Tóquio - Ayaka Okumura mal havia engravidado quando começou a se preocupar com como se manteria no emprego de gerência que estaria fora de cogitação apenas uma geração atrás, quando as mulheres japonesas frequentemente eram relegadas a empregos de "secretária", servindo chá e recebendo as visitas.
Desde o início, Okumura teve uma vantagem crucial. O governo japonês subsidia milhares de creches nacionalmente para famílias de todos os níveis de renda, e exige que os cuidadores passem por exames rigorosos sobre cuidados infantis que geralmente requerem dois anos de educação especial.
Mas a qualidade da rede pública de creches - e a crescente escassez de vagas conforme mais mulheres passam a trabalhar fora - criou seu próprio conjunto de problemas aparentemente insolúveis. Cada vez mais mulheres desesperadas são forçadas a participar de uma competição anual por creches que é esgotante o suficiente para merecer seu nome, "hokatsu" e, segundo algumas pessoas, ela ultrapassa a notória e estressante caça a empregos enfrentada pelos estudantes universitários japoneses.
Okumura agora é uma veterana cansada dessa campanha por creches.
Durante meses, conforme sua barriga ficava maior, a futura mãe, então com 30 anos, se arrastava de creche em creche - algumas públicas, outras privadas - no pouco tempo que conseguia passar fora do trabalho, colocando seu nome em listas de espera que, às vezes, tinham mais de 200 nomes.
Quando ela deu à luz sua filha Ayane, no final do ano passado, ela havia visitado 44 lugares em Tóquio - sua última visita foi marcada para a data em que deveria dar à luz, mas ela a cancelou quando começou a sentir contrações.
- Eu vou ficar louca - disse ela conforme saía de uma creche. - Por que achar uma creche tem que ser tão difícil?
Neste Japão que envelhece rapidamente, tal inquietação não está mais limitada aos pais. Algumas autoridades do governo começaram a rotular a falta de creches como uma crise que ameaça enfraquecer as tentativas de reenergizar a economia apática do Japão ao manter sua grande gama de mulheres jovens e muito bem educadas longe dos salários que poderiam ajudar no consumo doméstico.
Mais preocupante, segundo os especialistas, é que a falta de vagas - principalmente nos berçários mais acessíveis ao público - pode convencer mais mulheres de que elas deveriam abster-se de ter mais de um filho, ou levá-las a simplesmente não ter filhos, diminuindo uma taxa de natalidade que já está entre as menores do mundo.
Mas com a dívida pública mais de duas vezes maior que a economia, e uma concentração de gastos públicos no crescente número de japoneses idosos, é improvável que o problema seja resolvido em breve. Uma rápida sucessão de governantes nos últimos anos não ajudou; em apenas cinco anos, 13 ministros diferentes já foram responsáveis por lidar com a baixa taxa de natalidade.
A raiz do problema, dizem os defensores dos direitos da mulher, é que as mães trabalhadoras encaram dois problemas: uma tendência demográfica que vai contra elas, e a velha tradição de mães donas de casa. Como muitas mulheres entrevistadas para esta matéria, Okumura fez a maioria das visitas às creches sozinha, porque no Japão os pais geralmente consideram que achar uma creche é responsabilidade da mãe.
- Me perguntam: 'Seu trabalho é tão importante que você precisa colocar seu filho na creche? Por que você está sendo tão egoísta?' - disse Mariko Saito, que trabalha para uma companhia farmacêutica em Tóquio e faz campanhas por mais opções de creches. - Mas eu não trabalho para mim. Trabalho para sustentar a família, exatamente como meu marido.
Quando o Japão estabeleceu seu moderno sistema público de creches depois da Segunda Guerra Mundial, as autoridades esperavam que elas servissem às pessoas que não tinham outro recurso, como mães solteiras. Durante algum tempo, dizem os analistas, isso era o suficiente, especialmente já que os "assalariados" bem remunerados podiam sustentar suas famílias sozinhos.
Então, com a explosão da "bolha econômica" no início dos anos 90, os homens jovens passaram a ter mais dificuldade em garantir trabalhos estáveis e bem remunerados. As esposas aproveitaram a brecha para extrapolar os limites do trabalho, achando empregos que elas estariam menos dispostas a abandonar para ter um filho.
Mas as jovens mães japonesas tinham poucas opções, a menos que seus próprios pais pudessem ajudar. E com os grandes obstáculos à imigração, babás estrangeiras são uma raridade.
Em vez disso, elas recorreram às creches públicas, onde suas necessidades coletivas levaram a uma lista nacional de espera que atualmente tem mais de 25 mil nomes. O governo estima que as listas de espera para todos os tipos de creche teriam dezenas de milhares de nomes, mas muitas famílias desistiram.
Cada vez mais famílias procuram creches particulares, que podem custar duas vezes mais caro, apesar de, às vezes, oferecerem padrões mais baixos de cuidados. Mas nas cidades do Japão, mesmo as creches privadas estão lotadas. Algumas famílias ficam tão impacientes para conseguir uma vaga nas creches públicas que desestruturam suas vidas, mudando-se para bairros com as menores listas de espera.
Okumura se inscreveu primeiro em sua cidade, que, como muitas, usa um sistema de pontos para tentar garantir que todos tenham a mesma chance nas creches públicas. Ela e o marido, Masanori, receberam uma pontuação base de 40 pontos, já que ambos trabalham em período integral. Pais solteiros ganham pontos extras, assim como os que têm filhos com necessidades especiais, mas os Okumura, pelo menos, não perderam nenhum ponto. Ter avós por perto que poderiam cuidar de Ayane seria uma desvantagem.
Ainda assim, as autoridades em Shinagawa, bairro de Okumura na costa de Tóquio, lhes disseram que suas chances eram pequenas.
Assim começaram as visitas de Okumura às creches particulares da cidade. Se ela não conseguisse uma vaga nas creches públicas, seu plano era recorrer a esses berçários, juntando-se à corrida anual de mães ansiosas que procuram estabelecimentos particulares que devem abrir vagas assim que as sortudas ganhadoras das vagas públicas saírem da competição.
Devagar, ela começou a nutrir uma nova preocupação: as creches particulares começam p "ano letivo" em abril, coincidindo com os anúncios de admissões públicas. Ela enfrentou uma escolha difícil. Mesmo se sua família tivesse a sorte de ser aceita em um berçário, Okumura seria forçada a diminuir sua licença maternidade e deixar o emprego com 8 meses, e a deixar Ayane na creche quando ela tivesse apenas 4 meses. Okumura temia que, se ela prolongasse sua saída até o mês de abril seguinte, isso poderia comprometer seu emprego na firma de contabilidade.
Ela se repreendeu por não ter planejado sua gravidez para dar à luz logo depois de abril a fim de pegar um bom lugar nas listas de espera - uma estratégia recomendada em salas de bate-papo em sites repletos de postagens sérias com estratégias de como ser aceito nas creches.
Shinzo Abe, o primeiro-ministro recém-nomeado, prometeu criar novas creches, mas não ficou claro quanto ele pode fazer, dada a crescente população idosa politicamente ativa do Japão. Quase 70 por cento dos gastos sociais com a saúde do Japão são voltados para pessoas com 65 anos ou mais, enquanto menos de 4 por cento auxiliam crianças e famílias, de acordo com um grupo de pesquisas filiado ao governo.
- Tornou-se um ciclo vicioso - disse Hiroki Komazaki, fundador de vários berçários. - Nós não investimos nas gerações futuras, inevitavelmente criando uma sociedade envelhecida.
Essas prioridades ficaram evidentes em uma recente reunião da câmara municipal no bairro Setagaya, em Tóquio, que tem uma das mais longas listas de espera para creches do país. Somente depois de uma discussão reveladora sobre distribuição de fraldas geriátricas, a conversa se voltou para as creches. Nenhuma medida foi tomada, desapontando as mães na plateia.
No final, já exausta, Okumura recentemente teve a sorte de conseguir uma vaga numa creche pública cobiçada. Mas ela ainda não conseguiu se convencer a aceitá-la.
- Eu gostaria de poder ficar com a minha filha por mais tempo - disse ela. - Estou cheia de preocupações e completamente exausta.
The New York Times
Mães sofrem em busca de creches para os filhos no Japão
Aumento no número de mulheres trabalhando fora é um dos fatores que ajudaram a piorar o problema de falta de vagas em locais destinados a cuidar de crianças
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