Nove atletas campeãs olímpicas com a Seleção Brasileira enviaram um documento à Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) no último dia 16 com questionamentos ao sistema do ranking da Superliga feminina para a temporada 2017/2018, assunto que gera polêmica há anos no torneio.
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Todas as envolvidas foram classificadas com a pontuação máxima nos critérios da entidade, que limita o número de jogadoras de ponta por clube como forma de gerar equilíbrio. Elas reclamam que têm pouco poder na tomada de decisão, mas a medida foi aprovada pelos seus próprios clubes na última semana.
As indignadas são as centrais Thaisa, do Eczacibasi Vitra (TUR), e Fabiana, do Dentil/Praia Clube; a levantadora Dani Lins, do Vôlei Nestlé; as ponteiras Fernanda Garay, do Guangdong Evergrande (CHN), Jaqueline, do Camponesa/Minas, Natália, do Fenerbahce (TUR), e Gabi, do Rexona-Sesc/Rio de Janeiro; e as opostos Sheilla e Tandara. Elas tiveram a pontuação máxima mantida na mais recente atualização da lista.
O principal motivo para as queixas é que, como há poucos times no Brasil em condições de pagar os salários almejados pelas estrelas do vôlei brasileiro, muitas acabam sem mercado na época de contratações. Além disso, somente as atletas de sete pontos serão atingidas pela limitação agora. No documento divulgado, não é feita nenhuma menção ao fato de os clubes terem aprovado, por maioria, a manutenção do ranking.
No texto enviado à CBV, as atletas ressaltam que o ranking, que só existe no Brasil, foi criado "sob o pretexto de se criar equilíbrio na competição". Porém, dizem que "nunca houve equilíbrio, basta verificar as poucas mudanças nos vencedores da Superliga nos últimos anos".
Nos últimos 11 anos, o Rexona/Rio de Janeiro não ficou fora de nenhuma decisão do campeonato. Faturou nove títulos. O maior rival da equipe carioca foi o Vôlei Nestlé/Osasco, que levou três taças no período. Praia Clube e Sesi-SP se classificaram uma vez cada, e perderam a decisão para as comandadas de Bernardinho.
Na semana passada, a CBV anunciou o fim do somatório de pontos por equipe como tentativa de amenizar os desconfortos. Até a atual temporada, todas as atletas do torneio eram ranqueadas entre 0 e 7, e cada clube não poderia ultrapassar o total de 43. Agora, a única restrição é que os times podem ter apenas duas jogadoras de sete pontos e duas estrangeiras.
– Estamos indignadas com a discriminação. E não tivemos resposta para essa carta de repúdio enviada à CBV. Eles simplesmente a ignoraram. Do que adianta ser jogadora de Seleção, ser top de linha no seu país, se isso só te causa desvantagem e só te atrapalha? – disse a bicampeã olímpica Thaisa.
Confira a íntegra do documento
Nós, Danielle Rodrigues Lins, Fabiana Marcelino Claudino, Fernanda Garay Rodrigues, Gabriela Braga Guimarães, Jaqueline Maria Pereira de Carvalho Endres, Natália Zílio Pereira, Sheilla Castro de Paula Blassioli, Tandara Alves Caixeta e Thaisa Daher Pallesi, atletas brasileiras de voleibol, prejudicadas pelo ranking adotado pela CBV – Confederação Brasileira de Voleibol – repudiamos o regulamento do ranking votado em 14/03/2017 e imposto para a temporada 2017/2018.
O ranking, que já foi alvo de críticas em diversas oportunidades, é uma anomalia que só existe no Brasil, sob o pretexto de se criar equilíbrio na competição. Porém, nunca houve equilíbrio, basta verificar as poucas mudanças nos vencedores da Superliga dos últimos anos. O problema do voleibol brasileiro é estrutural e não adianta tentar corrigi-lo com um ranking que cria um equilíbrio artificial e teórico.
O ranking sempre criou problemas às atletas, principalmente àquelas com maior pontuação. As limitações impostas pelo regulamento, que por si só, vão de encontro ao interesse das atletas, que são verdadeiras protagonistas dos eventos esportivos, ainda são inconstitucionais, tendo em vista que impõem restrições à liberdade de trabalho das atletas, ao direito de escolha de cada uma, ao livre mercado e força a redução dos salários, o que é inconcebível. É importante lembrar, também, e lamentar, que a opinião das atletas nunca foi ouvida, sequer levada em consideração nas decisões que envolvem o ranking.
A própria CBV criou a chamada "Comissão de Atletas", mas esta comissão ligada à própria instituição tem apenas um voto na decisão do ranking. Não é razoável. Se há cerca de 10 clubes votantes, as atletas nunca terão chance contra os demais. Repetimos: não é razoável. Quando a vontade das atletas prevalecerá? Da forma como as coisas estão, jamais!
A situação ficará ainda pior na temporada 2017/2018, pois tomamos conhecimento que o novo formato do ranking pontuará apenas nove atletas, as mesmas nove que são pontuadas com sete pontos (pontuação máxima) na temporada atual. Apenas nós estaremos sujeitas às restrições. Nós não poderemos ser contratadas livremente pelas equipes, pois cada time poderá ter apenas duas das nove, ao contrário das demais atletas que serão livremente escolhidas, o que configura clara discriminação e desrespeito.
Se assim as coisas permanecerem, nós seremos prejudicadas sob o frágil e teórico argumento de “equilíbrio do campeonato”. Nós, que defendemos a Seleção Brasileira, que nos destacamos, agora seremos punidas por isso. Não é razoável. Aliás, não há lógica nisso. Queremos ser tratadas de forma igual, sob pena de nos socorrermos ao Poder Judiciário, tendo em vista a clara e manifesta afronta a princípios constitucionais.
Alem disto, as estrangeiras não serão pontuadas, o que diminui ainda mais as opções das nove brasileiras discriminadas. Vale destacar que em 14/03/2017 a própria CBV divulgou a "Seleção da Superliga" e nela há três estrangeiras: Destinee Hooker, Alexandra Klineman e Branda Castillo. As três são atletas de alto nível e serão escolhidas livremente pelas equipes para a próxima temporada, ao contrário das nove brasileiras pontuadas. Ademais, nesta "Seleção da Superliga" há apenas uma atleta das nove presentes no ranking. Isto mostra que o sistema do ranking não tem critérios claros e não cumpre sua suposta função.
Diante do exposto, exigimos que a CBV tome providência no sentido de extinguir o ranking e parar de interferir no direito de escolha de cada atleta. As atletas precisam ter uma voz independente da confederação e ter peso igual nas votações do regulamento. Se de um lado os clubes pagam os salários, de outro são as atletas dão o espetáculo e atraem o público.
Aguardamos um posicionamento da CBV em até 5 (cinco) dias corridos. Estamos abertas a discutir o assunto para resolver o impasse.
Danielle Rodrigues Lins
Fabiana Marcelino Claudino
Fernanda Garay Rodrigues
Gabriela Braga Guimarães
Jaqueline Maria Pereira de Carvalho Endres
Natália Zílio Pereira
Sheilla Castro de Paula Blassioli
Tandara Alves Caixeta
Thaisa Daher Pallesi
São Paulo, 16 de março de 2017.