Fabinho precisou aprender a se virar com um par de muletas pela casa. Desde que deu um carrinho na lateral, na vitória do Inter sobre o Oeste, no Beira-Rio, há 15 dias, o volante lida com a paciência de uma recuperação lenta e dolorosa de uma fratura na fíbula da perna esquerda.
Prefere não dar previsão de retorno, comemora o fato de o torcedor agora valorizar seu estilo aguerrido em campo e vê a lesão de uma outra forma: mimando a única filha, Sara, de nove meses:
– Um dia você é vilão, no outro é herói. Eu senti um carinho muito grande do torcedor do Inter. Eles conseguiram despertar em mim um gigante adormecido. Me deu muita força. Fez eu gostar mais do Inter, ter admiração. Nunca vi uma torcida tão apaixonada – disse, em um bate-papo em sua casa, no bairro Boa Vista, em Porto Alegre.
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A seguir, os principais trechos da entrevista com o volante colorado:
Como foram as horas depois da tua lesão?
Depois que me lesionei, fui direto para o hospital. Fiz exames e constatou a fratura na fíbula. Voltei para casa e, logo depois, fui fazer a cirurgia. Estava bastante ansioso, era uma situação nova, nunca tinha passado. Não via a hora que acontecesse. Mas quando chegou, deu aquele friozinho na barriga. Mas graças a Deus, deu tudo certo.
Por que entrar naquela jogada, que aparentemente estava perdida, de carrinho?
Devido ao momento que a gente vinha no campeonato, não conseguia ter uma sequência de vitórias em casa. Antes de entrar em campo, a gente fala que não existe bola perdida, e isso fica no subconsciente. Sou um jogador mais aguerrido, de não desistir das jogadas. Estava no meu subconsciente que eles poderiam criar um contra-ataque e nós sofrermos o gol. Até porque estava 1 a 0 só. Então, eu fui e dei aquele carrinho. Mas teve a jogada do gol, anteriormente, que dei o mesmo tipo de carrinho.
O motivo que te causou essa lesão fez o torcedor ver um Fabinho aguerrido? Recebeu o apoio?
Infelizmente, teve a situação do ano passado que acaba marcando a carreira do jogador, ainda mais em um clube como o Inter. Claro que não queríamos passar por isso, não desejamos para ninguém. E eu tinha a oportunidade de darmos a volta por cima neste ano. Desde o início da temporada, venho trabalhando seriamente. Nunca cheguei atrasado, mesmo sem jogar no Gauchão. Minha seriedade foi a mesma desde quando vesti a camisa do Inter. E sabia que, no momento certo, as pessoas iam conseguir enxergar a minha maneira de trabalhar. Tem a crítica que faz parte do futebol, da grandeza do clube que eu estou. Eu sou esse tipo de jogador mesmo, guerreiro, que não desiste das jogadas. Quem está lá dentro é propício a erros de passe, jogada. Mas a força de vontade, o comprometimento, nunca deixei a desejar. E acho que vou continuar lutando mais ainda depois dessa lesão.
Como absorver a ideia de ser preterido em um primeiro momento, depois virar solução?
Eu sou cristão, leio muito a Bíblia. E ali fala sobre pessoas que estavam esquecidas há anos e, daqui a pouco, viraram solução. A palavra de Deus tem me fortalecido nesses momentos difíceis, de transição. Sabia que Deus tinha o melhor da minha vida e segui fazendo o meu trabalho. E creio que tudo tem um propósito, nada é por acaso. Quando a gente faz coisa certa, sem sacanear ninguém, a turbulência não dura para sempre. A tristeza, a dor não duram para sempre. Então, eu tinha certeza que, no momento certo, as coisas voltariam a acontecer.
Chegou a pensar em sair do Inter?
Não, não pensei. Eu tinha dentro de mim o sentimento de que eu precisava me redimir, não individualmente porque o futebol é coletivo. O rebaixamento não passou diretamente por mim, todos tiveram essa parcela. Mas eu queria deixar o Inter na Série A novamente. Nunca foi a minha intenção de deixar o clube porque caiu para Série B.
São poucos que, assim como você (Dourado e Danilo Fernandes), não saíram com a queda para a Série B. Vocês se sentem mais responsáveis?
Olha, pelo fato de termos ficado, essa responsabilidade tem sim. Não é só nossa, mas de todos os jogadores. Não tenha dúvidas que esse é o maior desejo de quem ficou, de retornar à elite.
Como é conviver com a crítica em um dia e depois receber tanto apoio da torcida?
É uma coisa natural, que faz parte do futebol. Um dia você é vilão, no outro é herói. Eu senti um carinho muito grande do torcedor do Inter. Eles conseguiram despertar em mim um gigante adormecido. Me deu muita força. Fez eu gostar mais do Inter, ter admiração. Nunca vi uma torcida tão apaixonada. Mas fez eu ter mais admiração por um clube. Que quando o time perde, cobra muito. Foi marcante na minha vida, na carreira. Quando eu tiver oportunidade de jogar, vou dar tudo e mais um pouco para ajudar o Inter. Se for em uma bola como aquela, claro que vamos ter um pouco mais de sabedoria, para não se machucar. Mas não tem bola perdida.
Dando carrinho também?
Não tenha dúvida.
A mudança de comissão técnica ajudou na oscilação do time na Série B?
É algo que faz parte do futebol. É resultado, né? E, às vezes, ele não vinha. A diretoria entendeu que era o momento de mudar e, nós, jogadores, respeitamos. Trouxeram o Guto, tivemos um início turbulento. Já joguei três vezes a Série B pelo América-RN e é isso. São jogos mais truncados, não é técnico. Você pega adversário fechado, joga fora em um campo que não é da mesma qualidade. Mas não é que o Inter precisava aprender a jogar na Série B. É porque são situações diferentes, isso se dá muito mais pelo adversário do que pela qualidade do Inter. Se você pega uma equipe fechada no Beira-Rio, o jogo fica feio. A gente tem mais infiltrações, tentamos pelas laterais e erramos mais. Mas graças a Deus, a equipe conseguiu uma sequência positiva.
O que o Fabinho tem que, apesar das críticas da torcida, todos os treinadores que passaram no Inter apostaram?
Acho que primeiro é a vontade, a garra de querer vencer. Claro que para o treinador só vontade não adianta, tem que cumprir a função tática em campo. Acho que consigo cumprir, aliado à vontade e determinação. Joguei com todos os treinadores que passaram por aqui – à exceção do Lisca, nos últimos dois jogos –. Isso me deixa feliz, motivado, que eu siga trabalhando feliz.
O Inter volta para Série A?
Ah, eu não tenho dúvida. Esse é o pensamento de todo jogador, comissão, diretoria e de todo torcedor. A gente, dentro de campo, vai continuar trabalhando. Agora, eu como torcedor, vou continuar torcendo porque com o elenco que temos e a determinação, dificilmente a Série A escapa.
Fabinho teria lugar no time do Inter hoje?
Isso só o Guto pode te dizer. Eu como jogador quero sempre ajudar a equipe. Tem vezes que saio da minha função, jogo de lateral. Sei que não tenho o mesmo desempenho, mas a vontade de ajudar, de se doar um pouco mais, sem se importar com a vaidade. Se o treinador entender que temos condições de atuar ali na lateral, por exemplo, vou continuar trabalhando e respeitando a opinião do técnico. Ele tem 11 para escalar, não deve ser fácil. Talvez eu não concorde que eu deva ficar no banco, mas preciso sempre respeitar. Eu não fico emburrado, chateado. Eu respeito e, quando tenho oportunidade, aproveito.
Como fica a recuperação a partir de agora, sem o gesso (ele tirou na segunda-feira)?
Fazer fisioterapia em oito dias e, em sequência, começar a trabalhar uma parte física. Tem que ser tudo com calma. O campeonato acaba 20, 25 de novembro, então, não precisamos acelerar. Mas voltarei mais forte. Creio que volto a treinar com bola esse ano. Não sei se vai dar para voltar a jogar, porque tem a parte física, técnica. Se não der tempo esse ano, estaremos preparados para o ano que vem.
O que é mais difícil na recuperação? E o que você tem feito?
Com gesso, a posição para dormir era ruim. Para tomar banho também. Não tem posição, é pesado. Agora, é mais tranquilo. Consigo dormir melhor, é mil maravilhas. Gosto de ler, tenho muitos livros. Leio sobre cristianismo, administração de tempo, como priorizar determinadas situação para conseguir objetivo. A leitura nos faz crescer como pessoa. Leio sobre economia, finanças para aprendermos a não gastar tudo. Mas gosto de ficar em casa, sou caseiro, curtindo minha filha Sara. Minha rotina é essa, assisto um pouco de tevê, vou no culto e ao shopping.
Mas também dá uma espiada nos treinos do Inter.
Isso, tem aplicativo do Inter que eu acompanho as notícias. Vejo todos os jogos, fico na torcida.