior de Francisco, de 84 anos, desde sua cirurgia de cólon no início de julho. Até agora, segue com boa saúde.
"É formidável que o Santo Padre venha a um lugar onde ninguém quer ir", declarou Peter Besenyei, líder da comunidade salesiana local e responsável pastoral dos ciganos na arquidiocese de Kosice.
"É difícil encontrar professores em Lunik IX, padres que estejam dispostos a trabalhar e o papa vem até este ambiente difícil", disse à AFP.
Nikola e Rene Harakaly, de 28 e 29 anos, um casal com dois filhos morador deste bairro, conseguiram estudar graças a uma ajuda de uma irmandade de salesianos. Agora, os dois têm um emprego.
"Nossos pais nos ensinaram a remar contra a maré", explicaram ao papa.
Francisco se reunirá com os jovens em um estádio de Kosice no final do dia.
- Discriminação "amplamente tolerada" -
Os ciganos são considerados a minoria étnica mais populosa do continente, com grandes comunidades que vivem na Europa central do do leste.
Segundo os historiadores, meio milhão de ciganos morreram nas mãos dos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial, o que equivale a um quarto da população.
De acordo com Iveta Duchonova, encarregada do escritório do delegado governamental para esta comunidade, "em 2016, um relatório da UE sobre minorias e discriminação revelou que 54% dos ciganos na Eslováquia tinham sido vítimas de discriminação por pertencerem a seu grupo étnico".
Esta discriminação "persiste" e "é amplamente tolerada", declarou à AFP.
* AFP