Havana - Na manhã seguinte ao triunfo de Cuba sobre o Brasil por 5 a 2 em Fukuoka, Japão, seu jogo de abertura no Clássico Mundial de Beisebol, Sigfredo Barros se aventurou no parque central cercado de árvores daqui para participar das reflexões do La Pena del Parque Central, um grupo que se junta todos os dias para debater beisebol.
Com 67 anos, um bigode branco que parece um esfregão e um senso de humor fácil, Barros tem 42 anos de carreira como jornalista de beisebol para o Granma, o jornal oficial do Partido Comunista de Cuba. Entre os maiores fãs no país, ele é um tipo de astro do rock.
Ele foi, imediatamente, cercado por dúzias de homens, que estavam dispostos a se envolver no debate, criando um cenário que poderia existir se as conversas de rádio sobre esportes fossem, de uma hora para outra, convertidas em discussões cara a cara e ninguém jamais desligasse o telefone. As opiniões chegaram até Barros, aparentemente de uma só vez.
- O Brasil foi fácil! Espere até termos que jogar contra o Japão.
- A formação é pequena. Nós não temos arremessador!
- Uma vitória é uma vitória. Vamos ficar felizes hoje.
Depois de 15 minutos, Barros acendeu um cigarro e, educadamente, se excluiu do grupo.
- Este torneio é o mais importante que temos para o time e para o país - disse ele mais tarde. - É equivalente à Copa do Mundo para o futebol no Brasil.
Em Cuba, onde a liga nacional, ou Serie Nacional, é estritamente amadora e os jogadores precisam sair do país para jogar em uma Liga Principal de Beisebol, o time nacional é o ápice do esporte. O Clássico Mundial de Beisebol marca a rara chance de competir contra os melhores talentos do mundo, levando esse país fanático por beisebol à loucura.
Ainda assim, por trás da empolgação, o torneio deste ano chegou em um momento desafiador para o beisebol de Cuba. Combinada com as transferências bem documentadas dos jogadores para os Estados Unidos, há também a preocupação de que os talentos diluídos da Serie Nacional não estejam preparando de modo apropriado os jogadores para o time nacional. E com os torneios internacionais como as Olimpíadas eliminando o beisebol, de repente há menos torneios internacionais amadores nos quais competir. Juntos, esses fatores criaram uma preocupação, se não uma crise, e colocaram ainda mais ênfase no Clássico.
- Jogadores de beisebol crescem como grama em Cuba - disse Barros. - Mas é uma questão muito importante pensar sobre o futuro.
Com a maioria dos cidadãos comunistas de Cuba ganhando não mais que o equivalente a 20 dólares por mês, reunir-se para ver o Clássico em bares e restaurantes é difícil economicamente. A maioria assistiu à vitória sobre o Brasil em casa, onde a transmissão de vídeo da MLB Network estava disponível, mas sem os comerciais e dublada por comentaristas cubanos. O jogo deixou as ruas geralmente movimentadas de Havana quietas por uma noite no fim de semana.
No torneio inaugural, em 2006, Cuba surpreendeu muitos comentaristas com sua performance na rodada do campeonato antes de perder para o Japão. Em 2009, o time avançou para a segunda divisão.
Barros, que não viajou para o Japão por conta de duas operações no joelho, feitas no ano passado, ficou de olhos arregalados e risonho ao se lembrar do torneio de 2006.
- Foi difícil para as pessoas com problemas de coração em Cuba - disse ele.
Alexei Ramirez, que jogou no time de 2006 e agora é interbases no Chicago White Sox, se lembra de voltar para Havana e ser recebido pelas autoridades do governo e, mais tarde, por Fidel Castro depois de uma parada na Malecon, uma avenida que beira a costa do Golfo.
- Eu me lembro como se fosse ontem - Ramirez disse com um largo sorriso. - Não houve nada como aquilo.
Mas Ramirez, assim como vários outros astros cubanos de Clássicos passados, incluindo Yoenis Cespedes de Oakland e Aroldis Chapman de Cincinnati, foi transferido e está em ligas principais hoje. Ele foi proibido de voltar a seu país natal, que dirá de jogar por ele.
Como um dos membros do Pena lamentou: - Imagine nosso time com Alexei, Chapman e Cespedes.
De acordo com o site "BaseballdeCuba.com", 169 cubanos já jogaram em ligas principais. Isso inclui 22 jogadores transferidos que estrearam desde 2000, comparados aos 10 dos anos 90, sugerindo que o caminho dos jogadores para os Estados Unidos está se tornando mais atraente.
- Os caras mais novos estão cada vez mais propensos a deixar o país - disse Peter Bjarkman, autor de "A History of Cuban Baseball, 1864-2006". - Não é muito profundo. Ainda há grandes estrelas, mas a qualidade geral da liga cubana está caída.
Este ano, a Serie Nacional está tentando remediar isso ao reduzir o número de times para a segunda metade da temporada de 16 para oito. Quando os jogadores cubanos voltarem do Clássico, apenas os oito melhores times na classificação irão competir, convocando os melhores jogadores dos times que foram eliminados.
Em uma ilha com uma população de 11 milhões de pessoas, havia muito mais debate sobre se os 16 times - cada um localizado em uma província - e a municipalidade da Isla de la Juventud, seriam práticos para preparar jogadores para o time nacional. Alguns apontaram para o fato de que, antes da revolução liderada por Castro em 1959, a liga profissional cubana consistia de apenas quatro times, embora eles jogassem quase exclusivamente em Havana.
- É uma decisão importante para o jogo cubano - disse Barros. - Isso irá nos ajudar a promover as jogadas do nosso time nacional, o que é o mais importante.
Mas onde, exatamente, o time nacional vai jogar tornou-se um novo obstáculo recentemente. O beisebol foi tirado das Olimpíadas para os Jogos de 2012, e a Copa do Mundo de Beisebol, administrada pela Federação Internacional de Beisebol, foi descontinuada em 2011 (há esperanças de que uma nova versão do torneio comece em 2015). A Serie del Caribe parece uma combinação ideal para o time nacional cubano, mas o time não compete este ano pois não pode pagar o que se diz ser uma taxa de inscrição de 1 milhão de dólares.
Ainda sim, tais preocupações não conseguiram diminuir o entusiasmo para o Clássico deste ano. Cuba foi em frente e derrotou a China e o bicampeão Japão, acabando em primeiro no grupo da rodada de abertura e aumentando as esperanças um pouco mais. Mas o time cubano foi eliminado do torneio depois de ser eliminado pela Holanda duas vezes na segunda rodada.
- Do jeito como jogamos seria difícil ganhar - disse o gerente do time, Victor Mesa. - Tentamos muito, jogamos com garra, mas cometemos alguns erros.
The New York Times
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