O Beira-Rio receberá, na manhã deste domingo (19), às 11h, o encontro entre o quarto e o nono colocados do Campeonato Brasileiro. De um lado, um time liderou a competição por três rodadas e que teve como pior posição até agora o quinto lugar. Do outro, um que ainda não passou na nona colocação e que já frequentou a zona de rebaixamento. Essa descrição pode enganar quem olhar apenas para as tradições dos clubes, pois Fortaleza e Inter chegam à 21ª rodada em situações inversas daquelas imaginadas no começo do Brasileirão.
A boa temporada do time cearense não passa apenas pelo Campeonato Brasileiro. O atual tricampeão cearense alcançou na última quarta-feira um feito inédito com a classificação para a semifinal da Copa do Brasil ao bater o São Paulo por 3 a 1, no Castelão. Esse momento, o maior da história do clube, é fruto de um processo de reestruturação que passou pela profissionalização de todas as áreas da diretoria.
O Fortaleza, que hoje almeja uma vaga direta na Libertadores de 2022, estava há apenas quatro anos na Série C, onde permaneceu por oito temporadas. Em três delas, o "Leão do Pici" bateu na trave perdendo a chance do acesso no último mata-mata — para Macaé, Brasil-Pel e Juventude.
Ali já havia começado o processo de reformulação administrativa com o então presidente Luís Eduardo Girão, agora senador pelo Estado do Ceará. Girão deixou o cargo logo após o acesso para a Série B para seguir a carreira política. Quem assumiu foi Marcelo Paz, atual presidente e responsável por ampliar os processos de profissionalização do clube. Atualmente, até mesmo os dirigentes eleitos — Paz entre eles — são remunerados.
— A história do Fortaleza começou a mudar em 2017. O Girão assumiu em 2015 com o objetivo de tirar o clube da Série C e renunciou após ter alcançado essa meta para se candidatar ao Senado. O Marcelo Paz, então, assumiu com o objetivo de equilibrar financeiramente o clube e fazer uma reformulação nas estruturas do futebol. O Girão tinha poder financeiro inclusive para investir no Fortaleza, diferente do Paz, que entende que quem trabalha no clube deve ser profissional e remunerado — conta o jornalista Alexandre Mota, do Diário do Nordeste.
Mesmo com essa reestruturação administrativa, o Fortaleza sofreu com a pandemia, principalmente pela perda de receitas com a ausência de torcida nos estádios - em 2019 havia tido a segunda maior média de público da Série A, atrás do Flamengo. No ano passado, a venda de Everton Cebolinha, com passagem pela base do clube, foi determinante para o balanço financeiro - o negócio entre Grêmio e Benfica rendeu cerca de R$ 4,5 milhões ao Fortaleza.
Marcelo Paz chegou a dizer na época que o valor recebido evitou que o clube atrasasse salários no ano passado. Manter os vencimentos do elenco em dia é um dos pilares da diretoria e que vem sendo cumprido em 2021. Apesar da dificuldade admitida por Paz, o Fortaleza terminou 2020 com a terceira menor dívida entre os 20 clubes da Série A.
Neste ano, as boas campanhas dão esperanças de superávit. Apenas a classificação para a semifinal da Copa do Brasil já rendeu R$ 17 milhões ao clube.
— A gente projetava Copa do Brasil até oitavas. Essas fases a mais vão diminuir esse déficit. Dependendo da colocação no Brasileiro, de zerar esse déficit, para ver se tem superávit. Estamos minimizando um déficit de temporada sem público. A estimativa de perda financeira do Fortaleza em função da pandemia em 2021 era de 25 milhões de reais. É muito dinheiro, são 18 meses sem público — declarou o presidente em entrevista ao Portal GE na sexta-feira.
De Ceni a Vojvoda
O crescimento do Fortaleza iniciado pela reestruturação administrativa teve no futebol o impacto de Rogério Ceni. O ex-goleiro e ídolo do São Paulo chegou à capital cearense em 2018 para ser mais que apenas o comandante da equipe na Série B. Após uma aproximação feita por Bosco, seu ex-reserva no Morumbi e que integrava a comissão técnica permanente do time cearense, Ceni alinhou com o presidente Marcelo Paz os passos que o Fortaleza precisava dar para se tornar um clube da elite do futebol brasileiro.
O técnico teve papel determinante na reformulação do CT do clube, o Centro de Excelência Alcides Santos, que ainda não está completamente concluída, mas já teve terminadas as obras em espaços como academia, vestiários, cozinha, refeitório, setores de reabilitação de atletas e do departamento de futebol.
Dentro de campo, Ceni foi o responsável por levar o Fortaleza ao título da Série B, em 2018, e pela classificação para a Sul-Americana de 2020 via Brasileirão de 2019 - a primeira participação do clube em um torneio continental. O treinador deixou o Fortaleza durante aquela campanha para comandar o Cruzeiro, mas retornou no segundo turno. Em 2020, novamente aceitou uma proposta para sair da capital cearense, assumindo o Flamengo, quando o Fortaleza correu risco de rebaixamento até a última rodada. Esses sustos nas ausências de Ceni fizeram o clube ampliar para fora do Brasil a busca de um treinador que alinhasse a ideia de futebol ofensivo com jogadores de médio porte.
Essa análise de dados chegou a Juan Pablo Vojvoda, argentino de 46 anos que levou o Unión La Calera a uma inédita classificação para a Libertadores com o vice-campeonato chileno em 2020. Antes, ele havia comandado em seu país Newell's Old Boys, Defensa y Justicia, Talleres e Huracán, mas estava longe de ser badalado, o que mostra como o Fortaleza buscou um perfil e não um nome que fosse sensação no continente.
Vojvoda foi formado como atleta no Newell's e é um dos seguidores do compatriota Marcelo Bielsa, influência para tantos treinadores de sucesso do futebol argentino e internacional, casos de Tata Martino, Mauricio Pochettino, Jorge Sampaoli, Hernán Crespo e Marcelo Gallardo.
Essa veia ofensiva de Vojvoda carregada pelo "bielsismo" atendeu ao que buscava o Fortaleza. O casamento deu certo cedo. Com apenas 14 dias de trabalho da sua comissão técnica, o Leão conquistou o estadual superando o rival Ceará na final. Foi o primeiro título da carreira do treinador argentino.
— O Fortaleza tem um DNA ofensivo, isso é histórico no clube. É um time que gosta de atacar com jogadores rápidos e que busca o gol. O Rogério deu vida a esse modelo e o Vojvoda foi buscado nesse sentido. É algo que está no DNA do clube e que outro modelo de jogo tem dificuldade de ser bem aceito — declarou o presidente Marcelo Paz a GZH.
As campanhas no Brasileirão e na Copa do Brasil, no entanto, surpreendem até mesmo quem acompanha o dia a dia do clube.
— A ideia sempre foi conquistar uma vaga em competição internacional pela Sul-Americana e o campeonato é de vaga na Libertadores. É com isso que o torcedor sonha nesse momento. Se isso ocorrer será inédito, nunca um clube nordestino conseguiu vaga na Libertadores via Brasileirão na era dos pontos corridos - cita Jussiê Cunha, da Rádio Band News de Fortaleza.
Será esse adversário organizado e surpreendente que o Inter de Diego Aguirre tentará superar neste domingo.
Inter pelo G-6
Se não faz uma campanha condizente ao status de atual vice-campeão brasileiro, o Inter passa por um momento de recuperação na competição. A atual posição, o nono lugar, é a melhor alcançada no Brasileirão pelo Colorado, que vem de seis jogos de invencibilidade. Há a possibilidade matemática até mesmo do time de Diego Aguirre entrar no G-6 nesta rodada.
Para ingressar pela primeira vez no grupo dos times que se classificam para a Libertadores, o Inter precisa vencer o Fortaleza no Beira-Rio. Além disso, será necessária uma combinação de resultado. Atual sexto colocado, o Corinthians precisa ser derrotado pelo América-MG, no Itaquerão, também neste domingo, e Cuiabá (8º) e Fluminense (7º) devem empatar, na segunda-feira (20), em partida marcada para a Arena Pantanal.
Se a combinação parece difícil, o Inter precisa vencer para, pelo menos, não correr o risco de ver a distância para o G-6 aumentar caso alguns de seus adversários conquiste os três pontos na rodada.
Em relação ao time que venceu o Sport, na última segunda-feira, Diego Aguirre contará com o retorno de Rodrigo Dourado após suspensão. Com isso, o Inter deve voltar a contar com uma formação com Dourado e Lindoso juntos. Assim, Edenilson viraria extrema pela direita com Caio Vidal voltando para o banco. Como Taison não treinou durante a semana, Mauricio é o mais cotado para ser o meia por trás do centroavante Yuri Alberto.
Diante do Fortaleza, o Inter tentará mudar um panorama negativo da atual temporada. O Colorado é o quarto pior mandante do Brasileirão. Até agora, os clube gaúcho disputou oito jogos no Beira-Rio, com apenas duas vitórias, três empates e três derrotas — um aproveitamento de 37,5% superior apenas aos de Chapecoense, Sport e Corinthians.
Uma das explicações para esses números é a dificuldade que o time costumar ter para furar retrancas. Por conta disso, o fato de o Fortaleza ter uma maneira de atuar ofensiva é vista como algo que o Inter poderá tirar proveito. Fora de casa, onde costumar jogar com estratégias de apostar um primeira marcar e atacar em transições, o Colorado tem um bom aproveitamento, de 51,5%. É o quarto melhor visitante da competição — atrás apenas de Atlético-MG, Bragantino e Corinthians.
Fortaleza
- Atualmente: 4º colocado
- Pior posição: 5º
- Foi líder por três rodadas
Inter
- Atualmente: 9º colocado
- Melhor posição: 9º
- Pior: esteve em 17º (na segunda rodada, após a goleada de 5 a 0 para o Fortaleza)