
Prestes a completar um ano de idade, Matteo Lorenzo dos Santos ainda não pode contar a própria história. Mas quando puder falar, o menino que nasceu durante a maior enchente da história do Rio Grande do Sul certamente poderá contar sobre como seu nascimento mobilizou dezenas de pessoas, para que ele viesse ao mundo em segurança. Naquele momento, a única forma de sair de Roca Sales era sobre trilhos de trem.
Com 40 semanas de gravidez, Renata Aline dos Santos, 38 anos, começou a sentir as primeiras contrações no dia 2 de maio de 2024. Naquele momento, a cidade de Roca Sales, no Vale do Taquari, estava ilhada, e o único hospital do município, alagado. Para complicar a situação, a enfermeira que tentou fazer um atendimento em casa apontou que seria necessário realizar uma cesárea em ambiente hospitalar.
A partir daí, uma força-tarefa foi montada. Enquanto voluntários entravam pela janela do hospital para buscar suprimentos, outros montavam a rota de escape da cidade.
— Posso considerar que foram centenas de pessoas me ajudando de uma forma ou outra — diz Renata.
Na manhã seguinte, 12 pessoas se revezaram para carregar Renata em uma maca por 4,5 quilômetros. Depois, a gestante foi levada de ônibus até um ponto onde poderia passar de barco. Do outro lado do Rio Taquari, embarcou em uma ambulância para Encantado, onde Matteo nasceu.
— Eu sempre falava para os bombeiros, para os voluntários que estavam ali: "a prioridade é ele". E eles me diziam: "não tem 'prioridade é ele', aqui é de vocês dois". Vocês vão ir para um hospital, e a gente vai conseguir. Foi assim que consegui me manter as 27 horas que fiquei esperando ele vir — relembrou.

Apesar do sofrimento e dos percalços, Matteo nasceu com saúde em 3 de maio. Hoje, com quase um ano, Renata conta que o menino é esperto, risonho e já faz algumas "artes" pela casa.
— Vê-lo hoje, do jeito que ele está, saudável, risonho, brincalhão, é uma sensação única. E não tem como esquecer dos momentos que a gente passou, do sofrimento, não tem como não se emocionar com tudo isso — disse.
Atualmente, Renata trabalha em um mercado e está morando de aluguel em uma casa na área central de Roca Sales, enquanto aguarda por uma moradia definitiva.
— Eu espero que a gente consiga oferecer este futuro bom para as crianças, que elas tenham saúde, educação boa — completou.