Julio Cesar foi tão grande que metade de seu nome tornou-se um mês, julho, e a outra metade tornou-se sinônimo de rei: kaiser na Alemanha, czar na Rússia, césar entre os romanos.
O curioso é que ele próprio, Julio Cesar, jamais foi rei. Cesar, que ironia, nunca foi césar. Quando Jesus falou "dai a césar o que é de césar", não falava de Julio. O nome Cesar, àquela altura, já havia se transformado em cargo. O "césar", por volta do ano 33 DC, era Tibério, que sucedera Augusto, este, sim, o primeiro césar, que também virou mês, agosto, mas essa é outra história. O que importa agora é Julio Cesar.
A vida de Julio Cesar foi uma fieira de lances bem-sucedidos, entre geniais e fortuitos, ou as duas coisas. Tratava-se de um homem inteligente, ousado e afortunado, e tinha consciência disso.
Uma vez, Cesar precisava atravessar um trecho do Mar Adriático no inverno, e precisava fazê-lo não em um grande navio, mas em um pequeno bote. O mar estava proceloso, nenhum marinheiro se arriscaria a enfrentá-lo naquelas condições. Mas Cesar teimou que iria em frente. Requisitou alguns homens e fez-se ao mar. Em meio ao trajeto, as ondas gigantescas jogavam com o barquinho para cima e para baixo, os remadores estavam apavorados, os olhos redondos de espanto e pavor, e aí Cesar sorriu para eles, e disse:
- Não se preocupem: vocês estão conduzindo Cesar e sua boa sorte.
Veja como Julio Cesar confiava na sua estrela. Como pensava positivamente. Isso é muito bom, faz com que uma pessoa vá em frente, não tema a vida e, graças a tal destemor, realize seus sonhos. Pena que esse sentimento nem sempre corresponda à realidade. No caso de Cesar, as ondas jogaram-no de novo para a praia e lhe espatifaram o bote. Ele não atravessou o Adriático. No caso dos times de futebol, a confiança exagerada causa um relaxamento que acarreta fracassos como alguns que vêm abalroando o Grêmio no Gauchão. Está faltando concentração ao Grêmio, está faltando cuidado. Melhor ter confiança desconfiando, entrar em campo, senão temendo, respeitando o adversário.
Cesar não aprendeu com o episódio do Mar Adriático. Continuou vivendo com um sorriso de vitória acima do queixo eternamente erguido. Resultado: na manhã de 15 de março de 44 AC, sua mulher advertiu-o de que tivera um pesadelo nefasto com ele e pediu que não fosse ao Senado, local onde referviam seus inimigos. Cesar sorriu com desdém e foi em frente. Tomou a liteira na qual um dos senadores traidores o aguardava. Pouco tempo depois, já na entrada do Senado, um homem se aproximou dele e lhe passou um bilhete que denunciava a conspiração para assassiná-lo. Cesar não leu. Guardou o bilhete numa dobra da toga, displicentemente. E foi em frente. No Senado, homens que o odiavam, que antes já tinham tramado contra ele, mas que ele, com sua imprudente confiança, havia perdoado, esses homens o apunhalaram até a morte.
A sorte não funciona sempre. Ela precisa de alguma ajuda. O saudável sentimento do medo às vezes bem pode ajudar.
Opinião
David Coimbra: "A confiança dos grandes"
David Coimbra
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