Os flagrantes mostrados por Zero Hora na terça-feira, em que torcedores ingeriam bebidas alcoólicas e drogas no interior dos estádios Beira-Rio e Arena do Grêmio, colocam a liberação do álcool nos estádios brasileiros em debate mais uma vez. Enquanto a maior parte dos Estados brasileiros mantém o veto, assim como o restante da América do Sul, há países que apostam em manter liberdades como a venda de álcool amparadas por uma política social mais ampla:
- A Alemanha, por exemplo, é um modelo para gente na prevenção da violência. Eles têm um projeto de intermediação de conflitos que envolve pedagogos, assistente social com a política e tem dado bom resultado - explica a professora da Unicamp Heloísa Reis, especialista em Sociologia do Esporte, Lazer e Pedagogia.
Torcedores ingressam em estádios da dupla Gre-Nal com bebidas alcoólicas e drogas
Heloísa alerta, porém, que bons modelos de diminuição da violência não necessariamente optam pela liberação da bebida. A Colômbia, por exemplo, também é citada como um país de boas iniciativas, e não permite álcool na arquibancada.
Zero Hora convidou cinco jornalistas para contar suas experiências em estádios de diferentes países. Dos relatos, conclue-se que o álcool é apenas um dos elementos envolvidos quando o objetivo é transformar o jogo de futebol em uma experiência divertida e segura.
Confira o que dizem Grêmio, Inter, Arena e Brio sobre flagrantes
Alemães bêbados e comportados
Por Guilherme Becker, repórter de Zero Hora
"Se fosse preciso resumir a questão da bebida alcoólica nos estádios da Alemanha, seria da seguinte forma: é proibido proibir, ou melhor, é proibido não beber. Mas é totalmente proibido arrumar confusão. O que para nós parece algo contraditório, antagônico até, para eles não passa de obrigação: beber é se divertir, e não brigar.
É lógico que há confusão. Os grandes clássicos concentram batalhões policiais inteiros para conter bêbados exaltados - milhares de alemães embriagados não vão se comportar como monges tibetanos, é bom frisar. Mas, na maior parte do tempo, é tudo muito tranquilo: beber faz parte do cotidiano. Álcool a menores, diga-se, é carta fora do baralho - embora seja possível ver alguns guris bem jovens bebendo.
Adquirir bebida nos arredores ou dentro das arenas é muito fácil. A cada dúzia de metros há um bar ou mesmo um vendedor ambulante. O preço é acessível, o líquido é saboroso. Senta-se, bebe-se e bom divertimento. Mas controle-se. Qualquer exaltação extrema ou mesmo aporrinhação desnecessária poderá gerar graves problemas ao infrator. Basicamente, ele tende a ser retirado do estádio. A diferença está na educação: sabendo disso, não tem porque passar dos limites. Na Alemanha, a questão vai além: estamos falando de um país em que a federação ouve e atende os torcedores, que rechaçaram a extinção dos lugares em pé, que pediram e levaram arquibancadas para torcer enquanto bebem e fumam (cigarro, cachimbo ou charuto, no caso). Enquanto divertem-se, no fim das contas. Drogas como maconha não são legalizadas, mas também é possível sentir o cheiro, vez e outra, em meio às bancadas. A impressão que dá é que, pelo fato de o povo ser bem mais educado e avançado na questão da liberdade individual, tudo é muito mais tolerado. Mais ou menos assim: quer usar? Use, desde que você se comporte."
MP atua para impedir derrubada da proibição do álcool
Diversão só para maiores nos EUA
Por David Coimbra, colunista de Zero Hora
"Meses atrás levei meu filho ao jogo dos Red Sox, o time de basebol de Boston, um dos mais famosos dos Estados Unidos. Chegando ao estádio, o histórico Fenway Park, fiquei espantado já antes de entrar. As ruas do entorno estavam tomadas: famílias inteiras se mantinham em bares, restaurantes e quiosques instalados nas calçadas. Não estavam apressadas para se instalar nas arquibancadas. Parecia uma quermesse.
No lado de dentro, o ambiente não era muito diferente. Os torcedores dos Red Sox e dos Yankees sentavam-se lado a lado e, em meio à partida, as pessoas saíam para ir ao bar e comer hot dogs ou beber alguma coisa. Resolvi, eu também, beber uma cervejinha, de preferência a local, a Samuel Adams. Para minha surpresa, pediram a minha identidade. Bebida alcoólica, só para quem tem mais de 21 anos. Fiquei feliz, pensando que o atendente havia achado que tenho cara de guri, mas não era nada disso. É que às vezes um policial dá uma incerta para saber se o estabelecimento está pedindo identificação. Se não estiver, a multa é pesadíssima e o bar é fechado.
Portanto, bebe-se dentro e fora dos estádios americanos, desde que se possa provar a maioridade. Mas a forma de torcer é completamente diferente. As pessoas vão aos estádios para assistir aos jogos e se divertir, não para ajudar suas equipes a vencer. Há alguns meses, torcedores de hóquei no gelo começaram a brigar nas arquibancadas. Os jornais fizeram matérias e as autoridades manifestaram preocupação: não queriam que os torcedores dos esportes tipicamente americanos se comportassem como os de futebol. E mesmo no futebol a forma de torcer é diferente. Por um detalhe: nos EUA, o futebol feminino é mais popular do que o masculino. Com mais mulheres na torcida, o comportamento é mais civilizado. Assim, nem bêbados eventuais chegam a incomodar."
Trago F.C.
Alemanha liberado e Argentina vetado: como está a relação do álcool nos estádios pelo mundo
Políticas sociais estão por trás de lugares em que permitem bebida alcoólica e o que mantém proibido o consumo
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