Da Nang, Vietnã - No clima tropical do centro do Vietnã, ervas e arbustos parecem crescer em todos os lugares - menos aqui.
Quarenta anos depois que os Estados Unidos pararam de lançar herbicidas nas florestas do sudeste asiático com o objetivo de impedir que os combatentes vietcongues e as tropas do Vietnã do Norte encontrassem abrigo, a base aérea da cidade de Da Nang é uma das dezenas de antigas bases americanas que continuam poluídas com um tipo especialmente tóxico de dioxina, o contaminante químico presente no Agente Laranja e que está ligado ao surgimento de diversos tipos de câncer, defeitos congênitos e outras doenças.
Recentemente, depois de anos negando os pedidos de ajuda do governo vietnamita, o governo dos Estados Unidos deu início a sua primeira grande campanha de limpeza no país, visando diminuir os efeitos ambientais causados pela guerra.
"Nesta manhã, celebramos um marco em nosso relacionamento bilateral", afirmou David B. Shear, o embaixador americano no Vietnã, em uma cerimônia realizada em agosto e que contou com a participação de altos oficiais do exército vietnamita. "Vamos arrumar essa bagunça."
O programa, que irá custar 43 milhões de dólares e durar quatro anos, foi oficialmente recebido com sorrisos e apertos de mão durante a cerimônia. Mas o rancor ainda está presente. O Agente Laranja é frequentemente mencionado nos jornais e é relembrado todos os anos no dia 10 de agosto, o dia em que foi testado pela primeira vez no Vietnã, em 1961.
Este ano, o governo do país não aceitou o patrocínio olímpico oferecido pela Dow Chemical, uma das principais fabricantes do Agente Laranja durante a guerra. Muitas pessoas aqui não hesitam em dizer que o programa dos Estados Unidos é muito pequeno - uma vez que ele só ocorrerá em um local - e muito tardio.
"É um grande passo", afirmou Ngo Quang Xuan, ex-embaixador vietnamita na ONU. "Mas, para os que sofreram com as consequências, ainda não é o bastante."
Durante mais de uma década de guerra, os Estados Unidos borrifaram cerca de 76 milhões de litros de Agente Laranja e outros herbicidas no Vietnã, Camboja e Laos, parando apenas quando os cientistas contratados pelo Ministério da Agricultura publicaram um relatório em que expressavam preocupações, pois a dioxina mostrava "potencial significativo para aumentar a ocorrência de defeitos congênitos".
Quando o Agente Laranja e os outros herbicidas deixaram de ser lançados, eles já haviam destruído mais de 2 milhões de hectares de florestas e plantações, uma área quase do tamanho de Nova Jersey.
Nguyen Van Rinh, tenente-general aposentado e atual diretor da Associação Vietnamita de Vítimas do Agente Laranja, lembra-se claramente de escutar as aeronaves dos Estados Unidos passando sobre as florestas no sul do Vietnã, e de ver uma chuva de Agente Laranja cobrindo seus soldados.
Plantas e animais expostos ao desfolhante morriam após poucos dias. Mais tarde, muitos de seus homens tiveram doenças e ele acredita que elas possam estar ligadas à exposição constante ao Agente Laranja, usado em concentrações que eram de 20 a 55 vezes maiores do que a utilizada normalmente na agricultura.
"Eu gostaria de enviar uma mensagem ao povo americano", afirmou Rinh em seu escritório, onde um grande busto de Ho Chi Minh - ícone e líder vietnamita do período da guerra - olhava para baixo em uma prateleira atrás de sua mesa. "A luta das vítimas do Agente Laranja continua. Eu acredito que nosso relacionamento iria melhorar muito se o governo americano assumisse a responsabilidade, ajudasse suas vítimas e cuidasse das consequências."
Os que trabalharam com essa questão afirmam que o governo dos Estados Unidos demorou a agir, em parte por se preocupar com a responsabilidade. Demorou anos até que os soldados americanos que borrifaram os produtos químicos conseguissem obter acordos das empresas que os produziram.
O governo dos Estados Unidos, que também demorou a reconhecer o problema, gastou bilhões de dólares em pensões por invalidez e planos de saúde para os soldados que entraram em contato com o Agente Laranja.
Shear, o embaixador dos Estados Unidos, ignorou um repórter que, após a cerimônia, perguntou se o governo americano assumiria a responsabilidade pelos efeitos causados pelo Agente Laranja ao meio ambiente e à saúde.
"Existe uma grande diferença entre o que os Estados Unidos fizeram por seus soldados e o que eles fizeram pelo Vietnã", afirmou Charles Bailey, diretor do Programa do Agente Laranja no Vietnã, iniciativa da organização não governamental Aspen Institute, sediada em Washington, que tem o objetivo de chegar a um acordo entre Estados Unidos e Vietnã a respeito desse problema. "De vez em quando eu me sinto aliviado por não ser um diplomata americano tentando resolver esse pepino."
Uma ação coletiva que foi aberta contra as empresas químicas nos Estados Unidos em nome de milhões de vietnamitas foi rejeitada em 2005, sob o pretexto de que fornecer os desfolhantes não era considerado um crime de guerra e que os demandantes vietnamitas não haviam conseguido comprovar um efeito causal claro entre a exposição ao Agente Laranja e seus problemas de saúde.
O governo dos Estados Unidos colocou em ação um modesto projeto de 11,4 milhões de dólares para ajudar pessoas com problemas físicos no Vietnã, mas esse projeto não tem relação direta com o Agente Laranja. O lema frequentemente repetido pelo governo é o da "assistência independentemente da causa".
Quando fatores ambientais estão ligados às doenças, fica mais difícil comprovar uma ligação com o Agente Laranja. Estudos militares conduzidos pelos Estados Unidos destacaram relações entre o Agente Laranja e uma grande quantidade de doenças, ao passo que a Dow Chemical continua a afirmar que "um enorme conjunto de evidências humanas a respeito do Agente Laranja demonstra que as doenças dos veteranos não foram causadas pelo produto".
No Vietnã, há diversos casos de doenças cuja conexão com o Agente Laranja parece óbvia.
Nguyen Van Dung, de 42 anos, mudou-se para Da Nang em 1996 com a esposa e a filha recém-nascida. Ele trabalhou na antiga base dos Estados Unidos, caminhando por valas cobertas de lama até a altura dos joelhos e limpando-as com uma pá.
Durante os primeiros 10 anos, ele e os outros funcionários pescavam enguias e outros peixes em grandes poços e canais no terreno da base aérea, trazendo-os para casa quase diariamente. Mais tarde, estudos comprovaram a presença de grandes concentrações de dioxina no tecido adiposo e nos órgãos desses peixes.
A primeira filha do casal agora é a melhor aluna de sua sala, mas sua segunda filha nasceu em 2000 com uma rara doença sanguínea. Ela morreu aos sete anos de idade.
Seu filho Tu nasceu em 2008 e eles logo descobriram que ele tem a mesma doença no sangue. Com transfusões frequentes, o pequeno Tu contrariou as previsões do médico de que ele não passaria dos três anos de idade, mas o menino é praticamente cego, com olhos esbugalhados que se movem sem parar, e fala em um tom agudo que apenas seus pais são capazes de compreender. Sua caixa torácica é tão frágil que ele não consegue respirar se estiver de barriga pra baixo.
O que causou os defeitos congênitos e de quem é a culpa? Os pais de Tu não podem pagar por testes médicos detalhados, já que sua renda conjunta é de cerca de 350 dólares mensais, dos quais boa parte é gasta com cuidados médicos.
Mas Luu Thi Thu, a mãe do garoto, não tem dúvidas sobre quem é o culpado.
"Se a guerra não tivesse acontecido e os americanos não tivessem borrifado dioxina e outros produtos químicos nesta área, nós não estaríamos sofrendo essas consequências", afirmou.
"O que aconteceu com meu filho já está feito, e nada pode mudar isso", afirmou. "Os governos americano e vietnamita precisam limpar o aeroporto de Da Nang para que a próxima geração não seja afetada."
Le Ke Son, médico e o mais alto oficial vietnamita responsável pelos programas do governo ligados ao Agente Laranja e a outros produtos químicos utilizados durante a guerra, afirmou que os debates deveriam estar em segundo plano e que o mais importante é ajudar as vítimas. "Passamos muito tempo discutindo por que as pessoas foram afetadas", afirmou. "De uma forma ou de outra, elas são vítimas e sofreram com o legado da guerra. Deveríamos fazer alguma coisa por essas pessoas."
New York Times
Estados Unidos iniciam primeira limpeza de produtos químicos no Vietnã
Governo norte-americano deu início a uma grande campanha no país asiático, visando diminuir os efeitos ambientais causados pela guerra
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