Alvo de muita polêmica após as manifestações racistas na Arena do Grêmio, semana passada, a torcida Geral se manifestou nesta terça-feira (16) pela primeira vez e se disse injustiçada com a suspensão aplicada pela direção do clube depois do episódio envolvendo o goleiro Aranha.
Em entrevista concedida na casa onde mora, em Canoas, o principal líder da torcida, Rodrigo Rysdyk, 35 anos, o “alemão da Geral”, falou que espera uma explicação do clube para a punição.
Segundo ele, a decisão é totalmente equivocada. Rodrigo disse que não é possível controlar o que cada torcedor fala dentro do estádio e que cânticos com o termo “macaco” haviam sido suspensos pela Geral.
Rádio Gaúcha: Como vocês recebem a decisão do clube de suspender à Geral do Grêmio?
Alemão: Ficamos surpresos com a direção do Grêmio. A Geral já passou por vários presidentes, cinco gestões, e todos disseram que a liberação de materiais ligados a torcida, como bumbos, faixas e bandeiras não é de responsabilidade do Grêmio e sim da Brigada Militar. Estranho que isso tenha mudado agora. No gre-nal, após alguns problemas, a gente havia tomado uma punição da Brigada e do Ministério Público de cinco jogos e decidimos cumprir. Como a gente sofreu essa pena, decidimos não cantar, não se manifestar no estádio. E depois do jogo de quinta, após toda a polêmica, havíamos suspendido ainda o termo “macaco” nas nossas músicas. Mas, sem banda é impossível qualquer torcida do mundo coordenar cantos. Infelizmente um torcedor puxou a música no jogo contra o Bahia. Não foi da organizada. Foi cantada durante dois ou três minutos. Se fosse algo organizado, como algumas pessoas estão falando, com intenções políticas, a torcida teria se organizado para cantar, prejudicar o clube do primeiro ao último minuto.
Você acredita que essa punição tenha alguma ligação política, já que a Geral do Grêmio possui integrantes dentro do Conselho Administrativo?
Eu não quero polemizar e nem colocar na conta do Presidente do clube ou de algum movimento político. A gente quer uma explicação do Grêmio de porque suspender a Geral. Isso não é solução para o tema do racismo. Proibir bumbo, bandeira, faixa, não vai fazer o sujeito deixar de ser racista. O mal intencionado não vai ir lá e virar bonzinho. Não consultaram a Geral. Não sei se consultaram a Brigada Militar ou o Ministério Público. Mas, a decisão foi errada. Nós vamos lutar pelos nossos direitos de ir e torcer pelo nosso clube.
Os episódios contra o goleiro Aranha do Santos e os cânticos do último jogo contra o Bahia vieram do setor onde fica a Geral. Nesses casos, vocês percebem que eles estão ocorrendo? É possível coibir isso?
Se acontecer algo do tipo, perto de alguma pesoa envolvida com a Geral, certamente, vamos perceber. Só que o setor da Geral é gigante. É impossível você indentificar uma pessoa no meio da multidão com todos gritando ao mesmo tempo. Tanto que a menina que chamou o goleiro do Santos de macaco não foi flagrada pelo áudio e sim pela leitura labial. A torcida foi construída também por negros e agora colocar na conta da Geral é uma baita injustiça.
As pessoas envolvidas nos atos de racismo eram da Geral?
Não, porque eu não conhecia. Essa menina eu nunca vi na vida. E é difícil comentar em cima de algo que eu não estava perto. As imagens são claras da menina gritando macaco e de alguns torcedores imitando macaco, mas é difícil dizer se era para o goleiro ou para outra pessoa. Daqui a pouco poderiam estar, por exemplo, xingando o Leandro Damião, porque era ex jogador do Inter. Só que isso é muito difícil coibir no meio da multidão.
A torcida já se envolveu em muitas brigas dentro e fora do estádio. Mas atos de racismo não eram muito comuns. Porque eles aconteceram nos dois últimos jogos?
O que aconteceu com o goleiro não foram cânticos da torcida. Foi uma imagem, de uma torcedora. Não teve cânticos, especificamente, contra o goleiro ou contra qualquer jogador do Santos ou Grêmio. Não existiu. Foram poucas pessoas. E no último jogo partiu de alguns. Nós não temos gestão nenhuma de coordenar cinco ou seis mil pessoas sem os instrumentos. Isso quem freqüenta a torcida sabe. As musicas podem partir de qualquer local, se não tem banda organizada.
Como vocês recebem as vaias dos demais torcedores no estádio para a Geral?
É triste. É chato. O cara está ali para apoiar o time e daqui a pouco outro torcedor te vaia por alguma atitude, certa ou errada. Acho que o torcedor não vaiou a Geral pelas atitudes, pelo certo ou pelo errado, mas sim pelo medo de punições. A torcida está com medo porque o Brasil todo está batendo nessa tecla de que o Grêmio está servindo de exemplo negativo para o tema do racismo.
A torcida Geral surgiu em 2001. Esse é o momento mais delicado que vocês estão passando dentro do Grêmio? Como está organizada a atual torcida?
Não. Eu acho que o pior momento foi em 2004 quando aconteciam muitas proibições. Tinham pessoas da época nos prejudicando, dificultando o relacionamento com a Brigada Militar, que é quem fiscaliza e diz o que pode entrar ou não no estádio.
Pessoas da atual gestão do clube?
Também. Algumas que já em 2004 nos prejudicaram muito.
Vocês pretendem fazer algo para coibir atos de racismo a partir de agora?
A gente tem um ponto de concentração que hoje já é bem conhecido. Quem quiser conferir como a torcida se organiza, como são as relações da Geral com os demais torcedores é só ir à concentração. Você vai ver gente de todas as classes sociais, de todas as cores, de todas as religiões, unidas por uma idéia. Temos líderes de torcida que são negros. Quem quiser ver está convidado. Vá lá atrás do gol e tire suas próprias conclusões. A geral é contra o racismo. Aliás, contra qualquer forma de preconceito.
Com essa suspensão, você teme que a direção possa pensar em colocar cadeiras naquele setor do estádio?
Não acredito nisso. O setor não foi criado para a Geral. Foi criado para as pessoas que gostam de ver os jogos em pé e pagando mais barato. É uma luta nossa. A torcida surgiu assim. Você tratar de um problema, simplesmente, colocando cadeiras, também é uma forma de discriminação.
Confira a entrevista em vídeo com o líder da Geral do Grêmio: