As suspeitas de que o Facebook teria influenciado a disputa presidencial americana, contribuindo para eleição de Donald Trump, ganharam corpo nos últimos dias, depois que especialistas questionaram o excesso de informações falsas que circularam na rede social, muitas delas insufladas pela campanha republicana contra a candidata democrata, Hillary Clinton.
Em resposta às críticas de que sua empresa não teria filtrado informações reais de boatos e mentiras, o criador e presidente do Facebook, Mark Zuckerberg, postou em sua página no domingo uma mensagem na qual rechaça as acusações. "De todo o conteúdo do Facebook, mais de 99% do que as pessoas veem é autêntico. Apenas uma quantidade pequena é falsa ou hoaxes (boatos). As notícias falsas que existem não são limitadas a uma única visão partidária, nem sequer à política, sendo extremamente improvável que as notícias falsas tenham mudado o resultado da eleição em uma ou outra direção", escreveu Zuckerberg.
Além das mentiras criadas por sites ou usuários, que o Facebook turbinou o alcance, o chamado efeito bolha pode ter contribuído para eleger Trump. Grande parte do conteúdo do feed de notícias que aparece em nossas timelines é calculado por um algoritmo, que prioriza interesses de cada usuário, opiniões de seus amigos e o que compartilham. Ou seja, acabamos vendo mais posts com ideias com as quais concordamos ou de pessoas com as quais temos afinidades. Assim, o algoritmo deixaria de fora opiniões diferentes ou divergentes das nossas. No contexto da eleição americana, poderia-se presumir que, pessoas que estavam inclinadas a votar em Trump, viram histórias que refletiam sua visão ideológica do mundo.
– O Facebook vai influenciar qualquer eleição, não apenas a americana. Ele tem uma estrutura que dá relevância àquilo que tem alto grau de engajamento e compartilhamento do usuário. Em política, quando se tem um ecossistema que enaltece determinados tipos de posturas pró e contra, essas páginas vão crescer mais do que sites ponderados, de jornais, por exemplo. A lógica do Facebook institui a ideia de que o que é mais engajado, vai ter mais alcance – explica Fabio Malini, professor de Cibercultura e Política da Universidade Federal do Espírito Santo.
A conivência do Facebook com a propagação de notícias falsas (sem checagem da imprensa) e o "efeito bolha" teriam sido decisivos para a eleição de Trump, na opinião do especialista. Mais: a empresa de Zuckerberg dispensou os "curadores" humanos dos trending topics. Agora são "curadores robôs" que separam "o joio do trigo". Isso levou a um aumento do número de histórias falsas entre as mais lidas. Para Malini, não é atribuição da rede social validar o fato. É algo que compete ao jornalismo. No entanto, como o algoritmo reduz o alcance de posts publicados pela mídia tradicional, acaba dando maior visibilidade a conteúdos publicados por sites criados para atacar outras posições ideológicas.
– Embora muitas vezes mentirosos, são esses conteúdos que ficam para leitor médio, que acessa internet. O que vejo de professor compartilhando conteúdo de eleição americana de fontes não confiáveis... É uma forma de validar sua posição política sobre determinado candidato – acrescenta.
A regra do algoritmo vale para Trump, mas também para a Hillary, pode-se dizer. A questão é que, como Trump considerava a mídia tradicional inimiga – já que boa parte dos jornais americanos abriu, em editorial, seu apoio à candidata democrata –, os republicanos acabaram usando o Facebook como veículo fundamental para atacar a rival. Circularam em perfis de simpatizantes de Trump informações segundo as quais Hillary teria cometido um assassinato ou que o presidente Barack Obama seria muçulmano. Não há acusações formais de assassinato contra a democrata, e Obama é cristão.
Um site de notícias falsas, mas com nome semelhante a um veículo independente, o Denver Guardian, publicou várias informações falsas sobre Hillary e denunciou supostos problemas em cédulas eleitorais, que davam margem a boatos sobre fraude. Até um grupo de pessoas recebeu dinheiro na Macedônia para produzir e publicar no Facebook notícias falsas que beneficiavam Trump.
Antes de usar sua página para se defender, Zuckerberg comentou o assunto durante palestra na Techonomy, na Califórnia.
– A ideia de que notícias falsas no Facebook influenciaram a eleição é maluca – afirmou.
Perguntado sobre como a empresa trabalha com checagem de fatos e equilíbrio de opinião, ele declarou que a política da empresa era "ouvir o que as pessoas querem" e prometeu: "Vamos continuar melhorando".No início do ano, o Facebook foi acusado de ser anti-Trump e de usar moderadores para favorecer conteúdos simpáticos aos democratas nos trending topics. Um dos colegas de quarto de Zuckerberg em Harvard e cofundador da rede, Dustin Moskovitz, doou US$ 20 milhões à campanha de Hillary. Mas próprio Zuckerberg se manteve neutro. Na noite da eleição, ele publicou uma foto em sua timeline com a filha, Max, de 11 anos, assistindo à apuração pela TV: "Abraçando Max, pensei sobre todo o trabalho que temos à frente para criar o mundo que queremos para nossas crianças. Esse trabalho é maior do que qualquer presidência", escreveu.