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Fazia tempo que o rio era doce só no nome. Completamente morto pela enxurrada de lama e rejeitos de mineração que pintaram seu leito de tons terrosos desde o início do mês, o Rio Doce tinha a saúde debilitada pela poluição vinda do lançamento de esgoto doméstico e detritos industriais. Uma sina que acompanhava todo seu curso, até o Espírito Santo, e fazia de sua bacia a mais degradada de Minas Gerais e uma das mais contaminadas do Brasil.
O tom esverdeado das águas, que aparece citado, como referência ou cenário, em obras do capixaba Rubem Braga e do mineiro Carlos Drummond de Andrade, encobria a degradação. Mas análises laboratoriais apontavam nível de poluição muito acima do limite estabelecido pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama).
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A bacia hidrográfica do Rio Doce é extensa. Com 853 quilômetros de comprimento em 83,4 mil quilômetros quadrados de área, tem aproximadamente o tamanho de Portugal. Em todo seu curso, atende cerca de 3,2 milhões de pessoas, espalhadas em 222 municípios _ 85% deles com população inferior a 20 mil habitantes. Pelo menos 15 cidades devem ser atingidas diretamente pela enchente de lama, prejudicando principalmente o abastecimento de água dos moradores.
Séculos depois da colonização, o leito do rio já não fornece mais o cobiçado ouro, mas ainda é crucial para o desenvolvimento da região, principalmente o leste mineiro e o noroeste capixaba.
Além de contar com a presença de algumas das maiores mineradoras do mundo, a brasileira Vale e a anglo-australiana BHP, a região atraiu também grandes companhias siderúrgicas e empresas exportadoras de café, em Minas Gerais, e polpa de frutas, no Espírito Santo, gerando cerca de 15% do PIB mineiro, por exemplo.
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A grande atividade industrial ao longo da bacia, que movimentava a economia, era um dos motivos para tamanha poluição. Outro era o processo erosivo no solo, que levava pesticidas e herbicidas, presentes em grande quantidade nas propriedades rurais do vale, diretamente para as águas do rio.
A falta de tratamento do esgoto, jogado em vários trechos do leito, também prejudicava a qualidade das águas. Um indicativo de que a recuperação do Rio Doce pode levar bem mais do que os 10 anos projetados pelo Ministério do Meio Ambiente.
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