Julinho Camargo tem receio de falar para a mídia impressa. Prefere rádio, para que a assessoria do Boa saiba exatamente o que ele tem falado Brasil afora. Há uma semana, as entrevistas do treinador do time de Varginha não versam mais sobre o desempenho de sua equipe em campo. Tratam da polêmica contratação do goleiro Bruno, em liberdade após cumprir seis anos da condenação pelos crimes de homicídio triplamente qualificado, sequestro e ocultação de cadáver de Eliza Samúdio, mãe do seu filho.
Com a tratativa de que seria enviado o áudio da rápida conversa no fim da noite de quinta-feira, o gaúcho de Porto Alegre com passagens por Grêmio e Inter topou falar com Zero Hora. Confira os principais trechos.
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Há uma retaliação por parte dos patrocinadores. Você não teme falta de verba para buscar reforços?
Não. Essa situação é uma situação que cabe à direção, não passa pelo meu papel. Tenho que fazer o time andar em campo. Estou no meu segundo ano aqui, sei que é um clube particular com três donos. E acho que, o que vivemos no ano passado, na Série C e o acesso à Série B, nos dá direito a uma cota e a uma ajuda financeira.
A contratação do goleiro Bruno foi debatida com você antes de ocorrer?
Não. A contratação foi feita pela direção, assim como acontece com outros jogadores. No momento da contratação do Bruno, estávamos fora de Varginha e acabei recebendo a informação. Eu encaro com normalidade, porque são os donos do clube. Recebi o Bruno assim como toda comissão, como qualquer atleta contratado. Somos funcionários e vamos tratá-lo como qualquer outro colega.
Mas como você encarou a notícia?
Como te falei, sou um funcionário do clube e recebi a notícia como qualquer outra. Sei que é uma contratação que chama a mídia, que tem uma série de coisas por trás, mas eu, como educador, vejo o Bruno como qualquer outro atleta. Não vejo rosto, credo, cor ou classe social. Tenho como premissa enxergar todos como meus alunos e é assim que vamos tratar todos eles.
Não assusta ter um jogador no grupo que cometeu um crime hediondo e ainda não cumpriu toda a pena?
Volto a te falar. Tenho uma premissa como educador de não ver rosto. No momento em que o Bruno é meu atleta, tenho e enxergo ele como enxergo o Ramão, Felipe, todos os meus jogadores.
Não houve algum tipo de resistência no grupo?
Não. A gente recebeu o Bruno de forma natural. Ontem, inclusive, tivemos um jogo, em uma vitória boa e as coisas estão seguindo dentro do curso natural.
Você já conversou com o Bruno? Sabe das projeções dele?
Na verdade, as conversas são muito naturais. Não conversei com o Bruno em especial. Ele é um jogador que hoje faz parte do meu elenco e trato de forma natural, assim como os outros jogadores. O nosso foco são as competições. E todos nós temos vida particular. Mas o nosso objetivo mútuo é fazer grandes competições para o clube. Neste sentido, acabamos tendo o foco nas conversas em relação às competições.
A ideia é fazer grandes competições. Mas o Bruno, por exemplo, não vinha jogando. Como ele está fisicamente?
Ele vai ter que resgatar uma série de situações físicas, técnicas e táticas de um jogador que ficou parado algum tempo. Por exemplo: temos o Ramão que ficou uma temporada fora por lesão. Isso é uma situação normal de trabalho. Às vezes, pegamos jogadores que lesionaram e ficaram uma temporada parado. São situações cotidianas. Bruno vai demorar um ou dois meses para entrar em forma plena.
Mas o Bruno não está uma temporada parada. São pelo menos seis anos.
São anos, mas ele é um jogador que foi formado no Atlético-MG, tem passagem pelo Corinthians e Flamengo. Jogadores que tem formação em grandes clubes têm lastro de treinabilidade muito grande e geralmente não demoram para readquirir a boa forma. Então, como sou oriundo da dupla Gre-Nal, sei bem como é.
O clube não teme rejeição da torcida do Boa e do resto do Brasil?
O que os outros pensam, não posso te responder. A gente está aqui, trabalhando. Fizemos um jogo frente à nossa torcida (o Bruno estava na arquibancada), tivemos boa torcida, o torcedor vibrou com os gols (o Boa venceu o Araxá por 2 a 0 pelo Mineiro).
Vocês acreditam na inocência do Bruno?
Isso não cabe a mim responder.
É um assunto difícil para vocês...
Não vejo dificuldade. Só acho que não cabe a mim responder este tipo de pergunta.
Você cogitou pedir demissão do clube pela contratação do Bruno?
Não. Eu já falei, sou funcionário do Boa Esporte e o meu foco é futebol.
Vamos ao futebol então. O Boa está pronto para a Série B?
Na verdade, ainda não. Temos um primeiro semestre muito diferente do segundo. Estamos jogando o módulo B, do Mineiro, em que tem de jogar com atletas sub-23. É um momento que o clube está trabalhando em cima de apostas. Para o Brasileiro, vai ser uma situação mais competitiva, e o clube vai investir em contratação e formatação de elenco. Saímos um pouco atrás dos outros clubes, porque todos usam o estadual para amadurecer, e eu vou ter de fazer isso durante o Brasileirão.
O Inter estará no caminho do Boa. Você tem acompanhado a equipe de Antônio Carlos Zago?
A gente sempre acompanha. Sou gaúcho e gosto muito do futebol daí. Acompanhamos bastante não só a dupla Gre-Nal. Entendo que o Inter é o grande favorito para uma das quatro vagas. É um clube que tem um poder de investimento, tem histórico, camiseta, grandes jogadores. Vai ser o adversário mais difícil da competição.
Qual o objetivo do Boa para a Série B?
Projetamos fazer a competição de bom nível, nos mantendo na Série B, esse é o primeiro grande objetivo do clube. E, a partir daí, se encaixar a equipe, projetar algo maior.
*ZHESPORTES