Diante de um cenário político conturbado, com redução de vagas, alta de juros, fechamento de lojas e baixa confiança do consumidor, o varejo gaúcho tem previsão de recuperação somente para 2017. A expectativa para 2016 é de que os resultados registrados no ano passado, quando houve números negativos recordes no segmento, não sejam repetidos. O problema é que também estão longe de apresentar retomada.
– É difícil vislumbrar alguma melhora para este ano. Estamos inseridos num contexto onde o Brasil está parado, o desenrolar político está perdendo tempo e não se estão aprovando propostas que poderiam trazer recuperação à economia. Pode até ser que se tenha um desenrolar favorável ainda em 2016, mas não há muito o que fazer porque o cenário já é de queda do PIB (Produto Interno Bruto). Em 2017, a esperança é de que, havendo um fato novo na política, a situação possa melhorar – afirma Jéfferson Colombo, economista da Fundação de Economia e Estatística (FEE).
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Ao mesmo tempo, Colombo lembra que outros setores podem influenciar uma leve recuperação. Se o desempenho da agropecuária for positivo e a indústria conseguir elevar as exportações por meio do real desvalorizado, haveria efeito no comércio e nos serviços.
O cenário nacional também é considerado complicado. Na projeção da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o varejo deve apresentar retração de 8,3% neste ano. O número é somente 0,3 ponto percentual inferior ao resultado de 2015.
– As variáveis que atrapalharam no ano passado continuam presentes. A inflação permanecerá alta, o desemprego deve avançar, os juros estarão elevados e a confiança do consumidor se manterá em baixa – resume Fabio Bentes, economista da entidade.
No Rio Grande do Sul, a retração acumulada no setor em 12 meses fechados em janeiro acumula 13,83%, segundo a Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Estado (FCDL-RS). O resultado também atinge o país: queda de 9,34%. O desempenho do ano passado se reflete no fechamento de lojas e de postos de trabalho. No Estado, foram 9,4 mil vagas a menos e 9,1 mil estabelecimentos encerrados.
Economista e consultor externo para a área de mercado de trabalho do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV), Tiago Cabral Barreira avalia que a tendência é de que a economia se recupere lentamente.
– Acreditamos que em meados de 2017 possam surgir melhoras para o setor, mas estamos diante de um cenário subjetivo que depende bastante das expectativas, de como os agentes econômicos atuarão. É importante destacar que tudo pode se alterar nos próximos meses – diz Barreira.
Quando chega a hora de desistir
Depois de duas décadas de trabalho e diante de um cenário econômico incerto e marcado pela forte concorrência, a empresária Vivian Celia Rauter Herescu, 56 anos, decidiu fechar as portas de sua loja. Especializado na venda de móveis e decoração para quartos de bebês, o estabelecimento mantido na Avenida Cristóvão Colombo, em Porto Alegre, teve as atividades encerradas em 23 de dezembro do ano passado.
– O motivo que me levou a fechar as portas foi não mais aceitar a escravidão que o segmento impõe, com pouco retorno financeiro para os riscos assumidos ao empreender, pois as margens estão cada vez mais apertadas, os consumidores cada vez mais sem poder de compra, o dinheiro mais caro e a burocracia e os impostos tomando o pouco que sobra quando se é honesto no processo – afirma.
Vivian lembra que o ano de 2014 foi o pior da loja, aberta em 1995. No auge, chegou a ter sete funcionários, mas, no ano passado, trabalhava apenas com uma funcionária e uma sócia. Difícil, a decisão de encerrar as atividades foi tomada após muita reflexão. Agora, trabalha com o marido na empresa de corretagem de seguros que ajudava a administrar em paralelo com a loja:
– Abri porque sempre gostei de decoração, e aqui ajudávamos a realizar o sonho das famílias. Sinto falta, é triste passar por aqui e ver tudo fechado. Só desisti de lutar essa batalha porque não queria ser nem fazer vítimas. Me livrei de carregar um peso insuportável nas costas e uma culpa pelo fracasso, caso houvesse.
O estabelecimento de Vivian é um entre os 2.316 que fecharam as portas no ano passado na Capital, segundo a Junta Comercial do Rio Grande do Sul.