A onda de protestos que ganhou as ruas do país em junho de 2013 começou mais ou menos como as manifestações registradas no Rio de Janeiro e em São Paulo nos últimos dias. E, dessa vez, a exemplo do que ocorreu há dois anos e meio, também não há consenso sobre o desfecho da mobilização.
Em 2013, as passeatas surgiram em reação ao reajuste das tarifas do transporte público em Porto Alegre. Depois disso, migraram para outras capitais. Foi em São Paulo que o fenômeno explodiu, tão inesperado quanto surpreendente. A pauta, até então restrita à luta pela redução das passagens, diluiu-se. Com faixas e cartazes em punho, a classe média insurgiu-se contra a corrupção, os gastos com a Copa, os partidos políticos e "tudo o que está aí".
Uma minoria mascarada cometeu atos de vandalismo. Houve confrontos com PMs. O país viveu um mês de efervescência, que, aos poucos, arrefeceu. Agora, a possibilidade de que o "gigante volte a acordar" preocupa as autoridades. A presidente Dilma Rousseff, segundo o jornal O Estado de S. Paulo, teria solicitado informações sobre os movimentos em curso, temendo o repeteco de 2013, turbinado pela crise econômica.
- É difícil prever o que pode acontecer. Se tem uma coisa que os atos de junho nos ensinaram foi a imprevisibilidade. Na época, ninguém esperava o que aconteceu. O mesmo vale para hoje - pondera Gustavo Grohmann, cientista político da UFRGS.
O fato é que, em 2013, Dilma ainda gozava de altos índices de popularidade. Em março daquele ano, 63% dos brasileiros consideravam a gestão boa ou ótima. Em dezembro de 2015, o percentual caiu para 9%. Além disso, a discussão sobre o processo de impeachment deverá ser retomada em fevereiro, conturbando ainda mais o país.
Para o cientista político Humberto Dantas, do Insper, todos esses ingredientes, aliados à insatisfação ainda maior em relação à classe política, têm potencial para levar milhões às ruas outra vez. Ou não.
- A probabilidade de uma nova onda de protestos existe, sim, porque os elementos estão postos. Mas a leitura da sociedade é cada vez mais complexa. É cedo para qualquer conclusão - conclui.
Como Porto Alegre se prepara para os protestos
O início de operação do novo sistema de transporte público em Porto Alegre, previsto para ocorrer entre o final de fevereiro e o início de março, deve aumentar o preço da tarifa, hoje de R$ 3,25. O valor do reajuste está indefinido, mas o acréscimo pode motivar novos protestos na Capital.
Como o peso no bolso da população ainda não foi divulgado, os movimentos sociais não sabem se haverá manifestações, mas querem fazer uma aula pública, prevista para fevereiro, para discutir o transporte municipal. Licitado no ano passado, o novo sistema estabelece algumas melhorias, entre elas que a quantidade máxima de passageiros por metro quadrado nos veículos passe de seis para quatro, o que motivará o aumento da frota, e que 25% dos ônibus circulem com ar condicionado.
- Vamos fiscalizar o cumprimento dos termos da licitação, que ainda não está muito clara para a população, por isso a aula pública - afirma Lucas Maróstica, representante da União Nacional dos Estudantes (UNE) no Conselho Estadual de Juventude.
Caso os protestos ocorram, os movimentos esperam que a atitude da polícia gaúcha seja diferente da paulista, criticada pela violência depois que cenas de manifestantes feridos se espalharam pelas redes sociais.
- Vejo esses fatos em São Paulo como fatos que desmobilizam as manifestações de forma geral, porque ninguém quer ir para as ruas esperando uma reação tão truculenta das polícias militares. É isso que está em discussão hoje no Brasil - completa Maróstica.
Se confirmados os protestos, os órgãos de segurança devem seguir as orientações de um protocolo assinado em 28 de dezembro. O documento, chamado de "Protocolo de Ações Integradas", prevê que a negociação com manifestantes ocorrerá nos casos de bloqueios de vias e será feita com as lideranças, "visando minimizar os transtornos à coletividade". Segundo José Henrique Botelho, tenente-coronel da BM, o protocolo normatizou as ações que já vinham sendo tomadas.
- Todo protesto que for comunicado vai receber contingente de apoio para garantir direito de manifestação e segurança das pessoas: das que estão participando e das que não estão - afirma.