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Tenista número 171 do mundo, uma posição privilegiada levando em conta o universo de mais de 2200 atletas com pontuação no ranking da ATP, Guilherme Clezar, 23 anos, teve passagem relâmpago pela Capital recentemente. Gostaria de ter ficado mais tempo, já que a estada de apenas cinco dias o impediu de reencontrar todos os amigos e familiares que moram na cidade natal. Mas não dá. Ainda que o perfil do tenista número 5 do país indique um jovem tranquilo, o circuito profissional obriga o gaúcho a ter uma rotina corrida.
Quando recebeu ZH na casa dos pais, no bairro Três Figueiras, Clezar chegou alguns minutos atrasado – para fazer justiça, a reportagem também não teve pontualidade britânica. O tenista precisava ir ao banco e fazer "outras coisas chatas, que não podem ser feitas fora de casa (em outras palavras, fora da cidade onde reside)". Assim, por cerca de 10 minutos foi o pai, Emerson, quem "fez sala".
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Com roupa de tênis – da mesma marca que fornece o material do filho –, Emerson, pelo seu estilo, nem precisaria dizer que foi o responsável pela iniciação de Guilherme no esporte. Ainda assim, lembra orgulhoso:
– Ele iniciou no tênis por minha causa – comenta o tenista amador que começou a simpatizar com as quadras por volta dos 30 anos, depois de ter problemas de joelho em função dos jogos de futebol.
No futebol, aliás, Emerson não exerceu grande influência sobre o filho. "Único colorado que teve cadeira no Olímpico", aceitou ver Guilherme rumar para o lado tricolor ainda pequeno. Para ele, os anos 90 não foram fáceis para as crianças torcerem pelo Inter.
O orgulho de Emerson pelo filho, independentemente disso, é muito forte.
– O Guilherme é muito centrado e, olha, aluno nota 10 – afirma, gesticulando.
Um dos poucos deslizes do filho Emerson ainda recorda:
– A única vez que ele ficou em recuperação foi na quinta série. Sabe por quê? Porque ele fez a prova de uns colegas. Não é, Guilherme?
A esta altura o tenista já está em casa.
– Sim, pior que é verdade.
"O que falta para mim, agora, é conseguir constantes resultados para ficar mais perto do top 100"
Recentemente você ganhou do Rogério Dutra Silva (Rogerinho), número 2 do Brasil e 113 do mundo. Ano passado, no qualifying do US Open, venceu o espanhol Nicolas Almagro, ex-top 10. O que representam vitórias assim?
Conseguindo vitórias sob certos jogadores você ganha esperança de que é possível almejar alguma coisa maior. Tenho até comentado com meu treinador que atualmente é muito difícil eu perder para jogadores com ranking mais baixo que eu, faz tempo que não acontece isso.
O que falta para dar um salto maior na carreira?
Falta ganhar dois ou três Challenger, fazer um resultado legal em um ATP. Aí sim vou conseguir dar um passo maior na minha carreira.
Além da quadra, o que você faz de trabalhos para se preparar para o circuito?
Tem um staff grande envolvido por trás do tenista. Tem o treinador, preparador, psicóloga, fisioterapeuta que também me ajuda quando eu preciso. Então são coisas que todo tenista tem que ter, senão sempre vai haver algo que vai pesar. Se não for na quadra, será na parte mental, se não for na mental, vai ser na física. Aí, de repente, tu tens uma lesãozinha ou outra... então sempre é bom ter alguém controlando essas coisas. Hoje em dia, jogadores top viajam com 10, 15 profissionais. Obviamente, hoje não tenho estrutura financeira para poder bancar isso, mas o que é possível fazer a gente faz.
Mas você já sentiu essa diferença em um jogo específico, contra alguém com staff maior que o seu?
Não dá para dizer que o adversário chega mais bem preparado para o jogo em si, mas isso pode fazer mais diferença ao longo do torneio.
E a partir de que momento é possível aumentar a equipe, levar um staff maior para os torneios? Muitos comentam que é a partir da posição 200 para baixo que o tenista começa a ganhar dinheiro, é isso mesmo?
De 200 para baixo o cara se mantém. Perde dinheiro uma semana, em outras empata, outras ganha, mas não é uma coisa bem fixa. Dentro do top 100 praticamente ganha dinheiro todas as semanas, aí de repente pode pensar em viajar com treinador, preparador físico, fisioterapeuta.
Você já se sente integrante do top 200?
No top 200, já estou bem estabelecido. O que falta para mim, agora, é conseguir constantes resultados para ficar mais perto do top 100.
Qual vitória mais marcou você?
Com certeza a vitória sobre o (Nicolas) Almagro foi a que me deixou mais empolgado. Ainda está bem presente em mim.
O que está faltando para entrar na chave principal de um Grand Slam?
Um pouco de sorte, talvez. Ano passado fiquei a uma rodada da chave principal em duas ocasiões (Roland Garros e US Open). Então é uma coisa que está perto, não muito distante. Furar um quali de Grand Slam é como se fosse uma semifinal de um challenger duro. E eu já fiz algumas, então não é uma coisa tão fora de alcance.
Recentemente foram divulgadas notícias sobre um grande esquema de corrupção no tênis. Você já teve oferta para "entregar" um jogo?
Acontece em todos os níveis (do tênis), e pode ser que nos Futures (torneios profissionais menores) o pessoal se corrompa um pouco mais por ter muito pouco dinheiro envolvido no torneio, mas a mim nunca ofereceram. Vários que jogam comigo já me contaram histórias, mas nunca soube de ninguém que aceitou. Mas não tem como dizer que a gente não recebe porque recebe, sim.
*ZHESPORTES