
A chegada da menopausa é um marco inevitável na vida da mulher, mas não precisa ser sinônimo de sofrimento ou perda de qualidade de vida.
Nesta fase, em que há uma queda gradual da produção de estrogênio e progesterona pelos ovários, uma estratégia que pode ser aliada da população feminina é a terapia de reposição hormonal (TRH) – capaz de aliviar sintomas físicos e emocionais, além de prevenir doenças futuras.
O tema, no entanto, ainda gera dúvidas, receios e é alvo de desinformação. Para elucidar o assunto, conversamos com duas especialistas – a endocrinologista e metabologista Tatiana Schreiber, e a ginecologista especialista em menopausa Kenya Netto – que explicam o que é preciso saber sobre a reposição hormonal.
O que é terapia de reposição hormonal
A terapia de reposição hormonal consiste na administração de hormônios femininos — estrogênio e progesterona — que, naturalmente, entram em declínio com o envelhecimento, especialmente durante a transição para a menopausa.
A ideia principal é amenizar os sintomas dessa fase, como ondas de calor (fogachos), alterações de humor, irritabilidade, insônia, ressecamento vaginal, perda de libido e até problemas cognitivos, como a "névoa mental", que é uma sensação de confusão mental.
— No Brasil, a média de idade em que as mulheres entram na menopausa é em torno dos 51 anos. Nesse momento, há queda de estrogênio e progesterona, e é por meio da reposição desses hormônios que se faz o tratamento de reposição. Uma minoria das mulheres pode precisar também da reposição de testosterona, quando sofre de transtorno do desejo sexual hipoativo — explica Tatiana Schreiber.
Depende de cada necessidade
A terapia hormonal é diferente para cada paciente, com base em suas necessidades individuais. Por isso, nem toda mulher precisa fazer reposição hormonal.
Estamos vendo mulheres de 60 anos que estão trocando de emprego, casando-se novamente e, por isso, no campo dessa terapia, buscam-se muito estudos que tragam segurança para esse uso a longo prazo
TATIANA SCHREIBER
Endocrinologista e metabologista
Segundo a ginecologista Kenya Netto, para que o tratamento seja indicado, a mulher deve estar sendo afetada por sintomas da menopausa que estejam prejudicando sua qualidade de vida:
— Os sintomas que elas mais relatam em consultório estão ligados à síndrome geniturinária da menopausa, que provoca infecções urinárias de repetição e escapes de urina. Mas também se queixam de fogachos e de alterações emocionais, como a irritabilidade — a mulher se irrita com o marido, os filhos, o caixa do supermercado. São essas coisas que incomodam demais.
Quando é o momento certo
Como regra geral, a melhor “janela de oportunidade” para a reposição hormonal – ou seja, o período em que a mulher terá mais benefícios do que riscos com o tratamento – é até 10 anos após a última menstruação ou até os 60 anos.
— Já para mulheres com 60 anos ou mais, apenas em casos bem específicos pode-se iniciar a terapia hormonal, mas essa não é a conduta mais preconizada. O melhor momento é mais cedo — ressalta Kenya.
Não é preciso esperar a menstruação cessar completamente para dar início à reposição hormonal. A depender do caso, a perimenopausa ou climatério – que são os anos de transição entre a vida reprodutiva e a não reprodutiva da mulher, que antecedem a menopausa – já pode ser o momento indicado para iniciar a reposição, desde que haja avaliação médica e sintomas significativos.
Quem pode e quem não pode
Entre as principais contraindicações estão:
- Histórico pessoal de câncer de mama ou de endométrio
- Câncer de mama em familiares de 1º grau e presença de mutações genéticas associadas a câncer
- Histórico de trombose, AVC ou infarto
- Doenças hepáticas graves, como cirrose
- Sangramento vaginal sem causa conhecida
- Histórico pessoal de meningioma, um tumor cerebral raro.
Um detalhe é que, nos casos em que há histórico familiar de primeiro grau de câncer de mama, é possível realizar a pesquisa genética para saber se a tendência ao câncer é hereditária ou não.
— Se a pesquisa genética der negativa, é possível usar a terapia de reposição hormonal nessa mulher. Já as mulheres que fumam, têm diabetes, pressão alta e várias doenças metabólicas não controladas, as quais aumentam o risco de infarto, não podem iniciar a reposição hormonal, exceto se estiverem dispostas, antes, a melhorar a saúde — detalha a endocrinologista.
Evolução da terapia hormonal
A “má fama” e o medo que rondam a reposição hormonal têm origem em um importante estudo de 2002, o Women's Health Initiative, que apontou riscos aumentados de câncer e trombose em mulheres que usavam hormônios sintéticos e em doses altas, que eram os tipos de terapia utilizados à época.
— Naquele momento, usava-se um tipo de hormônio equino conjugado, em doses muito maiores e em mulheres acima da janela de oportunidade. Hoje, os hormônios são bioidênticos, possuem uma molécula mais semelhante à produzida pelos ovários e, portanto, são muito mais seguros. Atualmente, os estudos relacionam a terapia hormonal a um risco muito baixo de câncer de mama, entre 0,5% e 1% — explica a ginecologista Kenya Netto.
As formas de aplicação se modernizaram. Além dos comprimidos orais, existem opções transdérmicas – como gel, adesivo e spray, que tendem a ser mais seguros para o fígado e o sistema cardiovascular. A aplicação desses produtos geralmente é feita na coxa ou no abdômen.
— As terapias transdérmicas são um pouco mais caras, mas não são inacessíveis. No SUS, a terapia disponível é a oral, mas, a nível de consultório, de modo geral, as formulações transdérmicas são as que mais trabalho, por serem as mais seguras — detalha a endocrinologista Tatiana Schreiber.
O que é mito e verdade
A terapia de reposição hormonal ainda é cercada por mitos que podem acabar afastando quem está interessada no tratamento.
As especialistas desmistificam os principais, a seguir:
Orientações para quem está entrando na menopausa
Se a mulher está percebendo irregularidade menstrual – insônia, irritabilidade ou mudanças no corpo e no bem-estar – o ideal é procurar um ginecologista ou endocrinologista de confiança. Esses sintomas podem indicar que o climatério está começando, mesmo antes da menstruação cessar por completo.
Segundo Tatiana, apenas 20% das mulheres passam pela menopausa sem sintomas significativos, o que quer dizer que certamente há muitas mulheres sintomáticas que não estão recebendo qualquer tipo de tratamento ou orientação médica.
E, num contexto em que as mulheres estão chegando aos 60, 70 ou 80 anos superativas, é importante que o bem-estar físico, emocional e sexual acompanhe esse ritmo, e que elas saibam que existem alternativas caso seus sintomas estejam atrapalhando sua qualidade de vida.
— Estamos vivendo um período em que a expectativa de vida mostra que as mulheres vão passar um terço da vida ou até mesmo metade da vida em menopausa. Estamos vendo mulheres de 60 anos que estão trocando de emprego, casando-se novamente e, por isso, no campo dessa terapia, buscam-se muito estudos que tragam segurança para esse uso a longo prazo. Nesse momento, não temos uma data limite para o fim da terapia de reposição hormonal, caso a mulher mantenha o controle de sua saúde e exames cardiológicos — conclui Tatiana.