Alex Bourgeois é a cabeça do Figueirense empresa. Matemático nascido na França e criado entre Paris e Rio, estudou na Suíça e em Harvard. Por duas décadas, atuou no mercado financeiro no Exterior, morando em seis países e 16 cidades diferentes. Em 2010, entrou no futebol. Primeiro, no grupo Teisa, que atuou no Santos. Depois, como CEO do São Paulo, foi ceifado por brigas políticas. Por telefone, ele conversou com ZH.
No que o senhor acredita que seu projeto no Figueirense impactará no futebol brasileiro?
Acho que ficarão todos de olho. Os demais clubes vão observar como evolui. Em alguns meses, os clubes vão perceber a diferença da gestão, tanto na questão de como o Figueirense atuará na parte de marketing quanto nas metodologias e nos processos do futebol e da gestão administrativa, na parte de transparência, de governança. Essas serão as diferenças que vão acabar impactando e trazendo o resultado para o campo.
O senhor é matemático e desenvolveu um algoritmo que aponta índices para maior sucesso nas contratações. Isso será aplicado no Figueirense?
Essa é uma das coisas que pretendemos implementar em algum momento. É obvio que não pode implementar no momento zero. Até estar mais ou menos numa rotina, implementaremos procedimento tecnológico. Trata-se de ferramenta que nos ajudará a tomar decisões, para poder montar o melhor time ao menor custo possível. É o famoso montar um time encaixado, que dá liga.
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Isso significa que o Figueirense será guiado pelas estatísticas, pelos números?
O que acontece no Brasil é que a contratação, muitas vezes, é baseada em paixão. Ou seja, por pressão da torcida. Ou porque o dirigente é torcedor. Nosso plano é instaurar processos e metodologias em tudo, saber por que e como é feito. Não será só porque há um pedido aleatório. Haverá planejamento estratégico, tático, técnico. Uma cultura de clube será desenhada, o que se chama em gestão de blanding. Vamos definir qual o blanding do futebol do Figueirense, vamos definir estilo de jogo, jogador, salário, treinamento e metas. Em função de tudo isso, cria-se uma metodologia. Cria-se um time que, independentemente de ter mudança de jogador ou comissão técnica, terá o mesmo padrão. O torcedor verá sempre o time jogando da mesma forma, da base ao profissional.
Há outros clubes-empresa no Brasil, mas sem tradição e torcida. O Figueirense se torna pioneiro pelo apelo popular?
Estamos há muito tempo procurando esse clube que faça a diferença. Não adianta pegar um clube-empresa que não tem torcida. Também não adianta um clube que tem torcida e não tem gestão, aí cai na agremiação politica, que é o que os clubes brasileiros se tornaram. Não conseguem ter trabalho com sequência e planejamento por causa de suas disputas internas. Encontramos um lugar em que podemos tocar um clube-empresa com torcida. Havia três candidatos, o Figueirense era o que mais desejávamos.
Que clubes seriam esses?
Um é do Norte e outro do Sudeste. O Figueirense sempre foi o que desejávamos por vários motivos, não só pelo clube, bem estruturado, mas porque tem torcida, pela cidade de Florianópolis e pelo Estado de Santa Catarina, que são pujantes.
Como o senhor vai tornar nacional um clube que tem base potencial de 650 mil torcedores, basicamente a região metropolitana de Florianópolis?
Ele tem hoje uma torcida pequena, mas vou corrigir você. O potencial dele é muito maior do que isso. Primeiro é fazer o Figueirense crescer no âmbito estadual. Uma vez atingido isso, vai crescer no âmbito regional. Cumprida essa etapa, vai para o âmbito nacional. Só depois é que se passará a pensar em âmbito internacional. É um processo dentro de um prazo de 20 anos. Quero deixar isso claro, nossa cabeça é de projeto de 20 anos, não é de seis meses. A caminhada é longa.
O clube já tinha uma SPE. Vocês administrarão a partir dela?
É a Figueirense Ltda., onde hoje os jogadores são registrados. Vamos transformar essa Ltda. em S.A.. Transferiremos todos os ativos de futebol, assim como o passivo, para essa S.A.. Assumiremos tudo e ficaremos com 95%, A associação (o clube) continuará, terá direito a 5%. Eles têm duas cadeiras no Conselho de Administração, que é quem aprova o plano estratégico.
Como será o Conselho de Administração? Quem o integrará?
Serão nove membros: o Claudio Vernalha, advogado aqui de Florianópolis, eu, haverá dois membros escolhidos pelo clube e mais cinco membros nossos: o Luiz Paulo Rosemberg, ex-diretor de marketing do Corinthians, o Luiz Eduardo Baptista, o Bap, ex-vice-presidente do Flamengo e presidente da Sky, César Grafietti, superintendente de crédito do Itaú BBA, e Luiz Lara, publicitário, fundador da agência Lew Lara. Estamos tentando trazer um técnico de futebol. Conversamos com o Muricy Ramalho. A princípio, esses conselheiros teriam remuneração, o jeton, comum nos conselhos das grandes empresas.
Em quem o senhor se inspirou para criar o Figueirense S.A.?
No Manchester United, do ponto de vista de gestão. Estive lá, estudei, analisei. Estudei muito não só o Manchester, mas também Arsenal, Borussia Dortmund, a Juventus, o Barcelona, o Real Madrid. O clube mais louco de se ver em termos de profissionalização é o Real Madrid. É incrível porque o Florentino Pérez, quando assumiu em 2000, prometeu torná-lo na maior empresa de mídia e entretenimento do futebol mundial. Está aí o resultado. Passados menos de 20 anos, é o maior do mundo.
Nas reuniões, o senhor repetiu que o projeto passava longe de ser balcão de compra e venda de jogadores. É possível administrar sem ser vendedor no Brasil?
É óbvio que comprar e vender jogadores faz parte do negócio. Uma coisa é ter 90% da receita com TV e quando faltar receita completar com venda de jogador. A nossa ideia é de que o grande bolo venha do marketing, da valorização da marca, da área comercial, do patrocínio, de várias outras ações que faremos no estádio e ações de mídia. Tem muita receita na mesa que o futebol não pega.
A mídia é uma fonte de receita que os clubes ainda não viram?
O modelo de gestão do futebol se aproxima ao da indústria de entretenimento. Vou falar baixo aqui, para que não me ouçam muito (risos). Não somos diferentes da Disney. Ela tem um parque temático. Meu parque temático é o estádio. Nós temos a TV, que produz o jogo, a Disney tem seus próprios canais, em que vende seu produto. Também vendo, sou uma empresa de mídia e entretenimento. Sou dono do meu conteúdo de mídia, vou produzi-lo porque é meu. Aí tem muito dinheiro na mesa.
Inicialmente, os investidores para o seu projeto são o senhor e seus dois sócios. Há outros investidores? Há estrangeiros?
Há conversas avançadas com dois grupos de fora, que trabalham com futebol e queriam entrar no Brasil. Somos essa chance. Eles têm clubes grandes, na Liga dos Campeões. Investidores nacionais, não temos ainda. Nos interessa é ter um investidor estratégico.
*ZHESPORTES