Marrocos saboreava nesta sexta-feira (11) seu sucesso diplomático no Saara Ocidental, depois que Donald Trump decidiu reconhecer a "soberania" marroquina na ex-colônia espanhola em troca de que Rabat normalize suas relações com Israel.
Mas a decisão do presidente americano provocou reações negativas no plano diplomático, como com a Rússia.
"O que os americanos fizeram é uma decisão unilateral que ultrapassa completamente o limite do direito internacional", declarou o vice-ministro russo das Relações Exteriores, Mikhail Bogdanov.
A ONU já afirmou que sua posição "não mudou" no que diz respeito ao Saara Ocidental, garantindo que "sempre é possível encontrar [uma solução] fundada nas resoluções do Conselho de Segurança".
No entanto, o anúncio celebrado em Israel como um "acordo histórico" provocou reações divergentes.
A Argélia ainda não reagiu oficialmente, mas a Frente Polisário condenou com veemência "o fato de o presidente americano Donald Trump atribuir ao Marrocos algo que não lhe pertence".
Nesta sexta-feira, o movimento alertou que "os combates continuarão até a retirada total das tropas marroquinas de ocupação", segundo Mohamed Salem Uld Salek, ministro das Relações Exteriores da República Árabe Saharaui Democrática (RASD), proclamada em 1976 pela Frente Polisário.
A decisão americana é "inválida e sem efeito", reiterou Uld Salek, destacando que a comunidade internacional "não reconhece e não reconhecerá nenhuma soberania marroquina no Saara Ocidental".
- Aposta no diálogo -
O chefe da diplomacia americana, Mike Pompeo, afirmou que, apesar do anúncio de Trump, Washington advoga pelo diálogo.
"Os Estados Unidos seguem pensando que somente as negociações políticas podem resolver as desavenças entre Marrocos e o Polisário", declarou em comunicado, no qual defende o plano de autonomia marroquina como base das negociações.
O reconhecimento da "marroquinidade do Saara" é um "avanço diplomático histórico", enquanto a normalização das relações com Israel "se enquadra em uma continuidade" relacionada à "especificidade do Marrocos, pelos vínculos entre o rei e a comunidade judaica", destacou na quinta-feira o ministro marroquino das Relações Exteriores, Naser Burita, em uma entrevista à AFP.
O Saara Ocidental é uma ex-colônia espanhola reivindicada tanto pelos marroquinos como pelos independentistas da Frente Polisário, apoiados pela Argélia, país vizinho e grande rival regional de Rabat. As negociações lideradas pela ONU estão paralisadas desde a primavera de 2019.
Em meados de novembro, Marrocos, que controla dois terços do território, sua fronteira marítima -rica em pescado- e suas jazidas de fosfato, fortaleceu suas posições na região enviando tropas a uma zona-tampão anteriormente controlada pela ONU para "garantir a segurança" da única rodovia que faz a ligação com a África Ocidental, no extremo sul.
- Situação tensa -
Desde então, a tensão na região cresceu em tensão e o Polisário quebrou o cessar-fogo assinado em 1991 sob a chancela da ONU.
De acordo com o chefe da diplomacia marroquina, após "vários anos de trabalho e de comunicação ativa", os esforços diplomáticos do Marrocos no Saara foram "coroados com o reconhecimento dos Estados Unidos, a grande potência do Conselho de Segurança, um ator influente no cenário internacional".
Assim, o governo dos Estados Unidos abrirá um consulado em Dakhla, grande porto do Saara Ocidental, e Marrocos "reabrirá" um "escritório diplomático" que funcionou de 1994 a 2002, período em que o então rei Hasan II apoiava o processo de paz incentivado pelos acordos israelense-palestinos de Oslo de 1993, explicou um responsável diplomático marroquino.
A imprensa israelense informa há meses sobre o acordo que estava sendo desenvolvido, mas em Marrocos não houve nenhuma reação oficial, com exceção do primeiro-ministro Saad-Eddin El Othmani que em agosto condenou "qualquer normalização com a entidade sionista".
Na quinta-feira, no entanto, o chefe do Governo marroquino se recusou a fazer qualquer comentário.
Uma das poucas vozes divergentes com o acordo, seu conselheiro Nizar Khairun destacou no Twitter que "o Saara é marroquino e Israel, uma entidade ocupante que usurpa os direitos dos palestinos". Ainda assim, ele não fez nenhuma crítica direta ao anúncio do rei, em cumprimento à obrigação de todos os marroquinos de respeitar plenamente o monarca.
E nas redes sociais marroquinas, embora o termo "normalização é uma traição" tenha sido um dos mais populares nesta sexta-feira, não foi tão usado como o termo "Saara".
Ainda assim, o rei Mohammed VI assegurou ao presidente palestino Mahmoud Abas na noite de quinta-feira do "compromisso permanente e constante do Marrocos com a justa causa palestina".
* AFP