
— O futebol é um fenômeno global capaz de envolver um grande número de pessoas, suscitando emoções e sentimentos coletivos — disse o papa Francisco, em 2018.
Morto nesta segunda-feira (21), aos 88 anos, Jorge Mario Bergoglio teve seu mandato à frente da Igreja Católica aliado à sua paixão pelo futebol. Torcedor do San Lorenzo, nunca deixou de lado sua relação com o futebol. Ele foi o primeiro papa nascido na América do Sul na história da Igreja Católica.
Sete dígitos especiais
Na cidade de Buenos Aires, sete dígitos são especiais para o San Lorenzo e seus torcedores: 88235N-0, número de associado de Bergoglio, quando ainda nem sonhava em ser papa.
Nascido e criado no bairro de Flores, onde se encontra a sede do San Lorenzo atualmente, Francisco tem seu rosto pintado ao redor dos muros que cercam o estádio.

Camisa do clube
Em 2013, quando foi eleito pelo Vaticano para ser o novo líder da Igreja Católica, após Bento XVI renunciar ao cargo, Francisco foi cumprimentado pelo clube — que lembrou da história de amor entre o então padre Bergoglio e a instituição. Nos primeiros dias no Vaticano, recebeu uma camisa do clube e relembrou do período em que ainda era, apenas, um torcedor "figurão" do San Lorenzo.
— Tem vindo à minha memória belas recordações, começando desde a minha infância. Acompanhei, aos dez anos, a gloriosa campanha de 1946 —escreveu, em 2013, sobre a conquista do título argentino do clube na década de 1940.
À época, Francisco tinha apenas 10 anos, mas não perdeu uma partida sequer da campanha vitoriosa da equipe.
San Lorenzo era família
Filho de imigrantes italianos, cresceu com o San Lorenzo como um "parente" em sua família.
— Para mim o San Lorenzo é o time da minha família. Meu pai jogou na equipe de basquete. E, quando éramos pequenos, íamos com a minha mãe ao estádio — afirmou, em 2014, ano em que o San Lorenzo se tornou, de fato, o time do papa.
Campeão da América
Até aquele ano, o clube era o único, dentre os grandes da Argentina, a não ter se sagrado campeão da Libertadores. Desde a década de 1940, quando o San Lorenzo entrou em sua vida, Bergoglio acompanhou diversos momentos de crise — chegando a ser expulso do vestiário da equipe, em 1998, quando invadiu, com suas vestes de padre, para reclamar da equipe. Tudo mudou em 2014.
Sob o comando de Edgardo Bauza, o San Lorenzo eliminou Grêmio, Cruzeiro, Bolívar e Nacional, do Paraguai, para conquistar seu primeiro título continental da história.

Explosão de sócios
A conquista veio acompanhada por uma explosão de sócios e de visibilidade do clube, que também disputou, pela primeira vez, o Mundial de Clubes. A comitiva do clube argentino, inclusive, viajou à Europa para mostrar a taça da Libertadores ao pontífice.

Antes da Libertadores, o clube argentino também viveu um período de jejum — seis anos sem um título nacional. Tudo mudou após a chegada de Bergoglio ao Vaticano.
— Assisti com alegria, mas não é um milagre — brincou Francisco, sobre o título do San Lorenzo.
Argentina na final da Copa de 2014
Milagre que também levou a Argentina à decisão da Copa do Mundo em 2014, na competição disputada no Brasil — vice-campeã, após decisão com a Alemanha.
Mas Francisco ainda "veria", em sua vida, o fim do jejum da seleção, com o bicampeonato da Copa América (2021 e 2024) e a Copa do Mundo de 2022.

Veria, entre aspas, porque o papa, de fato, não assistiu às conquistas da seleção, nem do San Lorenzo, nos últimos anos. Na década de 1990, fez uma promessa — nunca revelada pelo pontífice o motivo — que o fez deixar de assistir à televisão.
Ele apenas soube, por relatos, do título de Messi e da seleção no Catar, diante da França, após empate por 3 a 3 na decisão e vitória nos pênaltis. O mesmo vale para as conquistas do San Lorenzo — do qual se tornou sócio honorário após seus anos no Vaticano.
Delegações
Essa impossibilidade de ver as partidas não impede que Francisco receba delegações, dos mais variados times, e atletas ao longo dos anos. Em seu reinado, já recebeu seleção croata, vice-campeã em 2018, a própria seleção argentina, italiana, além das visitas de Messi, Ronaldinho Gaúcho, entre tantos outros.
Messi ou Maradona?
Quando questionado sobre quem foi maior para o futebol, entre Messi e Maradona, o papa argentino foi por um terceiro caminho: Pelé.
— São os três que eu segui. Maradona, como jogador foi um grande, um grande. Mas, como homem, falhou —disse, à Rai, em 2023. — Messi é corretíssimo. É corretíssimo. Mas, para mim, desses três, o grande senhor é Pelé.
Francisco recebeu, em 2014, uma camisa assinada por Pelé, das mãos da então presidente Dilma Roussef.
— Eu falei com Pelé uma vez, o encontrei em um voo, quando ia a Buenos Aires, conversamos. É um homem de uma humanidade muito grande — afirmou Francisco.