O mais recente resultado do Produto Interno Bruto (PIB), que apontou alta de 0,9% no terceiro trimestre, mostra economia ainda aquecida e com desaceleração abaixo do esperado por parte do mercado.
Aumento recente dos gastos do governo, que influenciam em consumo maior das famílias, investimentos das empresas na produção e mercado de trabalho em alta são alguns dos fatores que explicam esse cenário, segundo especialistas. Esse ambiente também reforça juro mais elevado ao longo de 2025 para frear a demanda e o risco de repique mais intenso da inflação.
O professor Maurício Weiss, do Programa de Mestrado Profissional de Economia (PPECO) da UFRGS, afirma que a alta do PIB ocorre diante de um conjunto de fatores que impulsionam a demanda. A elevação dos gastos do governo federal respinga em investimentos que aumentam o consumo das famílias e os aportes de empresas, segundo o professor. Isso acelera a atividade, repercutindo em setores como serviços e indústria:
— Você também tem a retomada do crescimento do salário acima da inflação, tem o novo PAC, com a retomada das obras, do investimento público, do financiamento do Minha Casa Minha Vida, que amplia bastante a dinâmica de construção civil e ajuda no investimento. Além disso, tem a queda da taxa de desemprego para o menor patamar observado na série histórica.
Weiss destaca que, esse aumento de demanda também acaba beneficiando a indústria, outro ramo com destaque nos últimos registros do PIB. Esse setor acaba aproveitando esse ambiente de expansão econômica.
Sobre o recuo na agropecuária, Weiss afirma que esse desempenho é explicado por questões sazonais e típicas desse trimestre e por questões climáticas que pressionaram alguns produtos.
Pressão no juro
Apesar de mostrar resiliência, a manutenção da economia aquecida junto de um mercado de trabalho que segue repetindo números positivos acende mais um sinal de alerta na autoridade monetária, segundo parte dos economistas.
Marcelo Kfoury, professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV/EESP), também afirma que o resultado dos últimos trimestres mostra efeitos do impulso fiscal. No entanto, o salto do terceiro trimestre acima do esperado pode sinalizar uma economia crescendo acima do potencial, na avaliação de Kfoury, aumentando a preocupação do Banco Central:
— Isso faz com que a inflação, principalmente a inflação de serviços, fique um pouco mais apertada. O Banco Central já está subindo os juros. E, com o aperto da política monetária, você espera que a economia desacelere para não gerar pressão inflacionária. E isso não aconteceu ainda. Então, não sei se o Banco Central vai comemorar muito esse resultado do PIB.
Investimento na produção
Um dos destaques do PIB no terceiro trimestre é o avanço da formação bruta de capital fixo. Além de alta expressiva no último dado — 2,1% —, esse grupo engatou o quarto crescimento consecutivo, segundo o IBGE. Esse indicador mostra o quanto as empresas investiram em bens para a produção. Ou seja, aponta a mobilização dos setores para aumentar ou não a produção.
Esse resultado chama atenção em um ambiente onde o governo e o mercado trocam farpas, criando cenário de desconfiança e incerteza sobre o futuro da atividade no país.
O professor Marcelo Kfoury destaca que o investimento depende muito da capacidade produtiva do país. Nesse sentido, o ambiente de economia ainda aquecida pode estar favorecendo esses aportes:
— As expectativas ainda não estão tão ruins assim. Você tem o mercado financeiro olhando com certo pessimismo, mas a economia ainda está investindo, com crescimento positivo. Então, você tem, parece uma dicotomia entre o que o mercado financeiro está vendo e o que o resto da economia está vendo.
Além desse fator, o mercado de capitais também pode estar influenciando a formação bruta de capital fixo, segundo o professor da FGV. Kfoury destaca que a emissão de debêntures, com empresas conseguindo se financiar no mercado de capitais, favorece o investimento.
Maurício Weiss também afirma que existe uma diferença de postura entre mercado financeiro e setores empresariais. De um lado, um adota tom mais pessimista, pensando em questões especulativas. De outro, parte do braço produtivo segue otimista, segundo o professor da UFRGS.
Próximos meses
O professor Marcelo Kfoury estima a economia ainda no azul, mas desacelerando no quarto trimestre e em 2025. Entre os ingredientes que bancam essa estimativa, ele destaca a preocupação do Banco Central com a inflação que pode ser impulsionada por demanda aquecida:
— A expectativa é de que continue a crescer, a subir os juros para ver se desacelera um pouco a economia, para não gerar tanta inflação.
Já o professor Maurício Weiss espera uma continuidade de alta no último trimestre. Mas afirma que a escalada recente na taxa de juro pode frear justamente o investimento que está puxando a economia neste momento. A atratividade que o juro traz no âmbito das aplicações também pode pesar nesse sentido, segundo Weiss.
— Não só pela questão do custo, mas também por conta da alternativa melhor. Em vez de investir, alguns agentes podem aplicar no mercado de títulos privados.
A Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda divulgou nota onde estima que a atividade econômica deve continuar a crescer no próximo trimestre, “embora com desaceleração na margem”.
“A política monetária mais contracionista deverá restringir o ritmo de expansão das concessões de crédito e dos investimentos. Ainda assim, impulsos positivos devem vir do mercado de trabalho, que deverá seguir resiliente, estimulando a produção e o consumo das famílias”, destacou trecho do comunicado da pasta.
Hoje, a Selic está em 11,25% ao ano após duas altas consecutivas. Parte do mercado financeiro estima que o novo ciclo de alta deve seguir pelo menos até metade de 2025.