Uma estrela, duas borboletas e três anjos ajudam a contar a história de Wilton Telles de Araújo. Na tarde de quarta-feira, ele se encontrou com dois dos "anjos" que salvaram seu "anjinho", o filho Arthur Telles de Oliveira, que com um ano e nove meses é sobrevivente da maior tragédia rodoviária de Santa Catarina. No acidente com o ônibus na Serra Dona Francisca, o menino perdeu a mãe e a avó. Enquanto acompanhava o filho, que está na UTI do Hospital Dr. Jeser Amarante Faria, em Joinville, Wilton recebeu a visita de Valdemiro e João Batista, que resgataram o menino da mata.
Em uma sala do segundo andar do hospital, eles sentaram lado a lado. Primeiro, veio o abraço. Depois, a curiosidade:
- Contem como vocês salvaram o meu anjinho - pediu Wilton Telles de Abreu
O motorista Valdemiro e o ajudante de lavação João Batista começaram a saga na descida da serra, voltando de uma entrega de roupas limpas, serviço que prestam a uma lavanderia joinvilense. Viram carros estacionados e resolveram parar. Entraram na mata fechada e desceram para o encontro com a surpresa de um ônibus tombado, encravado no barro. Motor ligado, gritos de socorro e o pedido de "salvem as crianças" compõem as cenas que parecem de filme.
Wilton esteve no local do acidente duas vezes. A segunda foi pouco antes de encontrar os rapazes que deram a ele motivo para que se mantivesse, como ele mesmo diz, "de pé". Um primo o acompanhou na tarefa de recolher pertences do filho, da mãe do menino, Lariana Vieira, e da avó materna, Sônia Vieira.
- A gente achou um bico que não sei se era dele - cogitou Valdemiro, que não tinha mais certeza se era de Arthur a chupeta, que também poderia pertencer a outro menino salvo, Brayan Lohan de Almeida.
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Duas borboletas
Depois de vasculhar o emaranhado de objetos, Wilton subiu no barranco e convidou o primo para rezar. Eles se envolviam de fé, no momento em que viram duas borboletas. Azuis. As "mais bonitas" que Wilton já tinha visto. Ele virou-se para o primo e perguntou:
- Sabe quem são, né? - disse, referindo-se a Lariana e Sônia.
Mensagens pelo WhatsApp não paravam de apitar no celular de Wilton falando de um acidente com ônibus. Ele não "deu bola". Foi tomar banho. Mas a campainha interrompeu o cotidiano de paz. Era o primo para dizer que Arthur estava envolvido no acidente. Na viagem a Joinville, ele refez o caminho do ônibus e parou no local do acidente. Saiu com a esperança abalada pela notícia de que nenhuma criança havia se salvado.
- Desci o resto (da estrada para Joinville) que faltava de coração partido - lembrou.
Primeiro, ele foi ao IML. Insistiu para deixarem ver o filho, loirinho e de olhos claros. Funcionários mostraram as fotos. Sônia e Lariana ele logo reconheceu, mesmo que parte dele tentasse negar que as duas se tornaram um retrato póstumo. Wilton perdeu dez minutos olhando para uma outra foto que o deixou confuso entre reconhecer e não enxergar o próprio filho. Foi quando ele soube que era a imagem de uma menina. Logo em seguida, avisaram que algumas crianças estavam no Hospital Infantil.
- Foi Deus e ela que protegeram ele - diz Wilton, convicto de que Lariana se deitou sobre Arthur para proteger o menino.
Tendo nas mãos a chupeta encontrada por Valdemiro e João, Wilton sonha com o dia em que contará para o filho o que significa aquele objeto. Quer os dois ali na porta do hospital quando Arthur sair caminhando de volta para casa. Assim como quando fez o caminho de volta para casa, para a última despedida de Lariana e de Sônia, olhou para a noite caída no alto do para-brisas do carro e imaginou a mãe de Arthur:
- No céu tinha uma estrela muito brilhante. Tenho certeza de que é você essa estrela.
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