O reitor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Evilázio Teixeira, e a presidente-executiva do Todos Pela Educação, Priscila Cruz, debateram, nesta quarta-feira (19), o cenário da educação no país em meio à pandemia de coronavírus, no quadro Painel Atualidade, na Rádio Gaúcha. Impactos da crise sanitária, o futuro pós-pandemia, a necessidade de melhoria em gestão e a preocupação com a baixa procura por licenciatura em algumas áreas estão entre os temas que dominaram o encontro.
Nas quartas-feiras, o quadro dentro do programa Gaúcha Atualidade ouve representantes de setores econômicos para provocar o debate e estimular a busca por alternativas para a diminuição do impacto negativo causado pela pandemia.
O que é o Painel Atualidade?
Trata-se de um novo quadro semanal dentro do Gaúcha Atualidade, que pretende provocar o debate e estimular a busca por alternativas que ajudem a minimizar o impacto negativo da crise do coronavírus na economia do Rio Grande do Sul. A iniciativa faz parte do projeto de Jornalismo de Soluções proposto pelo Grupo RBS, que busca o debate para enfrentar e resolver os problemas diagnosticados.
Fundada em 1931, a PUCRS está entre as mais tradicionais instituições de Ensino Superior do país. O Todos Pela Educação é uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, que atua desde 2006 para impulsionar “a qualidade e a equidade da educação básica no país”.
Educação em meio à pandemia
— Esse recurso a mais vindo do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) vai ser fundamental neste período pós-pandemia e acho que é o grande destaque positivo da educação neste ano. Outro ponto positivo foi uma flexibilização maior, a busca por soluções mais inovadoras, o fortalecimento da gestão em muitas localidades. Obviamente, isso não aconteceu em todas as secretarias estaduais e municipais de Educação, mas a própria pandemia forçou a gestão educacional a ser melhor. Isso aconteceu bem fortemente. O que me angustia e preocupa? Os efeitos da pandemia na educação são brutais. A gente tem um dado que no mês de férias de 30 dias a gente tem uma perda de aprendizagem entre 30% e 50% em relação ao ano anterior. Imagina, a gente já vai entrar no sexto mês de aulas suspensas. Então, o impacto disso é brutal. A educação é um processo cumulativo. Não é simplesmente uma pausa e depois a gente retoma. É muito complicado o que está acontecendo agora. E a evasão, que também é um ponto que tem me angustiado e preocupado bastante. A tendência é de ter uma evasão muito grande, alunos desistindo da escola, desistindo de retornar — afirmou a presidente-executiva do Todos Pela Educação.
Mudanças no Ensino Superior
— Sobre o ponto de vista do Ensino Superior, acho que estamos hoje no encontro de águas, que mais do que nunca requer de cada um de nós um pensamento adaptativo. Do ponto de vista da PUCRS, posso falar mais com causa, e também em conversas com muitos reitores do Brasil, do Rio Grande do Sul e de associações das quais nós fazemos parte, tivemos um avanço fundamental desde o início, quando começou a pandemia, lá no dia 17 de março. Em três dias, a universidade passou por um processo de transformação talvez sem igual em toda a sua história. O que muda no meu modo de ver, desde o ponto de vista do estudante universitário, e é isso que nós estamos tentando fazer aqui na PUCRS? Um aspecto para mim que é fundamental é percebermos que, no Ensino Superior, cada vez mais temos que colocar a centralidade na aprendizagem e no protagonismo do estudante. Diria que a pandemia meio que induz ou força o estudante a desenvolver algumas capacidades comportamentais talvez com mais velocidade que essa dimensão da adaptabilidade e também da resolução de problemas complexos — destacou o reitor da PUCRS.
Inclusão
— A PUCRS migrou muito rapidamente para o modelo online. Acho que nós antecipamos o futuro. Esse já era um caminho sem volta das nossas organizações. Dentro do nossos planejamentos, a pandemia meio que nos forçou a darmos um passo em um curto espaço de tempo. Aquilo que imaginávamos fazer em 2022, antecipamos para 2020 — complementou Teixeira.
Reforçar a gestão
O Fundeb é um vetor nessa direção (de superar as desigualdades), mas obviamente não resolve totalmente. Tem um lado muito fundamental, e talvez até mais importante, que é a gestão. O que é gestão? Gestão é você saber alocar esses recursos nas áreas, nas políticas corretas. Saber fazer a formulação dessas políticas. Tem muitas políticas mal formuladas, mal modeladas que atacam mal o problema, que vão na direção oposta. Às vezes, a intenção até é boa, mas acaba indo na direção oposta. A gente precisa realmente instalar essa capacidade no Brasil. A gente vem melhorando, é uma melhoria lenta, mas vai ser essa gestão que vai fazer com que a gente tenha qualquer tipo de chance de melhorar os resultados educacionais, destacando a necessidade de investimentos e políticas públicas voltadas para a primeira infância e para os professores — ressaltou Priscila.
Futuro da educação pública
— A gente vai ter uma queda de orçamento disponível para educação, a gente vai ter um aumento da demanda, porque a gente está falando aqui de ações extras que essas redes terão de realizar para poder realmente ter um resultado. Acredito que muita rede não vai conseguir fazer isso. Mas tem de ter os EPIs, os procedimentos sanitários para poder preservar a saúde dos alunos, mesmo aí no tempo de transição. A gente tem de falar em avaliação, em nova formação de professores. A gente está falando de recuperação e reforço. Alguns Estados, inclusive, já estão falando em quarto ano do Ensino Médio para poder compensar esse tempo perdido. Então, a pressão por investimento é maior, os recursos vão ficar menores e a gente ainda tem esse fenômeno que é a migração de alunos da rede privada para a rede pública. Então, de novo, é uma situação de altíssima pressão em cima da gestão educacional — salientou a presidente-executiva do Todos pela Educação
Falta de interesse por áreas de formação
— No que se refere às licenciaturas, se não investirmos pesadamente na formação de professores para séries iniciais, Ensino Fundamental e Médio, em pouquíssimos anos não teremos mais professores de algumas áreas no Estado do Rio Grande do Sul e talvez no Brasil. Áreas como matemática, física, química. Isso é efetivamente uma lacuna muito grande. No que se refere à universidade, temos hoje todo um programa de incentivos para essas áreas, mas posso lhe dizer o seguinte: o número de estudantes que optam por essas áreas é muito pequeno. Precisamos de uma política pública para essas questões da licenciatura. Nós, como universidades comunitárias, temos uma grande contribuição para dar, mas não temos como fazer isso sozinhos. Temos muitas vagas, damos bolsas, incentivos, mas não temos alunos que estejam optando por ser futuros professores — alertou o reitor da PUCRS.
Manter o vínculo com a escola
— Não deixe o seu filho não voltar para a escola. Tenho visto muita família desistindo, colocando só para o ano que vem, vamos acompanhar, vamos ver quando vai ser possível ter esse retorno às aulas, obviamente quando a pandemia estiver em um patamar muito mais baixo, com todas as medidas sanitárias. É muito importante a gente não tirar o vínculo dos nossos filhos, dos alunos, das crianças e dos jovens do Brasil com a escola e com a aprendizagem. A escola do seu filho não está com atividades remotas, não tem nenhum tipo de incentivo a aprender? Sei que é muito difícil, principalmente para quem trabalha, para as mães que tem escolaridade menor, mas vamos buscar. A gente precisa buscar, esse período é muito importante. A participação da família é fundamental. Não estou querendo colocar aqui uma carga a mais. Sei o quanto isso é difícil, mas esse vínculo com a aprendizagem, de cada vez aprender mais, é importante. Quanto mais essas crianças, esses jovens ficarem alheios à aprendizagem, mais difícil vai ser essa retomada. Então, buscar documentários, leituras, ir atrás de algum tipo de incentivo cognitivo é muito importante. E o mais fundamental, cobrar das autoridades públicas ação à altura do que a gente está vivendo — disse Priscila.
Inclusão no Ensino Superior
— Estamos aguardando que o governo possa oferecer para instituições da nossa natureza alguns programas que ajudem. Precisamos aumentar e incluir mais essa juventude no Ensino Superior. Os nossos indicadores em nível de Brasil são muito pequenos Apenas 17% dos jovens de 17 a 24 anos têm acesso a Ensino Superior no Brasil. Isso nós precisamos melhorar muito, que é a inclusão de acesso. Procuramos fazer o máximo possível, desde programas internos, de incentivos. Vamos ver o que vem pela frente. Esse é um desafio constante — pontuou Teixeira.