Existem somente quatro balas no rifle que Liep Wiyual pretende usar contra as tropas do governo nas linhas de frente no Sudão do Sul.
- Quando for lutar, receberei mais balas, ele disse. Para rebeldes como Wiyual, correr nos campos de batalha para tomar armas e munição do inimigo é uma prática comum.
Wiyual, 22 anos, é ex-recepcionista de hotel de Malakal, Estado do Alto Nilo. Dois de seus irmãos foram mortos depois que os conflitos irromperam em meados de janeiro. Ao seu redor, militantes civis da força rebelde conhecida como Exército Branco se preparam para uma nova ofensiva para conquistar os campos petrolíferos de Paloch, no Alto Nilo, estado ao norte.
Porém, os motivos para Wiyual se juntar à batalha têm pouco a ver com o petróleo ou com a disputa política entre o ex-vice-presidente Riek Machar e o presidente, Salva Kiir, que explodiu em violência em 15 de dezembro e rapidamente mergulhou o jovem país numa guerra civil.
- Estamos combatendo o governo que mata pessoas. Não estamos lutando pelo Dr. Riek, disse Wiyual.
Machar planeja o ataque aos campos petrolíferos em seu esconderijo no Alto Nilo. É um posto avançado tranquilo, à exceção do gorjeio incessante dos pássaros. O ex-vice-presidente vive acompanhado de uma pequena equipe de guarda-costas. Ele tem um telefone via satélite e um tablet num estojo marrom surrado; nas horas de folga Machar lê um exemplar de Por Que as Nações Fracassam.
Segundo ele, o livro o inspira a refletir se está tomando as decisões corretas, embora considere Kiir responsável pelo conflito sangrento no Sudão do Sul.
- Acho que um governo que mata o próprio povo perdeu o crédito. A presença de forças leais a Salva Kiir em Paloch, para comprar mais armas e matar nosso povo, para trazer estrangeiros para interferir e matar nossa gente, não é aceitável para nós, ele disse.
O major-general Gathoth Gatkuoth, que comanda as tropas formais e civis para Machar no Estado do Alto Nilo, estimou que os combatentes civis no Exército Branco somavam de 60 mil a 80 mil no Estado, mais 20 mil soldados rebeldes que desertaram do governo.
Ele afirmou que a captura dos campos petrolíferos tiraria a receita do governo, devastando a capacidade militar governista no Alto Nilo.
O governo controla várias capitais de Estados, incluindo Bor e Bentiu. Porém, como o Alto Nilo contém os campos de petróleo ainda funcionando no país, sua capital, Malakal, é agora o foco principal dos rebeldes.
Os combatentes do Exército Branco raramente se encontram diretamente com Machar, cujo esconderijo é razoavelmente isolado. Em vez disso, os combatentes de Nasir se reportam ao comandante Hokdor Chuol Diet, homem taciturno vestido com uniforme de campanha e boina vermelha. O quartel-general fica perto do rio, numa estrutura de concreto em ruínas recoberta com grafites pretos.
Os rebeldes enfrentam forças governamentais dez vezes maiores. Por isso, dois fatores são fundamentais na incomum tática adotada: velocidade e proximidade. Grupos ágeis entram no campo de batalha, correm na direção do inimigo e o derrotam. Um comentarista sul sudanês comparou esse violento ataque a uma multidão de formigas famintas.
- Nosso líder é o Dr. Riek Machar. Se o líder não nos dá a ordem de parar, seguimos com os planos, mas se a liderança afirmar que existe paz e o outro lado respeitar, então paramos, disse Diet.
Ele hesitou repetidas vezes quando questionado se Machar chegou a ordenar ao Exército Branco o cumprimento do cessar-fogo assinado na capital etíope, Adis Abeba, em 23 de janeiro, que foi rapidamente ignorado.
Nhial Tuach Riek, comandante das tropas sentado à esquerda de Diet, ofereceu uma avaliação muito diferente.
- Não podemos esperar ordens de outra pessoa porque nós sabemos que o governo matou essa gente. O Dr. Riek não pode nos dar nenhuma ordem porque nós não estamos lutando por ele.
Diet e seus oficiais se sentaram à sombra de uma árvore, onde um grupo de combatentes esperava para resolver uma disputa. Dois homens afirmavam ter direito a um rifle que foi tirado de um soldado do governo morto, e os comandantes do Exército Branco ouviram atentamente enquanto os dois lados apresentavam sua versão.
Uma civil que buscava a orientação dos líderes da milícia estava sentada do lado de fora do quartel-general do Exército Branco. A mãe de cinco filhos queria resolver uma briga de casal. O marido queria ir para a linha de frente, mas ela dizia que precisava dele em casa para ajudar a alimentar a família.
Para os rebeldes, a participação civil é indispensável. Porém, para as comunidades dos combatentes, ela é complicada. A temporada de chuvas se aproxima e agora está na hora de plantar sementes para a futura colheita ou levar o gado para pastagens mais verdes. Os jovens deixam as mulheres e as crianças para trás para cuidar das propriedades rurais, e grupos humanitários temem que isso possa levar à fome em questão de meses.
- Estou com raiva porque não temos comida, disse a mulher, que se identificou como Nyadang.
Ela disse não se opor à guerra em si; o irmão dela foi morto em Juba, capital da nação, onde as tropas do governo estariam envolvidas na prisão e assassinatos de civis. - Seria melhor meu marido e eu irmos juntos. Estou pronta para lutar por causa do que aconteceu em Juba.
Pessoas como Nyadang são essenciais para o Exército Branco, indo ou não para frente de batalha. A força diz estar carente de recursos; alimentos e apoio vêm principalmente da população.
- Não temos nada. Não temos dinheiro. Dependemos exclusivamente dos recursos locais do nosso povo. É o povo quem está nos ajudando agora, disse Gatkuoth. Apesar das amplas negociações que aconteceram entre os dois lados, Machar afirma não ter muita esperança numa resolução pacífica que deixe Kiir no poder.
- Não sei que tipo de acordo pode ser fechado se ele permanecer no poder. Não vejo os ingredientes para tal acordo. O que estaria envolvido?
Conflito
Rebeldes planejam ataque a reservas de petróleo do Sudão do Sul
Capital Malakal é o foco principal dos rebeldes
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