Klaus está devendo uma janta para Camilo. Os dois escanteios cobrados pelo meia, que se transformaram em gols do zagueiro contra o Londrina, motivaram a brincadeira. As assistências mereciam uma recompensa. A saída foi prometer uma refeição. Falta só resolver o restaurante. Por enquanto, ele dá moral para seu garçom.
– Quem cobra melhor escanteio, Camilo ou D'Alessandro?
– Vou tentar ser justo: vamos ver às estatísticas. Fiz quatro gols. Dois foram cruzamentos do Camilo, um do D'Ale e um do Diego. Então, Camilo. O Cuesta, sim, faz gols dos cruzamentos do D'Alessandro...
E cai na risada.
Klaus vive seu melhor momento no Inter – e na carreira. Aos 23 anos, encontrou no argentino um parceiro sólido que levou o time da sexta para a primeira posição na Série B. Marcou quatro gols na competição (até então, tinha apenas um como profissional, contra o Grêmio, na semifinal do Gauchão de 2016 quando atuava pelo Juventude). Todos foram de cabeça. To-dos.
– É treino. Primeiro o defensivo, de pegar a bola no ponto mais alto, dar força e impulsão. Depois o ofensivo, de saber onde colocar a bola, se posicionar, escapar da marcação. Estudamos a marcação dos adversários e executamos. É isso o que fazemos a semana inteira. Claro que nossos cobradores estão de parabéns também – comenta.
Mas Klaus sofreu bastante antes de chegar a este momento. A começar que foi indicado por Antonio Carlos Zago, com quem havia trabalhado no Juventude. Era sua referência como zagueiro e sua segurança como atleta do Inter. Começou o ano como titular, estava se firmando quando sofreu uma lesão. Saiu do time, perdeu os jogos finais do Gauchão e, com a troca de técnico, foi para o fim da fila. Não desanimou, viu na chegada de Guto Ferreira a oportunidade de mostrar sua qualidade e seguiu trabalhando, sabia que a oportunidade viria. Ela veio. Mas no pior momento possível.
O Inter havia perdido, no último minuto, para o Vila Nova, em Goiânia, sem Klaus. Naquele momento, era um confronto direto. O time caiu para a sexta posição, ficou longe da liderança, Guto Ferreira recebeu uma espécie de ultimato, e o Beira-Rio virou a pressão quase explodiu o Beira-Rio.
– Aquele fim de jogo foi decisivo. Percebemos que a coisa estava feia, que precisávamos. Nos cobramos muito no vestiário, tínhamos de nos doar e ter mais empenho. Aquela derrota nos fez entender que precisávamos suar mais – recorda.
Dali em diante, Guto Ferreira efetivou Klaus na zaga. E dali em diante, o Inter só ganhou. Foram seis vitórias seguidas e o que era insegurança virou confiança no acesso, e no título. Os colorados querem ser campeões, até para evitar qualquer susto de precisar de resultados nas rodadas finais.
Nesse período, a defesa levou três gols, e Klaus também fez três gols nos últimos seis jogos da Série B. Bem verdade que dois foram contra o Paysandu, o único momento de relativa tensão que o time viveu no último mês. A vitória que se mostrava tranquila sobre os paraenses foi ameaçada nos minutos finais. Após um erro coletivo que acabou sendo interrompido por uma falta ao lado da área, o zagueiro cobrou os companheiros, foi cobrado e pediu: "vamos ficar ligados, não vamos levar esse gol":
– A pior sensação do futebol é construir a vitória em casa, com apoio do torcedor, e deixar escapar. Não queríamos que acontecesse. Queríamos acabar a noite na liderança.
No fim, acabou tudo certo. Mas serviu de alerta para o chavão aquele: mais difícil do que chegar ao topo é se manter lá. Houve cobrança de novo. Claro, é mais fácil corrigir erros ganhando do que perdendo.
Com as vitórias, aliás, Klaus se motivou a circular mais pela cidade, aproveitar o momento. Como na noite de quinta, que levou seu pai à Arena para assistir à Seleção vencer o Equador. Na saída do estádio, um grupo de colorados o parou para tirar fotos. Na saída, um deles fez uma frase de incentivo:
– Tu é o nosso zagueiro-artilheiro. Vai ser o novo Índio, "Alemão"!
O defensor rejeita a comparação. Sabe da história de Índio. Dez anos atrás, também com o pai, sentava na arquibancada do Beira-Rio para ver o time campeão do mundo jogar. De família colorada, acompanhava o Inter e conhecia a história de defensores goleadores, de Figueroa a André Luís, hoje auxiliar de Guto Ferreira. Por isso repete em todas as entrevistas, quando perguntado do futuro (principalmente duas semanas atrás, quando chegou a ser especulado no futebol alemão):
– Quero fazer história no Inter. Uma história como a do Índio. Imagina conquistar tudo o que ele conquistou. Isso, sim, me motiva. Poder vir para o Inter é um sonho realizado. Mesmo sendo em um ano de desafios como é este. Mas quero ficar aqui, quero jogar na Série A, buscar títulos. Quero ser feliz aqui.
Mas e fazer gol?
– Fazer gol é bom, né? Não entro em campo pensando nisso. Mas sei que isso aumenta a visibilidade, ajuda na carreira, dá confiança, cria uma imagem.
O discurso combina com a inteligência do zagueiro, que chegou a cursar Engenharia na UCS nos tempos de Juventude. Incentivado a estudar sempre, principalmente pela mãe, professora, Klaus precisou interromper a faculdade. Mas teve uma motivação especial no último jogo. As colegas de sua mãe estavam na arquibancada e vibraram com o gol do aluno ilustre. Por isso está aprendendo o gostinho especial de balançar as redes adversárias.
– Prefere ganhar sem levar gol ou ganhar fazendo gol?
O zagueiro para, olha para o lado, pensa:
– Não levar gol. O importante é o coletivo.
E nos últimos jogos, mais do que levar poucos gols, o Inter mal deixa os adversários chutarem.
– Sabe que esses dias pensamos em entrevistar o Danilo Fernandes? É que ele sofreu tanto no ano passado, e agora passa os jogos invicto. Mas depois analisamos e vimos que ele quase não suja o calção.
– É, acho melhor vocês entrevistarem o Damião, o Pottker, o Sasha. A turma da frente já marca lá em cima, facilita tudo.
– Mas se tu tem que pagar janta para o Camilo pelas assistências, o Danilo tem que pagar para vocês por jogos sem levar gol.
– Do jeito que vai, acho que o melhor é fazer uma janta geral, para todo mundo.
*ZHESPORTES