— Os bons duram pouco — lamentou Antônio Carlos Verardi, ao cruzar com Valdir Espinosa na porta de entrada do plenário da Câmara de Vereadores de Porto Alegre, onde era velado Tarciso José de Sousa, 67 anos.
Foi uma das poucas frases que o superintendente do Grêmio conseguiu pronunciar durante o tempo em que permaneceu no local. Por vários minutos, Verardi manteve o olhar fixo no caixão onde jazia o amigo com quem conviveu nos corredores do Estádio Olímpico entre 1973 e 1987. Despedia-se em silêncio de uma lenda, o jogador com maior número de jogos na história do clube, o segundo maior goleador tricolor, suplantado apenas por Alcindo. Abatido por um tumor ósseo, Tarciso havia falecido no começo da madrugada de quarta-feira (5), no Hospital da PUC, na Capital.
Ao passar por Valdir Espinosa, o treinador que, em 1983, acomodou Tarciso e Renato Portaluppi no mesmo ataque e ganhou a América e o mundo, Verardi é abordado por jornalistas para uma entrevista sobre o ex-jogador, mas desculpa-se:
— Se eu começar a falar, me emociono.
Eram 8h32min quando o corpo chegou ao plenário da Câmara. Um dos que ajudavam a carregar o esquife era o jornalista Vinícius Rebelo, por três anos um dos assessores do ex-camisa 7. Chorava a perda do patrão e amigo e, ao lado de Jônia, a viúva, ajudava a organizar o ambiente que, ainda vazio naquele momento, em poucos minutos passaria a receber a visita de centenas de pessoas.
— Ele está sereno, Jônia — diz Rebello, chorando, enquanto passa mão no rosto do ex-jogador.
Jônia decide, após rápida reunião com familiares e amigos, que o velório deveria estender-se até 15h30min, possibilitando que amigos mais distantes cheguem a tempo. Acerta, também, que o sepultamento será às 18h30min, no Cemitério Jardim da Paz, na Capital. A cada abraço que recebe, Jônia conta detalhes dos últimos dias de Tarciso.
— Todos os médicos que o acompanhavam falavam da enorme coragem que ele tinha para enfrentar a doença — desabafa, entre lágrimas.
Misturavam-se no plenário ex-jogadores, treinadores com quem Tarciso havia trabalhado, dirigentes e, acima de tudo, gremistas anônimos, que testemunharam sentados nas cadeiras e arquibancadas do Olímpico sua carreira no clube. Gente que havia despertado impactada com a notícia.
— Foi tudo tão rápido como ele se movia em campo — resumiu Gabriela, uma das filhas de Tarciso, mãe de José Tarciso Sousa Neto.
Ela se referia ao processo que desencadeou na morte do pai. Era do conhecimento de todos que, há anos, Tarciso sofria com problemas como diabetes e hepatite. Mesmo o nódulo no fígado, que, em abril, o fez trocar as sessões diárias de musculação por hidroginástica para manter a forma, não o dobrava. Tudo se precipitou com o tumor ósseo. O nódulo atingiu o nervo ciático e as dores se do tornaram praticamente insuportáveis, a ponto de impedir de se mexer o ex-atacante que, com suas passadas largas, zunia entre os marcadores. O tempo de internação hospitalar foi curto. Na sexta-feira, 30 de novembro, Tarciso recebeu alta e devolveu aos familiares a esperança de uma recuperação. Segunda-feira (3), contudo, quando já preparava-se para voltar à Câmara, seu quadro agravou-se de forma irreversível. A morte ocorreu apenas duas semanas depois de o estado clínico tornar-se mais agudo.
— Domingo, estranhamos quando ele não esteve na Arena para a festa dos 35 anos do mundial do Japão. Percebemos que alguma coisa muito séria estava acontecendo — disse o vereador Cassiá Carpes, zagueiro do time do Grêmio campeão gaúcho de 1977, ao lado de Tarciso.
Mesmo com o plenário lotado, Roberta e Marcelo, os outros dois filhos, mantém-se o tempo todo próximos do pai. A camisa 7 retrô, ao longo de 15 anos usada por Tarciso, repousa sobre o caixão, na homenagem final ao atacante definitivamente inscrito na história do Grêmio.