Os militares que recentemente assumiram o poder na Guiné iniciaram nesta terça-feira (14) quatro dias de consultas para definir o conteúdo de uma transição que deve devolver um governo civil ao país africano.
Os autores do golpe se reunirão até sexta-feira com dirigentes de partidos políticos, de diversas confissões religiosas, representantes da sociedade civil, diplomatas estrangeiros, dirigentes de mineradoras e sindicatos.
O tenente-coronel Mamady Dumbuya, líder dos sublevados, garantiu na noite desta terça que "o único calendário válido é o do povo da Guiné, que tanto sofreu", em declarações a uma emissora de televisão pública, a única autorizada a cobrir as consultas.
Além disso, Dumbuya defendeu sua vontade de realizar um processo "inclusivo", mas criticou a classe política por "seus erros no passado".
Pela manhã, dezenas de representantes políticos se empurraram uns aos outros para tentar entrar no Palácio do Povo - o edifício do Parlamento - por uma porta estreita guardada por soldados, em uma tentativa de ter acesso às reuniões, nas quais todos os partidos se dispuseram a participar.
As discussões começaram por volta do meio-dia no Parlamento e ocorreram a portas fechadas, sem acesso da mídia internacional. Mais tarde, porém, vários participantes apontaram que Dumbuya havia se mostrado "unificador" e atento neste primeiro encontro.
Ele lembrou as motivações que levaram ao golpe de 5 de setembro contra o presidente deposto, Alpha Condé, preso desde então, mas não deu mais detalhes sobre a próxima transição, que será confiada a um futuro "governo de unidade nacional", segundo os presentes.
O golpe, segundo Dumbuya, foi o resultado "do fracasso de toda a classe política, dos militares e de outros deste país, que traíram os valores da independência", citado pelo ex-primeiro-ministro Sidya Touré, um dos líderes da oposição a Condé.
A operação ocorreu em poucas horas, com um balanço de 10 a 20 mortos, e provocou júbilo entre os cidadãos de Guiné, desesperados por conta da pobreza, do clientelismo, da repressão das liberdades e da apropriação dos lucros gerados pela exploração dos recursos minerais.
Condé foi reeleito para um terceiro mandato em outubro de 2020, após meses de protestos contra o seu governo, que foram duramente reprimidos.
A junta dissolveu o governo, as instituições e aboliu a Constituição. Para tentar mostrar suas boas intenções, rapidamente libertou dezenas de prisioneiros de opinião e prometeu uma transição política para formar um governo.
O tenente-coronel Dumbuya também não definiu a duração e o papel que os militares desempenharão na transição.
- "Inclusão" -
Apenas uma pessoa por partido foi convidada para o encontro desta terça-feira, embora muitas pessoas tenham se aglomerado diante do temor de serem rejeitadas, incluindo representantes de grupos que, até agora, eram completamente desconhecidos.
"Não sabemos o que vai acontecer lá. Não há nem mesmo um roteiro", disse Albert Keita, secretário-geral de um partido que se opõe a Condé.
"'Inclusão', ele insistiu muito nesta palavra", disse Sydia Touré, que também considerou a reunião "muito unificadora".
"Acho que entendi que (Dumbuya) quer integrar o maior número possível de guineenses neste processo", acrescentou, ao classificar o encontro de "um começo bastante aceitável".
Um ex-ministro de Condé, Papa Koly Kuruma, também afirmou que os líderes do golpe consideraram "as elites políticas e militares responsáveis por tudo (de ruim) que aconteceu na Guiné desde a sua independência".
"Foi um primeiro contato e deve ser tomado como tal", acrescentou Kuruma, que acredita que serão necessárias mais reuniões para se chegar a "propostas mais consistentes".
Preocupada com a estabilidade da Guiné, a comunidade internacional acompanha de perto as conversas no país, onde golpes militares anteriores, em 1984 e 2008, terminaram em regimes repressivos.
* AFP