Professor de literatura do Grupo Unificado, Vanderlei Vicente comenta o livro Terras do Sem Fim, de Jorge Amado. A obra é uma das quatro novidades na lista de leituras obrigatórias para o próximo vestibular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Retrato de Ilheús
Considerada por críticos como uma das melhores obras de Jorge Amado, Terras do Sem Fim foi publicada em 1942 e, logo, tornou-se um dos mais fiéis retratos da região de Ilhéus, sul da Bahia, tendo como cenário os grandes latifúndios e os anos dourados do cacau e dos coronéis.
A história apresenta a violenta disputa entre dois grupos por terras para a plantação de cacau nessa região: de um lado, a família Badaró; do outro, o Coronel Horácio da Silveira. Visto que a posse da terra garantiria um gigantesco poder ao grupo vitorioso, atos ilícitos tornam-se corriqueiros, como o uso de falsos documentos, tocaias e incêndios criminosos.
Terras e crimes
Na medida em que as terras eram sem dono, Coronel Horácio, com o argumento de possuir uma antiga medição das matas de Sequeiro Grande, registra as terras em seu nome e de mais alguns pequenos agricultores da região. Embora o documento apresentado estivesse com rasuras na identificação do proprietário, o cartório acolhe o pedido sem contestar a validade devido ao poder político de Coronel Horácio na região. Entretanto, a manobra não ficou sem a devida resposta da família Badaró, que, sob o comando de Don'Ana Badaró, incendeia o cartório onde o registro havia sido feito. Este foi o estopim para que a luta pela posse das terras se intensificasse e para que mortes e mais mortes ligadas à disputa ocorressem.
Juca Badaró, por exemplo, foi morto em uma tocaia preparada por homens do Coronel Horácio, que já tentara assassinar o patriarca Sinhô Badaró sem sucesso. Embora naquele ambiente a vingança, mais provável fosse a do sangue pelo sangue, Sinhô Badaró decide processar judicialmente seu opositor. Neste momento, ocorre uma reviravolta na política local: a família Badaró, que até então tinha o apoio das autoridades locais, da noite para o dia, torna-se oposição ao governo e, consequentemente, passa a sofrer sanções.
Vendo que perdia o controle da situação, Sinhô Badaró ordena que Teodoro, um de seus apoiadores, incendeie algumas das plantações de Horácio e de seus correligionários. Porém, Teodoro é descoberto e perseguido. Na iminência de sua captura, ele procura abrigo na propriedade de Sinhô Badaró, e aquilo que era o símbolo máximo do poder da família, a casa-grande, é cercado e incendiado, após intenso confronto. Este ato representa a derrocada da família Badaró, que ainda vê o julgamento de Horácio dar em nada.
A obra acaba com a descrição dos primeiros frutos dos cacaueiros nascendo nas plantações de Sequeiro Grande, terra adubada com sangue.
Outros personagens marcantes
Damião: capanga dos Badaró, famoso por ser um matador que nunca falhava nas tocaias. Certo dia, porém, ele percebe as consequências de seus atos e termina por enlouquecer.
João Magalhães: jogador de cartas que viera para a Bahia atrás do dinheiro fácil e abundante surgido no rastro das plantações de cacau, apresenta-se como engenheiro militar, o que lhe garante a confiança da família Badaró.
Ester: esposa de Horácio, mulher criada num mundo completamente diferente àquele ambiente hostil, casa-se com Horácio somente por falta de opções. Sua carência, entretanto, faz com que ela inicie um caso com o advogado Virgílio, homem carinhoso, educado e avesso à violência.