Presidente do Banco Central (BC) empossado no dia 2 de janeiro, Gabriel Galípolo comanda, pela primeira vez, a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). O encontro, que começou na terça-feira (28), deve ser encerrado nesta quarta (29) com a divulgação da nova taxa de juro. A Selic, atualmente em 12,25% ao ano, deve subir um ponto percentual e alcançar 13,25%.
A alíquota já havia sido prevista na última ata do Copom em 2024, e o mercado mantém a mesma expectativa. Miguel José Ribeiro de Oliveira, diretor-executivo da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), afirma que o BC segue pressionado por fatores domésticos e externos, que forçam uma postura mais agressiva contra a inflação.
— O cenário com dólar ainda pressionado, que afeta os preços internacionais, essas incertezas todas lá fora, e principalmente a questão da inflação, que está acima do teto da meta e vai assim permanecer, levam o Banco Central, até para mostrar certa credibilidade do mercado, a subir um ponto porcentual. E acredito que é isso que vai acontecer.
Além disso, a nova alta no preço dos combustíveis, programada para entrar em vigor nos próximos dias, deve colocar ainda mais pressão na inflação e dificultar o trabalho do BC, segundo Oliveira.
O aumento da taxa de juro como forma de conter a inflação se dá ao deixar os custos do consumo e de parte dos investimentos na produção mais altos, "esfriando" a economia. Ao desestimular o apetite por bens, serviços e crédito, os preços tendem a se acomodar em um universo com demanda e oferta mais equilibradas. Em outro cenário, quando a atividade está baixa, a autoridade monetária corta o juro para promover o movimento inverso: reduzir o custo do dinheiro, aumentando a demanda ao tornar o consumo e os investimentos das empresas menos onerosos.
Indicado de Lula
Galípolo foi indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao BC. O antecessor, Roberto Campos Neto, foi alvo de diversas críticas de Lula ao longo da primeira metade do governo, justamente em razão da taxa de juro, considerada alta demais pelo Planalto.
Dando "boas-vindas" ao indicado no final de 2024 — quando o dólar ultrapassava os R$ 6 —, Lula prometeu autonomia a Galípolo:
— Quero que você saiba que jamais, jamais haverá da parte da Presidência qualquer interferência no trabalho que você tem que fazer no Banco Central — disse o presidente no dia 20 de dezembro.
Quatro meses antes, em agosto, Lula já havia comentado sobre a possibilidade de lidar com uma alta do juro durante o mandato de Galípolo à frente do BC.
— O problema é que, no imaginário do mercado, o presidente do BC tem que ser um representante do sistema financeiro, e eu não acho que tenha que ser. Tem que ser uma pessoa que gosta do país, pense na soberania nacional e tome as atitudes corretas. Se um dia o Galípolo chegar e falar que precisa aumentar os juros, ótimo — falou Lula, em entrevista à rádio MaisPB, de João Pessoa, no dia 30 de agosto.
Miguel José Ribeiro de Oliveira afirma que ainda é necessário aguardar mais para ver como será a postura de Galípolo no comando da autoridade monetária nacional. No entanto, acredita que os sinais dados até agora apontam para uma gestão técnica, mas com possibilidade de menos atritos com o governo federal.
— A princípio, pela posição dele pública, pela própria postura dele nas votações em que ele não era presidente, mas estava lá, sinaliza que ele vai ter um comportamento extremamente conservador, atento à inflação e não vai se furtar de subir os juros ao patamar que for necessário para conter a inflação — comenta o diretor-executivo da Anefac.
O economista-chefe da Suno Research, Gustavo Sung, afirma que existem dois pontos principais que rondam o novo presidente do BC. De um lado, tem um viés positivo, com ele podendo ter uma voz ativa no governo para falar e apontar como o risco fiscal impacta nas expectativas. Por outro lado, toda vez que ele participar de uma reunião com o Planalto, sempre vai ter uma "pulga atrás da orelha" sobre uma eventual influência política, segundo Sung. No entanto, o profissional destaca que a postura de Galípolo até aqui não sugere futuros problemas.
— Ele está se blindando muito bem por enquanto. Acho que a pulga atrás da orelha sempre vai ficar. No momento, eu não vejo desconfiança ainda ou qualquer tipo de problemas que possam existir, dado o histórico que ele vem falando nos seus comentários e nos seus votos. Mas, de novo, acho que a pulga atrás da orelha sempre vai existir um pouquinho.
Inflação motiva escalada
Se confirmadas as expectativas do mercado, baseadas na ata do Copom de dezembro, o juro deve continuar subindo. Em março, a Selic deve alcançar 14,25% ao ano, em uma tentativa de controlar a inflação.
A pesquisa Focus, realizada pelo BC com a estimativa de economistas, projeta o juro em 15% no final do ano. Já a inflação é prevista para fechar 2025 em 5,5% — um ponto acima do teto da meta definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). A previsão de estouro do teto ocorre mesmo com uma Selic restritiva.
A alta dos preços é pressionada, entre outros fatores, pelos alimentos. Enquanto a inflação geral encerrou 2024 em 4,83%, no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), os itens do grupo alimentação e bebidas ficaram 7,69% mais caros.
Gustavo Sung afirma que o Banco Central segue preocupado com a contínua ampliação da desancoragem da expectativa de inflação. Ou seja, a alta dos preços segue elevada no horizonte. Esse cenário, junto de câmbio elevado e atividade aquecida, mantém a postura mais vigilante do BC, segundo o economista.
— O Banco Central, quando olha a inflação de seis a 18 meses, aquele horizonte relevante, vê que as expectativas já estão subindo no boletim Focus. Ou seja, os juros de hoje projetados ainda não são suficientes para controlar e estabilizar as projeções de inflação, que estão cada vez mais sendo revisadas para cima — explica o economista-chefe da Suno Research.